Belém, 22/11/2025 - A criação de um roteiro definindo o que mundo precisa fazer para abandonar os
combustíveis fósseis, como petróleo, ficou de fora do documento final da COP30, que deverá ser aprovado nas próximas horas em plenária. O texto, batizado de "Decisão Mutirão", foi publicado por volta das 11h20, após os negociadores passarem toda a noite discutindo o tema.
A falta do roteiro para abandonar o petróleo e outros fósseis, grandes vilões do aquecimento global, frustra ambientalistas, que esperavam avanços mais significativos na transição energética.
A especialista em políticas climáticas da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, Fernanda Bortolotto, classificou como “ambígua” a última versão do principal texto resultante das negociações na COP30. Além da falta de mapas do caminho para a redução ou fim da dependência dos combustíveis fósseis, o texto também não traça um roteiro para reverter o desmatamento. “Justamente as duas principais causas da crise climática", declarou.
Ela explica que as duas agendas em questão não aparecem com “a força necessária” e fala ainda em frustração, especialmente com o simbolismo da COP sendo realizada na região amazônica. “Mesmo quando há menções pontuais, elas não se traduzem em compromissos claros, e isso enfraquece a capacidade da COP de orientar a ação global em direção ao fim dos fósseis e do desmatamento”, disse.
Por outro lado, na visão de Fernanda Bortolotto, houve avanços importantes. Uma delas é que o texto reforça que todas as ações climáticas devem se basear na melhor ciência disponível, incluindo o papel do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) - órgão das Nações Unidas que avalia a produção científica relacionada à mudança climática.
Outro avanço, conforme a argumentação, foi a criação de um grupo de trabalho para discutir o artigo 9.1 do Acordo de Paris - especificamente aquele que trata do financiamento dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento.
“Em três textos diferentes, seus direitos territoriais são reconhecidos explicitamente como política central de mitigação, e o princípio do consentimento livre, prévio e informado volta a aparecer como requisito para qualquer ação que os afete", avaliou.
No tema da adaptação às mudanças climáticas, os resultados também são considerados mistos. “A meta global de adaptação avançou com a adoção de indicadores, mas o número foi significativamente reduzido, o que mostra como as disputas políticas pesaram mais do que a urgência da crise", disse Bortolotto.
O chamado para triplicar o financiamento de adaptação, anteriormente demandado até 2030, foi adiado para 2035. Há, ainda, a previsão de revisar esses indicadores nos próximos dois anos, o que pode abrir uma brecha para reforçar a ambição.
Para o Greenpeace, a "Decisão Mutirão" não dá uma resposta ao tamanho da emergência climática que o mundo vive. "Não traz nem mapa e nem caminho para a transição para longe dos combustíveis fósseis e para o fim do desmatamento até 2030, e não garante que os recursos necessários para adaptação, absolutamente essenciais para os países em desenvolvimento, sejam de fato mobilizados pelos países desenvolvidos", disse Carolina Pasquali, diretora executiva do Greenpeace Brasil.
Povos indígenas
Uma das grandes vitórias da COP30 foi o reconhecimento do papel dos povos indígenas para a mitigação climática, ou seja, como agentes importantes na redução do aquecimento global.
“O papel vital dos Povos Indígenas e das comunidades locais e a necessidade de apoiá-los na gestão e no uso sustentável das florestas, bem como a importância de reconhecer seus direitos territoriais e seus conhecimentos tradicionais, inclusive como parte de políticas de mitigação de longo prazo”, diz o texto sobre mitigação.
Também considerado positivo pelos ambientalistas foi o fato de o texto “Mutirão”, que reúne as principais decisões da COP, afirmar, já no primeiro parágrafo, que os países devem adotar medidas para enfrentar as mudanças do clima “respeitando os direitos dos povos indígenas - incluindo seus direitos territoriais e conhecimentos tradicionais”. A menção a esses povos aparece ainda na parte de Transição Justa.
“Essa COP foi uma super vitória para os povos indígenas, porque conseguiu em três textos destacar os direitos territoriais como política para mitigação, reconhecer seus direitos. O movimento indígena veio com uma grande presença e uma presença qualificada que conseguiu ter esses resultados no texto”, diz Bortolotto, da TNC Brasil.
Ao longo da COP, os povos indígenas tiveram um papel central, reunindo grandes manifestações pela demarcação de terras e contra grandes empreendimentos sobretudo na Amazônia.
Em um dos episódios mais emblemáticos da conferência, um grupo de manifestantes, entre eles indígenas, invadiu a zona azul da ONU, onde acontecem as negociações.
Após sucessivas manifestações, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, se reuniu com representantes dos povos indígenas, que depois também foram recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. (Com informações do Estadão Conteúdo)