Agora é lei: restrições à cidadania italiana entram em vigor; veja mudanças

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Antes, os pedidos de cidadania por direito de sangue não tinham limite de geração

Por Paula Bulka Durães

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Publicado em 28/05/2025, às 11h39

São Paulo, 28/05/2025 - Com a promulgação da lei que restringe a cidadania italiana por direito de sangue (ius sanguinis), a Itália limita pedidos a até duas gerações (pais e avós) nascidas no exterior. O decreto, em vigor desde março deste ano, foi transformado em lei e sancionado pela primeira-ministra Giorgia Meloni, como parte da política anti-imigratória do atual governo italiano. 

A lei de nº 74/2025 passou a valer neste último sábado, 24, para todos os pedidos de cidadania feitos depois do dia 27 de março, data em que o decreto foi colocado em prática. Vale ressaltar que o Brasil é o País com a maior comunidade italiana fora da Itália, com cerca de 30 milhões de descendentes.

Para o Viva, o sócio cofundador do FdS Advogados e parceiro do Cidadania4U, Fábio Dias, tira as dúvidas sobre as principais mudanças que a nova legislação implica.

O que muda?

Antes, os pedidos de cidadania por direito de sangue não tinham limite de geração, desde que fosse comprovada a ligação com um ancestral italiano vivo. Com as mudanças, a solicitação fica restrita apenas a filhos e netos de pessoas com cidadania exclusivamente italiana. Ou seja, bisnetos, trinetos e outras gerações perdem o direito. 

Todas as solicitações devem contemplar pelo menos uma das três condições:

  1. Que um dos pais (biológicos ou adotivos) tenha nascido na Itália;
  2. Que um dos pais (biológicos ou adotivos) seja cidadão italiano e tenha residido na Itália por pelo menos dois anos antes do nascimento ou adoção do filho;
  3. Que um dos avós (biológicos ou adotivos) tenha nascido na Itália.

A ordem também elimina a possibilidade de solicitar a cidadania em consulados ou embaixadas – todos os pedidos devem ser feitos diretamente por via judicial, o que, de acordo com o advogado, deve aumentar o tempo de espera. 

A antiga lei segue valendo para todos que entraram com o pedido até 27 de março de 2025, às 23h59 do horário de Roma (18h59 do horário de Brasília) e tenham entregue os documentos ao consulado ou à prefeitura.

É possível recorrer da decisão?

O ideal, segundo Dias, é que os brasileiros excluídos com a sanção procurem amparo legal, alegando a inconstitucionalidade da lei.

"O primeiro passo ainda é reunir todos os documentos que demonstrem que há uma linha de ascendência incontestável, além de comprovar que esse italiano que emigrou para o Brasil lá atrás não se naturalizou brasileiro antes da maioridade de seus filhos. Uma vez reunidos todos estes documentos, eles devem ser traduzidos, apostilados e um advogado na Itália precisa para protocolar a solicitação com base na argumentação da inconstitucionalidade da nova legislação", explica o advogado.

E os menores de idade?

Os filhos menores de idade de cidadãos italianos que nasceram no exterior podem, a partir da nova lei, adquirir cidadania, desde que os pais obedeçam as seguintes regras:

  1. Para filhos que nasceram antes da promulgação, os pais devem declarar a cidadania até 31 de maio de 2026;
  2. Para filhos que nasceram depois da promulgação, os pais têm até um ano após o nascimento ou adoção para apresentar a declaração de interesse na cidadania.

De acordo com Dias, também ganham mais tempo filhos menores de idade, adotivos ou biológicos, de pais que entraram com o pedido de cidadania antes do decreto-lei. "Para filhos menores de idade nascidos antes do dia 27 de março de 2025, de pessoas que já tenham o seu processo de cidadania protocolado antes dessa data também, é possível pedir o reconhecimento da cidadania italiana dessas crianças e adolescentes. Mas a forma como isso será feito ainda não está perfeitamente clara". Segundo ele, a expectativa é que seja publicada alguma portaria nas próximas semanas.

Como fica a situação dos imigrantes?

Agora, os estrangeiros com ascendência italiana, de países com histórico de fluxo migratório italiano, como Brasil, terão facilidade para conseguir visto de trabalho no país. A medida deve favorecer a imigração de pessoas que perderam o direito à cidadania. Os detalhes de como funcionará este processo ainda não foram divulgados. 

Entretanto, uma outra lei, promulgada no mesmo dia pela primeira-ministra Giorgia Meloni, endurece a situação dos imigrantes ilegais na Itália. Desde o último sábado, 24, os pedidos de asilo sofreram restrições. Agora, se houver forte indício de que a solicitação foi feita apenas para evitar a deportação, o imigrante pode continuar detido. 

Resistência na Suprema Corte

Mesmo com a promulgação, a lei pode ser contestada na Suprema Corte italiana, uma vez que o tribunal reconheceu que o direito à cidadania não tem limite de gerações, como aponta o advogado. “O decreto possui características inconstitucionais ao retroagir para retirar um direito que já existia desde o nascimento dos descendentes de italianos”.

De acordo com Dias, a expectativa é que análise da corte não leve mais do que um ano e meio a partir da sanção. "Já foram protocolados processos questionando a constitucionalidade da nova lei nos tribunais mais velozes da Itália, como por exemplo o Tribunal de Campo Basso. Uma vez que esses processos forem julgados, eles serão remetidos para a Corte Constitucional, que não costuma demorar muito nesses casos".

A sanção da lei é uma resposta direta ao momento político vivido na Itália. Em 2024, o Ministério das Relações Exteriores do país registrou um aumento de 40% na população italiana no exterior, que chegou a 6,4 milhões de pessoas, o que, segundo Dias, ampliou a pressão sobre os serviços consulares e administrativos. 

Outro argumento, defendido pelo vice-premiê Antonio Tajani, do partido conservador Força Itália (Forza Italia), é a necessidade de reduzir a sobrecarga do sistema judiciário e das prefeituras no país. 

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