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São Paulo, 03/07/2025 - As tecnologias de segurança cada vez mais sofisticadas para acessar, abrir contas ou emitir documentos em instituições financeiras e órgãos oficiais, possibilitam, em paralelo, o aprimoramento do crime organizado na era digital.
O número de estelionatos virtuais ultrapassou, em 2021, a quantidade de roubos e é hoje a principal modalidade de crime contra o patrimônio no País, de acordo com os dados mais recentes do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Um dos destaques é o chamado golpe da ‘selfie’, que ganhou relevância com a implementação da biometria facial nos aplicativos e sites de bancos públicos e federais. Recentemente, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) inseriu a tecnologia no aplicativo “Meu INSS” para liberação de descontos automáticos de crédito consignado na folha de benefícios.
Segundo o diretor de fraude e identidade para América Latina da LexisNexis Risk Solutions, Rafael Costa Abreu, o golpe da ‘selfie’ é aplicado por quadrilhas que se passam por uma instituição oficial e entram em contato via Whatsapp, e-mail ou SMS pedindo uma foto da pessoa para uma suposta validação de movimentação financeira, sorteio, premiação ou entrega de encomendas.
“A biometria facial é uma tecnologia que consegue identificar quem você é baseado numa foto. Isso cria um mecanismo de segurança muito forte porque ainda é muito difícil falsificar a foto de uma pessoa. A partir disso, os fraudadores começaram a entrar em contato com as vítimas e pedirem uma ‘selfie’. Com esse ‘clique’, eles podem acessar contas bancárias, fazer empréstimos, abrir contas falsas”, detalha o diretor.
Abreu explica que o contato é feito na maioria das vezes via Whatsapp, pela quantidade de recursos disponíveis na rede social, que permitem com que os criminosos façam chamadas de vídeo em tempo real com as vítimas. “Fazer uma ligação no Whatsapp facilita com que os bandidos instruam a vítima sobre os ângulos das fotos, exigidos pelos canais oficiais, como pedir que levante o rosto para cima, para baixo, vire de perfil para a direita, depois para a esquerda, entre outros movimentos necessários para a fraudar a identidade”.
De acordo com uma pesquisa realizada em 2024 pelo Instituto DataSenado, com 22 mil respondentes, os golpistas não fazem distinção de idade. Todas as faixas etárias analisadas pelo estudo relataram ter caído em fraudes virtuais, com percentuais próximos. O destaque vai para o público jovem, de 16 a 29 anos, que representam 27% das vítimas. As pessoas idosas, de 60 anos ou mais, são 16%.
O estelionato digital cresceu 13,4% entre 2023 e 2024, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O aumento desses crimes frente aos roubos comuns começou a ser observado em 2020, na pandemia da Covid-19, quando o isolamento social exigiu que a população brasileira resolvesse mais burocracias e transações financeiras no meio online.
Segundo o Atlas da Violência 2025, o Brasil teve um golpe digital a cada 16 segundos em 2023. Naquele ano, foram registrados quase 2 milhões de boletins de ocorrência desse tipo de crime. A pesquisa “Top of Mind 2023”, do Datafolha, aponta que 85% da população do País acima dos 16 anos, independente da faixa de renda, possuem um smartphone.
Para os especialistas consultados nesta reportagem, a facilidade no acesso a essas tecnologias fez com que os criminosos migrassem as operações do meio físico para o ambiente virtual. As quadrilhas têm acesso às informações sensíveis de milhares de pessoas no País, como CPF, e-mail e número de celular, devido ao cenário brasileiro de vazamento de dados, que são comercializados ilegalmente na deep web – páginas não monitoradas na internet.
É preciso ficar em alerta, mas sem desconfiar dos canais oficiais que solicitarem biometria facial. “Se você acessou o aplicativo ou portal do banco e ele solicitou uma foto, esse pedido é legítimo. A desconfiança deve vir dos contatos via aplicativos de mensagem, SMS, ligação de telefone, e-mail ou links suspeitos. Se o pedido vier por essas vias, pode ficar com um pé atrás”, diz Abreu.
O advogado Daniel Marques, presidente da AB2L e especialista em direito digital, alerta para a falta de letramento cibernético como uma abertura para cair em golpes virtuais como o da ‘selfie’.
Acabamos caindo em golpes justamente por uma falta de atenção e de educação digital. Então, essa prudência ao passar suas informações é muito importante”, explica o jurista.
“Nenhuma instituição financeira vai pedir seus dados por mensagem ou telefone. Eles solicitam suas informações através dos canais próprios, que são os próprios aplicativos, seja do banco, seja de empresas de tecnologia e e-commerce. Então, o primeiro passo é nunca ceder esse tipo de informação fora da plataforma”, instrui o advogado.
Caso a pessoa caia no golpe da ‘selfie’ ou em outra fraude digital, a primeira etapa é alertar a instituição financeira e, em seguida, procurar a delegacia mais próxima para registrar o boletim de ocorrência, explica Marques. “A instituição financeira ou a empresa vai checar seu histórico e comportamento. A depender disso, ela pode reaver o valor desviado. Mas, independente de conseguir de volta o dinheiro, é importante sempre manter a denúncia porque é isso que vai ajudar nas investigações”.
Como agir se cair no golpe:
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