Brasília, 28/08/2025 - A
Receita Federal deflagrou nesta quinta-feira, 28, a "Operação Carbono Oculto", que mira um esquema de fraude e lavagem de dinheiro no setor de combustíveis. Estão sendo investigados vários elos da cadeia controlados pelo crime organizado, desde a importação, produção, distribuição e comercialização ao consumidor final até a ocultação e blindagem do patrimônio, via fintechs e fundos de investimentos.
Cerca de 350 mandados de busca e apreensão estão sendo cumpridos em oito estados, dentre eles São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro e Santa Catarina. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ingressou com ações para bloquear mais de R$ 1 bilhão em bens, como imóveis e veículos, para a garantia de créditos tributários.
Segundo as investigações, o grupo usava centenas de empresas para disfarçar a origem ilícita de recursos, sonegava tributos e adulterava combustíveis para ampliar lucros. Importadoras funcionavam como intermediárias na compra de nafta, hidrocarbonetos e diesel, movimentando mais de R$ 10 bilhões entre 2020 e 2024.
Já formuladoras e distribuidoras, além de postos de combustíveis também vinculados à organização, sonegavam reiteradamente tributos em suas operações de venda. A Receita Federal já constituiu créditos tributários federais de um total de mais de R$ 8,67 bilhões em pessoas e empresas integrantes do esquema.
De acordo com a Receita, outra fraude detectada envolvia a adulteração de combustíveis. O metanol, importado supostamente para outros fins, era desviado para uso na fabricação de gasolina adulterada, com sérios prejuízos para os consumidores.
Lavagem de dinheiro
A Receita Federal identificou que postos de combustíveis, distribuidoras e formuladoras também eram usados para lavar dinheiro de origem ilícita. Segundo as investigações, há indícios de que as lojas de conveniência e as administradoras desses postos, além de padarias, também participavam do esquema.
Auditores apontam que mais de mil postos em dez estados movimentaram R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024, mas recolheram tributos muito abaixo do compatível com o volume de operações. As autuações já ultrapassam R$ 891 milhões.
O levantamento também revelou outro expediente: cerca de 140 postos sem qualquer movimentação no período receberam mais de R$ 2 bilhões em notas fiscais de combustíveis. “Possivelmente, essas aquisições simuladas serviram para ocultar o trânsito de valores ilícitos depositados nas distribuidoras vinculadas à organização criminosa”, diz a Receita.
Ocultação
As investigações mostram que o grupo criminoso utilizava fintechs para explorar brechas regulatórias e dificultar o rastreamento do dinheiro. A Receita Federal identificou que uma fintech de pagamento atuava como "banco paralelo" da organização criminosa, tendo movimentado mais de R$ 46 bilhões de 2020 a 2024. As mesmas pessoas controlavam outras instituições de pagamento menores, usadas para criar uma dupla camada de ocultação.
Segundo o órgão, a fintech também recebia diretamente valores em espécie. Entre 2022 e 2023, foram efetuados mais de 10,9 mil depósitos em espécie, totalizando mais de R$ 61 milhões. "Este é um procedimento completamente estranho à natureza de uma instituição de pagamento, que opera apenas dinheiro escritural", detalhou o Fisco.
A Receita diz que a utilização de fintechs pelo crime organizado "objetiva aproveitar brechas na regulação desse tipo de instituição". "Essas brechas impedem o rastreamento do fluxo dos recursos e a identificação, pelos órgãos de controle e de fiscalização, dos valores movimentados por cada um dos clientes da fintech de forma isolada", explicou.
Blindagem
A Receita Federal apura que parte do dinheiro obtido de forma ilícita era reinvestido em negócios, propriedades e outros investimentos através de fundos de investimentos que recebiam recursos da fintech, "dificultando sua rastreabilidade e dando a ele uma aparência de legalidade".
Foram identificados pelo menos 40 fundos (multimercado e imobiliários) controlados pela organização criminosa, com patrimônio de R$ 30 bilhões. A maioria é formada por fundos fechados com um único cotista, muitas vezes outro fundo, criando camadas de ocultação.
Entre os bens adquiridos por esses fundos estão um terminal portuário, quatro usinas produtoras de álcool (mais duas usinas em parceria ou em processo de aquisição), 1.600 caminhões para transporte de combustíveis e mais de 100 imóveis, dentre os quais seis fazendas no interior do estado de São Paulo, avaliadas em R$ 31 milhões, e uma residência em Trancoso/BA, adquirida por R$ 13 milhões.
"Os indícios apontam que esses fundos são utilizados como um mercado de ocultação e blindagem patrimonial e sugerem que as administradoras dos fundos estavam cientes e contribuíram para o esquema, inclusive não cumprindo obrigações com a Receita Federal, de forma que sua movimentação e a de seus cotistas fossem ocultadas da fiscalização", concluiu o órgão.