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Moeda digital criada pelo Banco Central, projeto Drex atrasa

Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil

Para agentes do mercado financeiro, o atual presidente do BC, Gabriel Galípolo, não tem o Drex entre as prioridades de sua gestão - Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil
Para agentes do mercado financeiro, o atual presidente do BC, Gabriel Galípolo, não tem o Drex entre as prioridades de sua gestão

Por Aramis Merki II, Gabriel Baldocchi e Vinícius Novelli, especial para a Broadcast

redacao@viva.com.br
Publicado em 03/11/2025, às 16h27
São Paulo, 03/11/2025 - Já faz dois anos que o Banco Central lançou o projeto do Drex, uma moeda digital criada para facilitar as transações financeiras online, sem a intenção de substituir o real em espécie. 
A ideia do Drex era dar suporte aos chamados contratos inteligentes (smart contracts), que se executam de forma automática, por códigos de computador, quando as condições definidas pelas partes são cumpridas. É uma tecnologia que pode ser usada principalmente em transações de atacado entre instituições autorizadas pelo BC.  
Em 2023, o anúncio da novidade indicava que o Brasil poderia ocupar um lugar de destaque global como vanguarda na modernização da infraestrutura financeira. Assim como o País avançou muito e é case de sucesso em pagamentos instantâneos com o Pix, o piloto trazia a promessa de eficiência nas transações entre instituições, como novos trilhos para o mercado financeiro. 
Passados dois anos, porém, o plano perdeu força dentro da própria autarquia, após dificuldades na implementação da tecnologia e uma mudança de prioridades na gestão do presidente Gabriel Galípolo.

Projeto inicial era lançar em 2025

Seguindo o sucesso do Pix, o Banco Central anunciou em 2023 a criação de uma moeda digital de Banco Central (CBDC, na sigla em inglês), que logo foi batizada de Real Digital Eletrônico X. Seu objetivo era o de converter o real físico em um ativo digital. O Drex, contudo, não é uma criptomoeda: seu lastro é feito na proporção 1:1 da moeda corrente. O BC tinha a expectativa de lançá-lo até o início de 2025. 
O BC brasileiro tomou a dianteira nas experimentações de uma moeda digital própria. A ideia inicial seria que toda transação feita pelo Drex fosse através de um ecossistema descentralizado conhecido como Distributed Ledger Technology (DLT). O foco seriam operações de "atacado", entre instituições, não entre pessoas físicas. A visão de longo prazo é de que toda a economia global vai passar a correr sobre estes trilhos, de maneira mais rápida, barata e transparente.
Ainda em 2023, a autarquia iniciou a primeira fase do plano piloto do Drex. Segundo relatório divulgado, a CBDC naquele momento carecia de "maturidade em relação aos requisitos essenciais para um sistema financeiro robusto e dinâmico".
A segunda fase do projeto foi lançada em 2024. Ela tinha o objetivo de avançar em temas como privacidade e casos de usos práticos da moeda digital. Um dos objetivos, por exemplo, seria simplificar a compra e venda de títulos públicos no mercado de capitais. Uma vez que esses ativos fossem tokenizados e inscritos na mesma DLT que o Drex, não haveria mais a necessidade de passar pela intermediação de uma corretora.

Agenda do Drex segue indefinida

Para o advogado Fabio Rodarte, do escritório Levy & Salomão, que acompanha as discussões de perto, o projeto da emissão de uma moeda digital pelo Banco Central de fato perdeu prioridade. "Talvez a emissão do real digital com uso da tecnologia blockchain nunca tenha sido a verdadeira prioridade do Banco Central, e sim o aprimoramento da infraestrutura de pagamentos existente."
A agenda do Drex para 2026 é considerada "modesta". Em agosto deste ano, o BC anunciou que o projeto não vai mais se dedicar a desenvolver uma tecnologia de registro distribuído (DLT, na sigla em inglês) para o sistema financeiro. O foco será mais restrito, especificamente para operações de crédito. Na prática, isto significa usar os ativos digitais como garantias em negócios desse tipo.
Em evento do setor bancário em julho, o secretário-executivo do BC, Rogério Antônio Lucca, afirmou que as provas de conceito feitas na plataforma não deram segurança em relação ao sigilo bancário e proteção de dados.
Diante disso, os testes da segunda etapa do Drex foram em 13 diferentes usos de caso. Cinco deles tratam de representar ativos em forma digital para reduzir os custos operacionais na cessão de crédito. 
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Ainda não há divulgação do cronograma exato que será seguido, e o relatório da Fase 2 ainda é aguardado pelo mercado. Perguntado sobre previsão para a divulgação, o BC não respondeu até a publicação desta reportagem.
Uma fonte do mercado que participa das discussões considera que a falta de retorno sobre a segunda fase é um indicativo de como a gestão atual do BC não prioriza o projeto. "Os participantes não têm visibilidade nenhuma. Está todo mundo no escuro", diz a fonte, segundo quem havia promessa de publicação de um relatório em outubro com o que foi entregue e os próximos passos, mas até agora não saiu do papel.

Complexidade do projeto

Para Diego Perez, presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), o projeto de uma moeda digital é algo de difícil compreensão, mesmo para os agentes de mercado. "A complexidade e a imaterialidade do Drex acaba fazendo com que o projeto saia do campo de visão das pessoas. Até do ponto de vista do orçamento, tendo em vista que o BC tem recursos limitados, inclusive do ponto de vista de pessoal."
Ele comenta também que a troca de gestão representou uma mudança no interesse sobre o assunto. O ex-presidente Roberto Campos Neto é um declarado entusiasta de tecnologias novas e depositava fichas na infraestrutura blockchain como trilho para inovações financeiras. Já Gabriel Galípolo não demonstra ter os assuntos tecnológicos como prioridade e costuma versar mais questões de política monetária, avalia Perez.
Outro empecilho para a evolução do Drex foi a falta de definição no cronograma. Comparando com o Open Finance, por exemplo, não houve prazos estabelecidos para resultados e nem a participação mandatória de atores da indústria.

Mercado já pensa em alternativas

Entre as empresas que participaram da segunda fase do Drex estão os maiores bancos de varejo do País, além de fintechs e empresas do universo cripto. Apesar de ainda não haver relatório sobre a etapa, o Itaú considera que ela trouxe maior clareza sobre os benefícios do projeto. O banco se dedicou ao tema de crédito colateralizado em ativos financeiros.
Já o Mercado Bitcoin (MB), que entrou em quatro diferentes temas na Fase 2, define que o ritmo do trabalho no Drex foi "consistente, mas cauteloso". Fabrício Tota, vice-presidente da área cripto da empresa, afirma que o mercado se movimentou em direção à inovação com blockchain em paralelo aos avanços do Drex.
"Como a infraestrutura do BC não foi disponibilizada, caberá à indústria se coordenar para criar suas próprias soluções", diz. No curto prazo, isto acarreta o surgimento de diferentes iniciativas, que competem pelo mesmo espaço. Tota enxerga, porém, que no médio prazo a tendência é de convergência e amadurecimento das soluções.
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Como exemplo de alternativas que o mercado já iniciou diante da falta de perspectivas no Drex, está a rede DLT da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A entidade anunciou na semana retrasada um projeto-piloto para testar a oferta de ativos tokenizados, com foco em cotas de fundos de investimentos e de debêntures.
O presidente da Anbima, Carlos André, afirmou que a ideia é correr paralelamente ao Drex, não como um concorrente. "Lá na frente, com o Drex mais maduro, poderemos entregar uma série de respostas em conjunto", diz.

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