Contratada como caixa aos 73 anos vira exemplo para pessoas de sua idade

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Lúcia Talita Telles: "Acham que, porque temos mais de 60 anos, não sabemos das coisas e não conseguimos aprender" - Divulgação / Grupo Pereira
Lúcia Talita Telles: "Acham que, porque temos mais de 60 anos, não sabemos das coisas e não conseguimos aprender"
Por Cláudio Marques [email protected]

Publicado em 11/07/2025, às 17h12 - Atualizado às 17h35

São Paulo, 11/07/2025 - “As pessoas são muito preconceituosas com a nossa idade. Acham que, porque temos mais de 60 anos, não sabemos das coisas e não conseguimos aprender. E isso não é verdade", afirma Lúcia Talita Telles, hoje com 75 anos. afirma. Em janeiro de 2023, foi contratada como operadora de caixa do Fort Atacadista, em Santa Catarina.

"A minha satisfação foi ter ouvido de colegas que se inspiraram em mim e decidiram procurar emprego, tendo a minha idade ou mais”, conta. A sua jornada de trabalho como caixa começa às 8h e vai até 16h20, folgando às terças-feiras. Com o que ganha, ela ainda ajuda a família. Independente, mora sozinha e gosta de ficar com os bisnetos nos seus dias e horas de folga.  

A Fort Atacadista é parte do Grupo Pereira, sétimo maior varejista do País, que tem 16% de seus 22 mil funcionários na faixa de 50 anos ou mais. A média do mercado, segundo Mórris Litvak, fundador e CEO da Maturi Jobs, é de 5%.  

A organização conquistou, pela segunda vez, a certificação CAFE (Certified Age Friendly Employer), concedida pelo norte-americano Age-Friendly Institute – organização internacional que reconhece empresas comprometidas com a contratação e retenção de profissionais com 50+. No Brasil, A Maturi é representante oficial no Brasil do programa Certified Age Friendly Employer (CAFE).

O preconceito vivido por Lúcia não é isolado e atinge até faixas etárias mais baixas. Pesquisa realizada pela consultoria de recrutamento Michael Page aponta que 41% dos profissionais brasileiros afirmam já ter sofrido etarismo ao longo da carreira. E 29%afirmam que a discriminação os impediu de receber um aumento ou promoção. 

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Claudia Textor contou até com vaquinha para conseguir pagar as contas antes de arrumar emprego- Divulgação / Grupo Pereira

Admitida aos 59 anos, em fevereiro de 2023, na unidade Canoas (RS) do Fort Atacadista, Claudia Textor conta que também vivenciou o preconceito. Seu último emprego havia sido em 2018. “Foram 4 anos desempregada, largando currículos e nada. Cheguei a fazer panos de prato para vender e minha família até fez vaquinha para ajudar a pagar as minhas contas”, recorda.

“Agora, é um paraíso. Estou adorando meu trabalho, diz Claudia Textor, hoje com 61 anos. “Minha esperança é que outras pessoas de mais idade também tenham as mesmas oportunidades”, admite.

“Acreditamos que todas as gerações têm valor”, afirma Paulo Nogueira, diretor de Gente e Gestão do Grupo Pereira. “Valorizar profissionais com 50+ é reconhecer o potencial humano em todas as fases da vida e promover o aprendizado contínuo. Essa diversidade geracional nos torna mais fortes, mais humanos e mais preparados para atender nossos clientes com empatia, excelência e sensibilidade”, acrescenta.

Fundado em 1962 em Itajaí (SC), o Grupo Pereira possui 22 mil funcionários em suas 143 unidades de negócios de várias marcas instaladas nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Santa Catarina, São Paulo, Rio Grande do Sul e também no Distrito Federal.

Preconceito inconsciente

Casos como o do Grupo Pereira vão no sentido inverso à pratica comum no mercado. Andrea Tenuta, head de Novos Negócios da Maturi, diz que o etarismo ainda está muito vivo e inconsciente. “É muito comum as pessoas dizerem que não são etaristas, que a empresa não é etarista, mas na prática não se contratam pessoas com 40 50, 60, 70 mais, não desenvolve as pessoas, não as coloca em projetos estratégicos”, diz ela.

“Valoriza-se a pessoa mais jovem por acreditar que ela é mais tecnológica,  inovadora, rápida, mas isso são estereótipos. A idade não vai ser o que vai definir o que a pessoa é”.

Segundo Litvak, as empresas que estão mais avançadas na questão 50+ chegam a ter 10%, 15% e até 20% de funcionários nessa faixa etária. 

É o caso do grupo Sabin, que mesmo não tendo o selo Age Friendly Employee possui 11,2% de seu quadro formado por pessoas 50+. Ana Claudia Diniz Costa, supervisora da Central de Atendimento, foi admitida na empresa em abril de 2022, aos 47 anos de idade.

“Sabemos que, no mercado de trabalho, acima dos 40 anos, já se sofre algumas algumas discriminações. Eu vivi isso”, diz Ana Claudia.

“No momento em que eu comecei a procurar emprego, depois de ficar desempregada, eu sofri isso sim por parte de outras empresas”, reforça.

Na Sabin, Costa conta que nunca sofreu atos de discriminação por parte de colegas e mesmo da empresa. “Quando eu recebi o convite para participar do processo seletivo do Sabin, em momento algum me perguntaram qual era a minha idade, ou algo como 'com essa idade o que você acha que tem para oferecer?'”

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Ana Claudia Diniz Costa, 50 anos, destaca a importância da inovação sem remeter a jovialidade - Divulgação / Grupo Sabin

Hoje, com 50 anos e com 22 anos de experiência na área da saúde, coordena a central de Brasília do Sabin, com 138 colaboradores e um atendimento de quase 700.000 interações mensais em nível nacional (incluindo voz e WhatsApp), e ainda fornece apoio e orientação a outras 23 centrais de atendimento distribuídas pelo Brasil.

Ela enxerga a inovação como uma oportunidade que deve ser abordada com cautela e segurança. "Hoje, vemos as empresas falando muito de inovação, e quando se fala de inovação se remete à jovialidade", diz. "Eu vejo que há muita coisa bacana para se fazer em termos de inovação. Mas se eu não tiver maturidade, segurança e cuidado maiores, eu posso jogar isso tudo por água abaixo, eu posso não aproveitar a inovação na sua totalidade", afirma.

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"Então, eu acho que a maturidade é um dos pilares que hoje me direcionam a tomar decisões com mais cautela", acrescenta. Costa acrescenta que a maturidade proporciona uma perspectiva que também lhe permite olhar para as relações de forma mais construtiva e evitar impulsos que poderiam comprometer resultados. Ela ressalta a importância de não criar "ranço" nas relações.

Apesar de possuir formação como administradora, complementada por duas pós-graduações: Gestão Estratégica de Pessoas pela FGV e Hotelaria Hospitalar, a profissional deve iniciar, ainda neste semestre, na FGV, um mestrado em projetos, um campo que, segundo ela, complementa seu interesse em melhorar a experiência do cliente e planejar o futuro estrategicamente. Inspirada e desenvolvida por sua gerente direta, a supervisora almeja um cargo de gerência no futuro.

Os 809 colaboradores 50+ do Grupo Sabin atuam em diversas áreas e cargos da empresa, como  técnicos, assistentes, analistas e lideranças, sendo que 41% estão na área técnica, 31% nas áreas de atendimento e administrativa e 28% no setores de serviço de apoio às unidades e motoristas. Criado há 41 anos em Brasília, o Grupo Sabin atuam no ramo de medicina diagnóstica, possui o total 7.000 colaboradores. Suas 358 unidades estão localizadas em 78 cidades de 14 Estados e no Distrito Federal.

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