Festas populares e a delicada busca por recursos para mais acessibilidade

Foto: Divulgação Prefeitura de Campina Grande

Parque do Povo, em Campina Grande,  com capacidade para receber 76 mil pessoas, oferece apenas 100 lugares para PCDs - Foto: Divulgação Prefeitura de Campina Grande
Parque do Povo, em Campina Grande, com capacidade para receber 76 mil pessoas, oferece apenas 100 lugares para PCDs

Por Fabiana Holtz

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Publicado em 24/06/2025, às 08h25 - Atualizado às 08h26

São Paulo, 24/06/2025 - Você já olhou no seu entorno nesse período de festas típicas, com milhares curtindo o São João - seja na gigantesca estrutura de Campina Grande, na Paraíba, Caruaru, em Pernambuco, ou na paróquia do seu bairro - e atentou para a presença de pessoas com necessidades especiais? A verdade é que esse público, que tem renda e consome como qualquer cidadão, ainda é negligenciado pelas empresas e organizadores de festas populares. E estamos falando de quase 10% da população brasileira, 18,6 milhões de pessoas.

Valmir de Souza, Ceo da Biomob
Foto: Divulgação/ Biomob

Para Valmir de Souza, CEO da Biomob, startup especializada em soluções de acessibilidade e consultoria para projetos sociais, as pessoas com alguma deficiência (PCD) ou necessidades especiais enfrentam diversas dificuldades para participar de eventos públicos.

A principal questão, além da falta de investimento em soluções específicas de acessibilidade, está no preconceito. "Me incomoda muito quando vou nessas festas populares e não vejo pessoas com deficiência frequentando. E isso ainda é reflexo de uma mentalidade preconceituosa", diz o especialista.

Algumas iniciativas já são notabilizadas e positivas, argumenta Souza, mas falta muito para que haja equidade nesses ambientes. “Um dos maiores problemas da falta de inclusão é a sociedade não enxergar a pessoa com deficiência como um consumidor qualquer. A gente acha que o cadeirante, o portador de nanismo, o cego, surdo ou a pessoa que tem uma prótese na perna ou nos braços precisa constantemente de auxílio. Esquecem que essa pessoa, trabalha, consome, viaja”.

É o caso da prefeitura de Caruaru, em Pernambuco, que ostenta um dos maiores festejos de São João do País. Em maio, foram abertas pré-inscrições para os camarotes da festa com acessibilidade para Pessoas com Deficiência. A iniciativa, porém, está limitada a 56 vagas por noite de shows para pessoas com deficiência.

Na paraibana Campina Grande, que se autoproclama o maior São João do Mundo, o Camarote da Acessibilidade vem funcionando desde o final de maio com capacidade para atender até 100 pessoas por noite, entre PCDs e seus acompanhantes. Em ambos os espaços é preciso se inscrever e aguardar pela divulgação da lista de contemplados.

Na esteira dessa onda inclusiva, a prefeitura de Araripina, no sertão pernambucano, ampliou neste ano o Espaço da Inclusão no São João Bom de Verdade. Pela primeira vez, o espaço contará com capacidade para receber um número maior de pessoas com deficiência e seus acompanhantes, além de oferecer mais estrutura, conforto e acessibilidade. Este ano foram abertas 20 vagas, segundo o edital. Também é preciso se inscrever e aguardar a lista de contemplados.

Localizado em frente ao palco, o espaço oferece uma visão privilegiada dos shows, além de contar com rampa de acesso, banheiros acessíveis dentro da área e melhorias na circulação em todo o parque do evento.

“Esse é um momento histórico. Pensamos cada detalhe para que as pessoas com deficiência possam viver o São João com mais autonomia, conforto e segurança”, disse a secretária de Direitos Humanos e Cidadania, Karoline Guedes, ao anunciar o novo espaço.

Retorno ignorado

Segundo Souza, um estudo realizado pela Unidade de Inteligência Econômica (EIU, na sigla em inglês) da revista The Economist em 2015, o Índice de Cidades Seguras já apontava que as empresas que olham para o tema acessibilidade com mais atenção faturam 10% a mais do que quem não olha. Ou seja, os números revelam que esse público tem potencial e retorno certo.

Ao buscar na memória por um exemplo de recursos de acessibilidade que foram muito bem aplicados por prefeituras ele menciona o Rock'n'Rio, realizado ano passado na capital carioca. “Diante da dimensão do lugar, fizeram um bom trabalho”, reconhece.

Fato é que acessibilidade como ação exige investimento para execução das adaptações, tanto para PCDs quanto para adaptações a idosos com dificuldades de mobilidade. 

Uma cadeira de rodas motorizada não pode ser adquirida por menos de R$ 15 mil. A importação ou fabricação desses produtos não contam com qualquer tipo de incentivo fiscal, uma questão considerada crucial por especialistas para essa parcela da população. E estamos falando não apenas de cadeira de rodas, mas de bengalas, aparelhos auditivos, próteses de pernas e braços. "No caso da isenção na compra de veículos para PCDs e doenças específicas, a medida é louvável, mas tem se mostrado muito mais benéfica para a montadora do que usuário", afirma Souza.

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