Entenda o que a síndrome de Frankenstein e como ela se relaciona com a IA
Foto: Adobe Stock
Publicado em 06/12/2025, às 16h00
São Paulo, 06/12/2025 - Esqueça o monstro costurado com partes de cadáveres do romance de Mary Shelley ou os robôs armados de O Exterminador do Futuro. O medo humano de ser destruído por sua própria criação, conhecido como "Síndrome de Frankenstein", foi atualizado para esta década, mas o novo "monstro" tem uma característica ainda mais perturbadora: ele é invisível.
O que é a síndrome de Frankenstein?
Historicamente, a Síndrome de Frankenstein descreve o pavor que sentimos quando uma tecnologia ganha autonomia e vai para o mundo sozinha, reagindo de formas que não previmos. O conceito ganhou força no século XX, principalmente nos períodos de desenvolvimento de novas tecnologias, como a energia nuclear. Durante a Guerra Fria, por exemplo, o medo em torno das armas nucleares ecoava esse mesmo temor.
No cenário atual, esse medo é impulsionado pela presença constante e silenciosa dos algoritmos e da inteligência artificial (IA). A título de exemplo, o ChatGPT possui mais de 800 milhões de usuários ativos semanais, de acordo com dados divulgados pela OpenAI em outubro de 2025; outras ferramentas como o Google Maps, que oferece rotas de transporte em tempo real, tem mais de 2 bilhões de usuários ativos por mês.
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Segundo Ricardo Cappra, cientista de dados, filósofo e autor do recém-lançado livro Híbridos, o susto não vem de entender a complexidade técnica de um modelo como o GPT, mas de notar pequenas interferências diárias. "Quando percebo que a qualidade do meu texto tem uma interferência direta de IA, mesmo que eu use apenas um corretor no Word, e ele sabe a próxima palavra que vou escrever, isso significa que ele tem o contexto do que estou pensando. E isso é assustador", afirma o pesquisador.
A sensação resultante é a de que colocamos algo no mundo que governa nossas rotinas, mas que não temos capacidade de controlar. Cappra adiciona que a humanidade vive um momento de angústia diante da IA não porque teme um ataque físico, mas sim, porque percebe que perdeu o controle sobre o contexto ao seu redor.
"Nós não conseguimos tangibilizar a inteligência artificial. Ela é uma interferência cognitiva e, se eu pedir para você fazer um desenho dela, você não vai conseguir", explica Cappra.
Híbridos
A tese central do novo livro de Cappra é que já não somos apenas humanos usando máquinas, mas sim "seres híbridos". Esse conceito define o indivíduo que vive uma interdependência profunda entre humano, dados e máquinas, muitas vezes sem perceber.
"Um exemplo super simples é o smartphone como complemento do nosso armazenamento de informação. A gente desliga um pedaço do nosso armazenamento cerebral quando vai dormir e deixa o celular de lado", ilustra Cappra, apontando que tratamos a tecnologia como uma extensão biológica da memória.
Outro exemplo claro dessa hibridez é a dinâmica dos motoristas de aplicativo. Segundo o pesquisador, a relação de trabalho desses profissionais é inteiramente mediada por IA: o passageiro, a rota, o valor da corrida e até o atendimento via chatbot são definidos por algoritmos.
"O único processo de execução de trabalho que ele faz é dirigir um veículo, pilotar a máquina. Ele não tem o processo cognitivo realizado, ele só tem processo manual", analisa.
Uma saída para que o temor da tecnologia seja diminuído é que as pessoas ganhem consciência sobre a realidade mediada pela IA em que vivemos. Ações como alfabetização digital nas escolas e em eventos públicos e mais informações disseminadas e fáceis de serem absorvidas sobre como essas tecnologias funcionam, mesmo que vivam em constante mudanças, trarão mais clareza para as pessoas, que ainda estão se descobrindo em um mundo contornado pela inteligência artificial.
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