Envato
São Paulo, 04/08/2025 - Uma pesquisa lançada nesta segunda-feira pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCV) em parceria com Datafolha revelou um dado polêmico: 29% dos cuidadores admitem utilizar palmadas, beliscões e apertos para lidar com a indisciplina de crianças de 0 a 6 anos de idade. Apenas 17%, porém, acham que essa estratégia tem resultado.
O maior percentual daqueles que acreditam que violência física gera maior respeito pela autoridade está entre os homens com escolaridade até o ensino fundamental. Entre as mulheres, 47% acreditam que a violência física resulta em comportamentos agressivos nas crianças.
No Brasil, a prática é proibida desde 2014, com Lei da Palmada (nº 13.010/2014), que veta castigos físicos aplicados a crianças e adolescentes. Também conhecida como Lei Menino Bernardo, ela foi instituída após a morte de Bernardo Boldrini, de 11 anos, vítima de agressões e morte pela madrasta e o pai naquele ano.
O ato de conversar foi apontado como principal estratégia por 95% dos cuidadores, mas 57% também dizem recorrer ao castigo e 40% têm como estratégia disciplinadora gritar ou brigar. Oferecer recompensas para que a criança tenha um bom comportamento foi citado por 36%, enquanto retirá-la do ambiente para acalmá-la foi citado por 84%.
Segundo a FMCSV, tanto violência física quanto verbal são graves, pois deixam marcas profundas na criança. "Há impactos físicos, como lesões, hematomas e cicatrizes; comportamentais, como agressividade, ansiedade, problemas de atenção e depressão; e fisiológicos, como o surgimento de doenças crônicas, prejuízos à memória, ao aprendizado e ao sistema imunológico. Além disso, a exposição à violência contribui para a repetição desse tipo de comportamento na vida adulta, perpetuando o ciclo entre as próximas gerações", aponta o relatório.
Leia também: Volta às aulas: dicas práticas para apoiar os netos na escola
O relatório "Panorama da Primeira Infância: O que o Brasil sabe, vive e pensa sobre os primeiros seis anos de vida" também analisou as respostas dos entrevistados quanto às práticas que mais impactam no desenvolvimento das crianças. Quase todos (96%) citaram "ensinar a respeitar os mais velhos" como a prática mais valorizada.
A taxa de respostas supera outras ações que a ciência comprova como essenciais para o desenvolvimento infantil, como "conversar com a criança", "frequentar creche, pré-escola" e "deixá-la brincar", atividade considerada importante para 67% dos respondentes.
Segundo o relatório, a percepção sobre o brincar precisa ser melhor trabalhada, já que essa é uma das atividades comprovadamente mais importantes para o desenvolvimento das crianças. "Quando brincam, elas aprendem, soltam a imaginação, movimentam o corpo, se relacionam com os outros e exploram o mundo de forma física, sensorial e imaginativa, com suas próprias hipóteses e emoções", aponta o texto.
Apesar dos dados em relação à violência, a pesquisa indica um alto índice de citações a "amor" e "carinho", o que, segundo o relatório, demonstra o reconhecimento da importância da interação entre adultos e crianças, fundamental na construção do vínculo afetivo, um dos elementos essenciais para o desenvolvimento infantil.
Os aspectos “amor”, “diálogo, comunicação” e “cuidados” foram os mais citados entre mulheres, enquanto “presença”, “convívio, companheirismo” e “educação, estudo” foram mais frequentes entre homens.
Leia também: Convivência com os netos faz bem para o cérebro, diz estudo
O tempo de tela também apareceu na pesquisa, mostrando que assistir TV ou usar eletrônicos ocupa, em média, duas horas do dia das crianças. Nesse sentido, há uma preocupação dos responsáveis com o tempo que as crianças passam assistindo TV ou usando celular, tablet e computador: 4 em cada 10 pessoas entrevistadas acreditam que as crianças passam mais tempo do que deveriam com dispositivos eletrônicos.
Além disso, em média, mais de 40% dos cuidadores de crianças de 0 a 6 anos afirmam que o uso de telas torna a criança mais agressiva e limita seu contato com outras pessoas (45%). Para 56%, esse uso afeta a saúde, reduzindo o movimento e prejudicando a visão.
Dentre os adultos entrevistados, 17% acreditam que as telas estimulam o aprendizado na primeira infância. O uso, contudo, é desaconselhado pela Sociedade Brasileira de Pediatria, especialmente para os menores de 2 anos de idade.
A primeira infância é um período que corresponde desde a gestação até os seis anos de vida de uma criança. É uma fase de grande aprendizado, tanto no corpo quanto no cérebro. É considerado por médicos, educadores e pesquisadores de diversas áreas como um período de ouro para o desenvolvimento humano.
O levantamento mostra, porém, que apenas 15% da população brasileira reconhece a primeira infância como a fase mais importante para o desenvolvimento humano e 42% sequer sabem o que o termo significa.
Segundo a FMCSV, "trata-se da fase de maior desenvolvimento do ser humano, quando as conexões cerebrais ocorrem a um ritmo de 1 milhão por segundo e 90% do cérebro é formado. Em nenhuma outra idade esse desenvolvimento será tão rápido e potente".
Política de comentários
Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.