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Casal de 70 encontra novas aventuras ao sair de moto

Foto: Arquivo pessoal

Casal já percorreu mais de 600 mil km e conheceu diversos países da América Latina e vê na estrada uma forma de terapia - Foto: Arquivo pessoal
Casal já percorreu mais de 600 mil km e conheceu diversos países da América Latina e vê na estrada uma forma de terapia

Por Carla Nigro, especial para o Viva

redacao@viva.com.br
Publicado em 08/11/2025, às 16h25 - Atualizado às 16h29
São Paulo, 08/11/2025 - O mototurismo tem conquistado cada vez mais brasileiros 50+ ao unir bem-estar mental, novas experiências. Também estamos falando de um mercado com potencial de movimentar milhões na economia do turismo. Isis Bueno tirou sua primeira habilitação de moto aos 56 anos. Até então, conta que não gostava da ideia de pilotar. Como técnica em radiologia, ela via de perto o lado ruim das motos: os acidentes. A época em que pilotar não era natural para Isis já passou há muito tempo. Hoje, com 72 anos, viaja pelo mundo de moto ao lado do marido Alaor Bueno, de 75.
Inspirado e cheio de energia, o casal já percorreu cerca de 600 mil quilômetros e afirma que o mototurismo os faz sentir rejuvenescidos. 
Somos aventureiros. Na nossa cabeça não temos 70, mas sim um comportamento de 30, completa Isis, empolgada.
Assim como eles, há muitos que decidem pôr em prática o sonho de percorrer o mundo em duas rodas. A Confederação Brasileira de Motociclismo (CBM) afirma não possuir dados atualizados sobre o número de motociclistas acima dos 50 anos no país. O último levantamento, de 2013, apontava cerca de 50 mil.
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Foto: arquivo pessoal
Embora não existam estatísticas oficiais recentes, a confederação e motoclubes confirmam que o público sênior vem crescendo. O Insanos Motoclube, um dos maiores do Brasil, estima que 30% de seus 22 mil integrantes tenham mais de 60 anos. Ao todo, há entre 3,3 mil e 4 mil motoclubes no país.
Na estrada há mais de 18 anos, Isis e Alaor notam que cada vez mais pessoas com mais de 50 anos viajam de moto, principalmente mulheres. Nessa fase, as obrigações já foram cumpridas: os filhos cresceram e a aposentadoria chegou, explicam.
A pessoa com mais de 50 anos já está livre para algumas coisas. Ela deseja alcançar o mundo, fazer tudo o que não fez devido ao trabalho e à família.  Geralmente, nessa fase, você já tem uma casa própria. Os filhos já não dependem de você.
Neste ano, o casal só não viajou em agosto. E nem tudo é planejado: uma vez, saíram do Espírito Santo com destino a Salvador — mas a viagem acabou se estendendo até Machu Picchu, passando por Chile, Peru e Argentina.

Susto na Cordilheira dos Andes 

Já tendo viajado pela maior parte da América Latina, o casal conta que cada aventura é especial à sua maneira. Isso não significa que já não tenham enfrentado perrengues. Um deles os colocou diante de um abismo, 15 anos atrás. “Foi o maior susto que já levei na minha vida”, conta Isis.
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Foto: Arquivo pessoal
O imprevisto aconteceu na Cordilheira dos Andes. O casal escolheu um caminho pouco usado, e chegou a um trecho conhecido como cuestas — subidas íngremes e com abismos dos dois lados.
“Paramos num pare e siga e, quando liberaram a pista, tínhamos 40 cm de terra para passar. O resto da estrada era ocupado por pilhas de pedras, e só carros conseguiam atravessar. Rodamos 8 quilômetros por aquilo, apavorados”, conta Isis. “Não tinha como voltar, tinha que ir em frente”, completa Alaor.
O prazer de viajar é tão grande que você acaba superando todas as dificuldades.
A idade, reforça a dupla, não é um problema. Para o casal, o motociclismo os faz se sentir quase 40 anos mais jovens. Mas ela traz limitações que não podem ser ignoradas. Isis cita a diminuição da disposição e da flexibilidade. Já Alaor precisou trocar para uma moto mais leve e fácil de manobrar ao envelhecer.
“Você tem que respeitar as limitações”, explica Isis. “A moto do meu marido continua potente, o mesmo motor. Só que o peso mudou, não tem mais todas as características que tinha. A gente vai se adaptando”.

Rotina de cuidados

Entre uma viagem e outra, o casal mantém uma rotina de cuidados. Fazem check-ups médicos, cuidam da alimentação e não abrem mão dos exercícios. “A idade cobra”, diz Isis. 
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Foto: Arquivo pessoal
Mas a aventura precisa ser vivida com segurança. Alaor lembra que o risco existe — entre motociclistas, é comum o ditado de que quem ainda não caiu, um dia vai cair. Ele observa que, com a experiência, vem também a confiança — e, às vezes, a tentação de se arriscar mais. Por isso, recomenda atenção aos detalhes: “não despreze os mínimos cuidados de segurança”.
A Confederação Brasileira de Motociclismo (CBM) reforça três princípios que ajudam a reduzir riscos:
  • veja e seja visto;
  • respeite o próprio tempo, sem buscar acelerar e
  • mantenha distância suficiente para frear com segurança.

Quando a moto vira terapia

Para Isis, em especial, viajar de moto ajudou a superar um momento difícil da vida. Logo após se aposentar, ela começou a sentir sintomas da depressão. Alguns estudos observam uma conexão entre a aposentadoria e o aumento do risco de depressão. Um levantamento do Institute of Economic Affairs (IEA), de 2013, apontou que as chances de ocorrência da doença aumentam em até 40% após a aposentadoria, no longo prazo.
A geriatra e presidenta da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Espírito Santo, Daniela Barbieri, explica que a falta de rotina, de estímulos mentais e de conexões sociais pode levar a sentimentos de menos-valia, perda de papel social e depressão. “A aposentadoria mal planejada pode aumentar o risco de depressão. Já a bem planejada pode ser uma oportunidade de realizar sonhos longamente adiados e seguir novos projetos”, observa.
Alaor percebeu que Isis não estava bem e insistiu para que tirasse a habilitação. Foi o início de suas aventuras juntos. “Na moto, você não sente dor e nem lembra que deve”, conta Alaor. “Mototurismo é terapia”, reflete Isis.
Nessa experiência, os motoclubes também fazem parte. Eles criam uma sensação de pertencimento, como se fosse uma família. “Motociclista sempre ajuda motociclista”, afirma Alaor, que integra o Bodes do Asfalto.
Outro exemplo é o Insanos MC que há seis meses oficializou o projeto 60+ — uma iniciativa que incentiva pessoas a não se limitarem por causa da idade e viajarem mais. “Enquanto a pessoa tem uma rotina e trabalho, é uma coisa. Mas, quando se aposenta, muitas vezes entra em depressão”, observa Bruno Henrique, integrante do clube e da equipe de comunicação do Insanos, ressaltando que também há um projeto voltado para saúde mental masculina.

A economia do turismo

Motociclistas sêniores têm algumas características que os distinguem dos mais jovens, explica José de Jesus Teiga, diretor de Mototurismo da Confederação Brasileira de Motociclismo (CBM). Eles buscam aproveitar a viagem com calma, observar a paisagem e não se preocupam tanto com a velocidade. Além disso, valorizam acomodações confortáveis e alimentação de qualidade.
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Foto: Arquivo pessoal
Para atender esse público, Teiga destaca a importância de uma boa infraestrutura — que envolve toda uma cadeia produtiva: hotéis, postos de combustível, segurança pública e viária, entre outros. A CBM tem trabalhado para transformar isso em realidade. A confederação vem mantendo contato com governos estaduais com o objetivo de fomentar o mototurismo, promovendo desde a criação de guias específicos até treinamentos e qualificações voltadas aos serviços que atendem viajantes. Um dos resultados desse trabalho foi o Guia de Mototurismo do Estado de São Paulo.
A CBM vê o mototurismo como uma fonte de renda muito importante em toda a cadeia produtiva do turismo no Brasil. Com melhorias na estrutura, num espaço de dez anos, a probabilidade é que é possível incrementar em torno de 10 milhões por ano no turismo.
Segundo ele, investir nessa estrutura também aumentaria o número de praticantes. Hoje, essa modalidade ainda não é acessível para a maioria.
“Precisa de tempo e dinheiro. Toda a cadeia ainda não está preparada para atender o público B, C e D. É aí que entra o nosso projeto”, explica.

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