Adobe Stock
Por Daniela Amorim, do Broadcast
[email protected]Rio, 14/05/2025 - O desempenho da geração de vagas com carteira assinada em março ficou aquém do patamar do mesmo mês do ano passado em praticamente todas as principais atividades econômicas do País, segundo um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) obtido com exclusividade pelo Broadcast.
A queda no saldo de empregos gerados alcançou três dígitos em seções tradicionalmente relevantes para o mercado de trabalho brasileiro, como alojamento e alimentação (-215,6%), comércio e reparação de veículos (-126,7%) e atividades administrativas e serviços complementares (-101,2%).
O levantamento tem como base os microdados do Novo Caged, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho. Todos os dez setores analisados passaram de saldos elevados em 2024 para patamares muito inferiores em 2025, “evidenciando não apenas a intensidade da retração, mas também o alcance generalizado da desaceleração no mercado de trabalho formal, com impactos especialmente severos nas áreas de comércio, serviços e indústria”, frisou o estudo assinado pelas pesquisadoras Janaína Feijó e Helena Zahar, do Ibre/FGV.
Segundo Feijó, parte do desempenho mais negativo tem relação com a ocorrência do carnaval em março deste ano, ao passo que em 2024 o festejo foi no mês de fevereiro. Sob influência desse elemento sazonal, o saldo de vagas em fevereiro de 2025 foi bastante expressivo, com uma abertura líquida de 437.111 empregos, descendo a um saldo mais brando, embora também positivo, de 71.576 postos com carteira assinada em março de 2025. Em março de 2024, houve abertura de 245.395 vagas.
"Foi muita coisa para a gente colocar somente na conta do carnaval. Então, provavelmente, isso já é um sinal mais claro de arrefecimento do mercado formal", avaliou Feijó. "Naturalmente, após fevereiro a gente percebe mais demissões, e menos contratações temporárias. Temos também a questão da sazonalidade, devido ao fato de que tivemos carnaval, mas no meio desses eventos está começando a se mostrar mais clara uma desaceleração do mercado de trabalho tão esperada para o segundo semestre. Aqui ela já começa a dar sinais mais expressivos, porque foi um desempenho muito abaixo."
Em alojamento e alimentação, o saldo tinha ficado positivo em 7.576 vagas abertas em março de 2024 passando agora a negativo em 8.755 postos fechados em março de 2025. No comércio, o resultado também saiu de saldo positivo de 38.659 vagas geradas em março de 2024 para negativo em 10.310 postos extintos em março de 2025. Nas atividades administrativas e serviços complementares, o saldo saiu de uma geração líquida de 30.577 vagas em março de 2024 para um enxugamento de 367 postos em março de 2025.
As demais sete atividades econômicas que completam o ranking de principais perdas ainda tiveram saldo positivo de vagas em março de 2025, mas com desempenho expressivamente aquém do registrado em março de 2024: água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e descontaminação (-86,8%); artes, cultura, esporte e recreação (-66,9%); indústrias de transformação (-63,0%); atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (-58,4%); saúde humana e serviços sociais (-53,6%), transporte, armazenagem e correio (-51,3%), e indústrias extrativas (-47,1%).
"Como nós já vínhamos com uma sequência de subidas da taxa de juros, naturalmente os agentes vão se adaptando, as expectativas vão se adaptando ao cenário que vai sendo construído. E essas subidas sucessivas na taxa de juros não tinham uma perspectiva de diminuir no médio prazo. Então, naturalmente, os empregadores vão ajustar também as suas decisões de contratações com base na dinâmica da economia. E o governo não tem conseguido transparecer para a sociedade que vai conseguir cumprir com as metas fiscais. Por isso que a política monetária ainda não tem sido suficiente para conter a inflação. Obviamente tudo isso tende a ter rebatimentos no mercado de trabalho, só que existe um delay. Às vezes, uma subida da taxa de juros demora de 3 a 6 meses para vermos algum efeito no mercado de trabalho", justificou Feijó.
Com o mercado de trabalho menos pujante, os dados por tipo de vínculo mostram que não houve efetivação significativa de trabalhadores temporários e que postos com essa característica foram eliminados em março. O saldo de vagas na categoria temporário passou de uma ligeira criação líquida de 196 vagas no mês de março de 2024 para um fechamento de 12.043 postos em março deste ano, uma queda de 6.244,4%. A categoria Geral, que reúne a maior parte dos vínculos celetistas, teve queda de 74,1% no saldo no período, de uma geração de 211.645 vagas em março de 2024 para abertura líquida de 54.794 em março de 2025.
"Foi uma destruição líquida de postos de trabalho com esse tipo de vínculo temporário. Já se esperava que não houvesse tantas contratações assim de temporários depois de fevereiro, porque sabemos que as festividades de final de ano, como a Black Friday, tendem a impulsionar a contratação de pessoas com esse tipo de vínculo. Mas o que a gente observa é que nesse mês de março foi muito mais expressiva a dinâmica de demissões para essa categoria", explicou Feijó.
Todos os níveis educacionais apresentaram queda no saldo de empregos formais em março deste ano ante março do ano anterior: ensino fundamental incompleto (-24,1%), ensino médio incompleto (-74,2%), ensino superior incompleto (-66,5%) e ensino superior completo (-72,2%).
Segundo Feijó, os resultados não sugerem um momento de crise, mas sim uma estabilização do mercado de trabalho formal.
"O que pode ocorrer é que esse cenário para o segundo trimestre permaneça estável, com bem menos (geração de vagas) do que nós tínhamos visto em relação aos anos anteriores, por conta da elevação sucessiva da taxa de juros", previu Feijó.
Política de comentários
Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.