Fundos de startups passam a priorizar empreendedores 50+ e mulheres

Envato

Pesquisa mostra que 15,6% dos empresários entre 55 e 64 anos conseguem consolidar seus negócios, mantendo suas empresas ativas por mais de três anos e meio - Envato
Pesquisa mostra que 15,6% dos empresários entre 55 e 64 anos conseguem consolidar seus negócios, mantendo suas empresas ativas por mais de três anos e meio
Por Alessandra Taraborelli [email protected]

Publicado em 24/06/2025, às 13h56

São Paulo, 24/06/2025 - Para quem pensa em seguir na ativa com um negócio próprio, vale lembrar que nem sempre uma boa ideia é o suficiente para tirar os planos da gaveta. Também é preciso investimento, o que muitas vezes acaba sendo o principal obstáculo. A dificuldade aumenta se o perfil for mulher e pessoas com mais de 50 anos. Isso porque a indústria de investimento é dominada por homens, como atesta a pesquisa “Ecossistema de Venture Capital e Private Equity na América Latina”, realizada pela Endeavor em parceria com a Glisco Partners. Segundo o levantamento, dos 120 sócios de fundos de investimento que aplicam na América Latina, apenas 22% dos gestores são mulheres.

De acordo com o Mórris Litvak, CEO da Maturi, plataforma de oportunidades de emprego para pessoas maduras, faltam investidores com olhar para negócios fundados por 50+. Além do preconceito etário no momento de apresentar as ideias, chamado "pitch", não se vê esse recorte em programas de aceleração e editais, e esse perfil enfrenta dificuldades também no acesso a crédito.

“O etarismo é uma barreira invisível que exclui talentos e experiências valiosas do ecossistema de inovação”, afirma.

Mas, este cenário está mudando, como mostram fundos de investimento em capital de risco e aceleradoras de startups como Sororitê Ventures, Aurora Ventures e SeniorTech Ventures. Saiba mais sobre essas empresas:

Mulheres que investem em mulheres

Uma rede de investidoras-anjos focada em projetos de startups feitos por mulheres. De acordo com Jaana Goeggel, cofundadora e General Partner do Sororitê Ventures, a ideia surgiu da percepção de que não há diversidade entre as pessoas que fazem os investimentos. “São sempre as mesmas pessoas fazendo as avaliações: homens brancos, acima de 40 anos. Assim, não vamos ter decisões diferentes", diz.

“Juntamos algumas amigas que estavam alinhadas com esse pensamento e começamos a buscar startups de mulheres. Percebemos que mulheres também querem atuar como investidoras, mas como isso sempre implicava entrar num grupo onde são minoria, aconteciam situações desconfortáveis. É muito mais difícil para a mulher entrar nessas bolhas de conexão que os homens já estão inseridos há mais tempo”, conta.

O grupo de profissionais de finanças começou, segundo ela, sem grandes ambições, durante a pandemia e tudo era online. Hoje, a rede conta com 150 investidoras e 18 startups investidas. Para receber o aporte é necessário ter ao menos uma mulher no time fundador. “Pode ser mulheres e homens. Nós acreditamos muito em diversidade”, afirma Goeggel.

[Colocar ALT]
"É muito mais difícil para a mulher entrar nessas bolhas de conexão que os homens já estão inseridos", diz Jaana Goeggel - Foto: Luciano Alves

No ano passado, foi lançado o Sororitê Fund 1, fundo de venture capital de R$ 25 milhões com o objetivo de se tornar o principal fundo que investe em startups de estágio inicial fundadas ou cofundadas por mulheres, com foco tem tecnologia (software). A meta é construir um portfólio de 22 startups ao longo de quatro a cinco anos.

“Enxergamos uma expertise coletiva muito rica nessa comunidade, porque essas 150 mulheres são pessoas com muita senioridade, rede de contato,  mentoria. Isso ajuda a abrir portas para leads em potencial. Esse networking é muito valioso”, revela.

Ao contrário do chavão de que é necessário pressão para fazer negócios, ainda mais no mundo das startups, Goeggel afirma que a Sororitê não quer ser um “shark tank” - alusão ao tanque de tubarão, termo usado para quando o investidor vai apresentar seu negócio para os investidores. “Nós queremos ser o tanque dos golfinhos. Você tira muito mais de uma pessoa que entra com confiança; ela baixa a guarda e conta como as coisas são de verdade”, revela.

Apoio emocional ao empreendedorismo feminino

Agora, se além de mulher, você tem mais de 45 anos, outra opção para tentar alavancar o seu negócio é a Aurora Ventures, uma aceleradora de startups, que nasce com o propósito de fomentar inovação e negócios escaláveis fundados por mulheres nesta faixa de idade. “A Aurora surgiu com o foco em mulheres maduras, porque elas estão ainda mais distantes do ecossistema de inovação", afirma Fabio Nogueira, CEO da Aurora Ventures, também consultor e CEO do Observatório da Longevidade.

Ele explica que a startup não precisa ser exclusiva de mulheres. “Senão, eu limito exageradamente e não tem muito sentido na vida real. Mas a liderança, a criação, a condução, a propriedade da ideia, tem que ser dividida com uma mulher”.

De acordo com o executivo, a operação, que vai estar disponível a partir de agosto, visa dar oportunidade para mulheres maduras apresentarem seus projetos e receberem não só apoio financeiro, mas também suporte emocional, infraestrutura, serviços de apoio, o mínimo necessário para uma startup nascente prosperar.

“Nós devemos fazer a nossa primeira chamada de startups no próximo semestre. O tipo de solução que procuramos são as ligadas a marketing e vendas, estamos buscando estimular o surgimento de soluções para dores das empresas focadas nessas áreas”, explica.

Fabio Nogueira
Fabio Nogueira, CEO da Aurora Venture, diz que a empresa quer ter 30 startups no portófio em até cinco anos - Foto: Divulgação

Nogueira explica que serão dois modelos de atuação. Um, será o convite para as empresas resolverem seus problemas corporativos, ou seja, elas apresentam suas dores e a Aurora busca no mercado quem pode ajudar. O outro é abrir portas para quem tem uma boa ideia. “Nós encontraríamos um investidor financeiro interessado e, depois, uma empresa interessada naquela ideia que foi apresentada para nós. Ou seja, de um lado vamos fazer o corporate venture builder (empresa que nasce para atender problemas de empresas que a procuram) e do outro, a aceleração convencional”, explica.

De acordo com o CEO da Aurora, embora a operação comece em São Paulo, o modelo é escalável através da abertura de filiais em outras cidades para atender às necessidades locais. A meta inicial é ter 30 startups no portfólio em até cinco anos, focando primeiramente em São Paulo.

50+ sem preconceito

Outra empresa que está de olho no potencial dos 50+ é a Seniortech Ventures, uma venture builder que procura soluções que possam atender o público sênior. A empresa, aberta em 2022, tem três pilares: despertar o mercado para o potencial da geração 50+ por meio de educação e conscientização sobre o seu valor; combater a miopia de marketing, auxiliando startups a identificarem as oportunidades dentro da economia prateada; e incentivar o empreendedorismo sênior, valorizando a experiência e o conhecimento dessa geração. “A empresa busca conectar a inovação com as necessidades e o poder de consumo do público 50+”, explica Fernando Potsch, CEO da Seniortech.

[Colocar ALT]
Fernando Potsch, CEO da Seniortech, explica que o público 50+ precisa se reconstruir - Foto: Divulgação

O executivo pondera que, além do etarismo quando o profissional 50+ tenta empreender, ainda existe uma resistência interna. “Não adianta você mostrar que tem uma porta escancarada se, internamente, as pessoas se veem como limitadas,  se elas próprias são etaristas. Você só muda essa galera com educação, com muito lifelong learning,  debate e reflexão", diz.

Potsch adota um método que é o "desconstrutivismo pedagógico", segundo o qual é preciso desconstruir para reconstruir.

Embora haja grandes oportunidades para negócios voltados ao perfil 50+, o mercado em geral está mais focado em outras gerações. “Quando você fala sobre esse público, os olhos brilham, as pessoas ficam encantadas, elas não tinham a menor noção que do lado delas tem um oceano azul de oportunidades. A gente ajuda esses empreendedores a olhar uma oportunidade que está do lado dele, que ninguém está atacando”, revela.

A pesquisa "Empreendedores 50+, o futuro do Brasil", realizada pela Empreendabilidade, mostra que 15,6% dos empresários entre 55 e 64 anos conseguem consolidar seus negócios, mantendo suas empresas ativas por mais de três anos e meio. Esse percentual supera em cinco vezes o registrado entre empreendedores de 18 a 34 anos, cuja taxa de sucesso é de apenas 3,8%. Já entre aqueles com idade entre 35 e 54 anos, o índice é de 11,1%.

Comentários

Política de comentários

Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.

Últimas Notícias