São Paulo, 10/06/2025 - Os comerciais de televisão e as propagandas de produtos nos supermercados raramente exibem pessoas mais velhas. Campanhas de moda, viagens e bebidas costumam trazer modelos jovens, na velha máxima do marketing de que é preciso conquistar novos consumidores - novos também em idade. Mas o que poucos profissionais da área se deram conta é que o público 50+ está crescendo a uma velocidade maior que o jovem, e que mesmo após a aposentadoria o poder de consumo perdura por mais algumas décadas. Essa constatação parece óbvia para quem vive na pele o envelhecimento. "Porém, os departamentos de marketing simplesmente não estão acordaram para o potencial do público 50+", diz Fábio Nogueira, fundador do Observatório da Longevidade e consultor de empresas da Next50.
O mercado publicitário trabalha tradicionalmente com segmentos de consumidores que vão do infantil ao jovem e então o jovem adulto.
"Estou tentando convencer as empresas que existe outro público, com um potencial enorme de consumo. O público 50+ merece ser tratado como segmento de mercado", diz o consultor.
Esse potencial se traduz em números. A renda do público 50+ é de R$ 2,8 trilhões, concentrada na faixa de 50 a 60 anos, como mapeou o Observatório. "São pessoas que estão no auge de sua capacidade intelectual e que continuam trabalhando. E as empresas simplesmente não estão olhando para esse público", pontua.
Segundo ele, é difícil encontrar estudos de caso no mercado de consumo, exceto por um punhado de empresas empenhadas no combate ao etarismo e as do ramo de atividade já voltadas para esse público. "Quando um banco faz uma campanha de aplicativo mais fácil de usar por pessoas mais velhas e uma indústria diz ser amigável para o consumidor 50+, aí a gente começa a mudar esse cenário", diz Nogueira.
De acordo com dados e projeções do IBGE, há 60 milhões de pessoas 50+, que correspondem a 27,6% da população total de 217,7 milhões de brasileiros em 2024. Em dez anos, até 2034, a população acima de 50 anos aumentará em 17 milhões de pessoas enquanto a população total do País aumentará apenas 10,6 milhões.
Um desafio é destrinchar a interseccionalidade nesse perfil, já que cada faixa etária tem suas peculiaridades, bem como os segmentos de renda. Os dados analisados pelo Observatório da Longevidade apontam que 47% das pessoas 50+ pertencem à classe C, mas detém apenas 33% da renda. Já as classes A e B somam 15 milhões de pessoas e representam 25% do total dos maduros, mas concentram 60% da renda disponível - ou seja, um mercado potencial de R$ 1,4 trilhão.
E, mesmo assim, a esmagadora maioria dos departamentos de marketing não faz essas contas. "Os próprios chefes do departamento são jovens, que olham para os maduros sob estereótipos", diz Nogueira, com a experiência de atuação como consultor e conselheiro de diversas entidades de classe, entre elas a ADVB - Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing.
Fabio Nogueira, CEO do Observatório da Longevidade, tenta convencer profissionais de marketing sobre a importância do 50+ como segmento de mercado - Foto: Divulgação
As exceções são os segmentos de farmácias e medicamentos, que têm idosos entre seus maiores consumidores, e também o segmento de operadoras de turismo, já que os aposentados têm como principal objeto de desejo viajar. Mas um enorme público fica desassistido no mercado, que é a mulher 50+. "Veja a publicidade das lojas de moda feminina: ou a campanha é para meninas ou para vovós. A mulher madura não se vê representada no segmento de moda", diz Nogueira.
Já o setor de supermercados não está atento a esse público como deveria. Ele conta que em trabalhos anteriores como consultor de multinacionais, fez pesquisas e percebeu que era recorrente a constatação de que a maioria dos compradores de hipermercados era mulher e acima de 50 anos.
Ao mesmo tempo, as principais reclamações dos consumidores iam na contramão desse perfil, apontando a disposição dos produtos em prateleiras ou muito altas ou muito baixas; falta de locais para descanso e letras muito miúdas nos produtos e nas etiquetas. "O varejo, em geral, não quer que o consumidor perca tempo. Mas oferecer cadeiras e água teria um custo baixíssimo e faria uma enorme diferença na experiência de compras das pessoas mais velhas", sugere.
Entre as boas práticas citadas pelo líder do Observatório da Longevidade estão a Alemanha, onde algumas redes de supermercados já oferecem lupas nos carrinhos para ajudar a enxergar os rótulos das embalagens, e a Coreia do Sul, onde estudantes de psicologia se colocam à disposição de idosos para acompanhá-los pelos corredores, apenas para fazer companhia e conversar. "As pessoas idosas vão ao banco, vão ao supermercado para ter alguém com quem conversar", afirma Nogueira. E na Holanda, conta ele, há caixas denominados "slow check-out", separados dos que são utilizados por clientes mais apressados.
Outro ponto importante é a fidelidade do consumidor mais velho. "O público mais velho tende a ser fiel. Se ele consome a mesma marca há 40 anos, ele tende a se fixar, exceto se acontecer algum problema", diz Nogueira, citando globalmente o caso da Jaguar, que mudou a comunicação em busca de um público muito jovem, mas "destruiu a marca para o público maduro. E não tem volta".
Na parte de políticas públicas, o líder do Observatório da Longevidade pontua que melhorias e adaptações se refletem em benefícios para toda a sociedade, e são mais sensíveis na área de saúde pública, habitação e mobilidade. "Uma pessoa de 70 anos não consegue atravessar a faixa de pedestre com um semáforo rápido e as calçadas são esburacadas nas grandes cidades, que em geral são bastante agressivas para os mais velhos", comenta.
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