Projeto com idosos no metrô do DF lê palma da mão com biometria na catraca

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Desde o início das operações, mais de 1,6 mil pessoas idosas toparam participar do teste - Divulgação
Desde o início das operações, mais de 1,6 mil pessoas idosas toparam participar do teste
Por Paula Bulka Durães paula.bulka@viva.com.br

Publicado em 19/09/2025, às 08h41 - Atualizado às 09h45

São Paulo, 19/09/2025 - Filas que fluem rápido, pagamentos descomplicados e acesso a meios de transportes e grandes eventos só com a palma da mão – sem a necessidade de apresentar documento algum. A biometria está se tornando mais frequente no dia a dia dos brasileiros. A novidade é no metrô de Brasília, que escolheu idosos para testar uma nova tecnologia biométrica.

Desde o início deste mês de setembro, o Palmee, sistema de autenticação importado da holding chinesa Tencent e distribuído no Brasil pela Assertif, está em uso no metrô de Brasília. A fase de testes conta com idosos que aceitaram participar. São já 1,6 mil pessoas cadastradas no projeto, de um total de 5,1 mil pessoas acima de 60 anos que circulam diariamente pelas estações Águas Claras e Concessionárias.

Como funciona a biometria no metrô de Brasília

Ao chegar na plataforma, o usuário é abordado por um funcionário que convida, de forma voluntária, a escanear a mão na catraca especial. Em menos de um segundo, a máquina, combinada com o dispositivo infravermelho, faz a leitura completa da palma, sem nem precisar encostar a mão.

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A leitura do desenho da palma da mão, das linhas e veias e também da temperatura gera um código alfanumérico, único para cada um. Pronto, agora é possível circular no metrô, sem portar cartão, bilhete de transporte ou qualquer outro documento.

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Catracas no metrô de Brasília funcionam com leitura da palma da mão. Projeto piloto envolve idosos - Divulgação

Os testes em Brasília têm data para acabar: os cadastros vão até dia 30 de setembro e as catracas especiais seguem em operação até o fim do prazo de 60 dias (final de outubro). Depois disso, a permanência do sistema depende da abertura de um edital de licitação pela Companhia do Metropolitano do Distrito Federal. 

Em nota, a estatal afirmou que os custos para a implementação, operação e suporte nessa fase de testes são exclusivos da Assertif, empresa brasileira de soluções tecnológicas.

A proposta de tornar a biometria permanente “ainda não está em etapa de discussão”, diz a nota, mas que o teste “pode significar uma parceria futura para que o Metrô-DF implemente uma tecnologia que traga ainda mais comodidade e rapidez no acesso aos serviços”.

Entretanto, a ambição da Assertif é maior, nas palavras do diretor de estratégia e portfólio, André Nicolella. “Agora é o metrô, posteriormente estamos falando da possibilidade de usar essa tecnologia em ônibus, terminais rodoviários, aeroportos. Do outro lado, há grandes eventos, como shows e festivais que podem vir a se interessar”, comenta.

Desde o início das operações, as cerca de 1,6 mil pessoas idosas que toparam participar do teste, além de fazer o cadastro para a leitura da mão, preencheram um formulário via leitura de QR Code, mas sem a necessidade de baixar um aplicativo. Também fazem parte dos grupos de testes bombeiros e policiais militares, todos com acesso gratuito ao modal.

Biometria facial é diferente

Apesar de menos difundida do que a facial, a biometria da palma da mão traz mais inovação, rapidez e segurança para os usuários, segundo o especialista em cibersegurança e professor de MBAs da FGV, Rafael Coimbra. “A facial compara uma série de marcações de pontos no rosto que fazem, combinado com o movimento, com que se identifique se é aquela pessoa ou não, além de ser muito mais acessível hoje. Mas o grau de precisão da palma da mão é muito alto e absurdamente mais difícil de fraudar”, defende.

Para o professor, as tecnologias mais modernas de biometria da mão impressionam por olhar para dentro do corpo, que torna a identidade de uma pessoa algo exclusivo e só detectado ali, na hora. “A luz infravermelha penetra a pele e faz um mapa que se assemelha com rios, com o sangue correndo nas veias”, compara.

Segundo André Nicolella, da Assertif, a diferença de outras biometrias já em uso no País, como a biometria facial, exigida hoje em operações bancárias, para entradas em alguns estádios e, mais recentemente, para autorizar empréstimos consignados no INSS, é maior rapidez e proteção a falhas. “A biometria facial gera um erro a cada 10 mil leituras. O Palmee gera um a cada bilhão. Além disso, ele não armazena uma foto da mão e sim converte em dado numérico, ao contrário da biometria facial, que capta uma imagem e compara com essa captura as informações.”

Ele defende que a precisão da máquina permite a identificação até mesmo de mãos que apresentavam manchas, queimaduras, deformações e atrofiamentos. “Realizamos testes com resultados positivos com mãos extremamente machucadas", diz o executivo. No caso de usuários que não tiverem as duas mãos, é possível também acessar o leitor via leitura de cartão, garante.

Para onde vão os dados?

Por se tratar de uma Prova de Conceito (PoC) – demonstrativo de uma ideia para mostrar se ela é viável antes de um investimento – as pessoas idosas abordadas para realizar o cadastro biométrico recebem um formulário de autorização de tratamento dos dados pessoais. 

Neste documento, a Assertif e o metrô de Brasília se comprometem a armazenar com segurança as informações pessoais e utilizá-las somente no período de testes, com a obrigação de excluir permanentemente os dados ao fim dos 60 dias, “sem possibilidade de recuperação”.

Para Coimbra, a maior segurança contra vazamentos está relacionada à criptografia, ou seja, os verdadeiros dados sensíveis ali são o CPF e outras informações recolhidas por fim de cadastro, como nome e sexo. Já o alfanumérico, gerado a partir do scanner da mão, está condicionado à tecnologia que o originou. 

“Um criminoso provavelmente não conseguirá fazer engenharia reversa, criar um equipamento que conseguisse ler a mão de Maria e João. Ele não conseguiria reproduzir aquele número, o risco é praticamente zero”, explica. 

Negócio da China

Operado no Brasil pelo Grupo Assertif, o Palmee é um produto desenvolvido pelo conglomerado tecnológico Tencent, multinacional chinesa que figura em rankings como uma das empresas mais lucrativas do mundo, em um país que equilibra o desenvolvimento tecnológico com o controle do Estado. 

Para efeitos de comparação, o professor de MBAs da FGV, André Miceli, compara a tecnologia chinesa com a gigante Amazon, dos Estados Unidos. “A Tencent tem uma atuação forte nas redes sociais, com jogos, serviços financeiros digitais e nuvem, com diversos campos de atuação, mais ou menos como a Amazon faz, não é uma empresa mega especializada em um único nicho”, explica.

A parceria entre a Assertif e a Tencent Cloud, firmada há alguns meses, torna a brasileira a única representante em território nacional do Palmee, com planos previstos de expansão da tecnologia para 2026 e 2027 nas áreas de saúde, mobilidade, eventos e meios de pagamento. 

O pesquisador explica que as empresas chinesas trabalham com padrões globais de segurança e certificações, mas, que assim como as big techs americanas, estão sujeitas a falhas de segurança. “Já vimos episódios de ataques acontecerem com a Microsoft, a Alphabet, do Google, e temos relatos de mega vazamentos envolvendo o ecossistema da Tencent. A desconfiança não é infundada, mas não é um problema exclusivo de empresas chinesas”, aponta. 

De acordo com o Global Cybersecurity Index 2024, relatório internacional que ranqueia países por níveis de cibersegurança, a China tem classificação “avançada”, junto a nações como o Canadá, Hungria, México, Uruguai e Israel. O Brasil está posicionado na categoria acima, como “modelo a ser seguido”, junto a Índia, Estados Unidos, Japão, Austrália e outros. 

A China possui um conjunto de leis de proteção e segurança de dados, como a Lei de Proteção de Informações Pessoais (PIPL), em vigor desde 2021. Para Miceli, a diferença do país oriental para outros que também possuem legislações específicas é a força estatal. “Existe uma proteção, mas com menos independência em relação ao governo do que no caso europeu, que tem o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR).”

O especialista em direito digital, proteção de dados e sócio da Godke Advogados, Alexander Coelho orienta que, para as próximas operações do Palmee no Brasil, é importante que a Assertif se comprometa, junto a Tencent, a respeitar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira, sobretudo no que diz respeito à transferência internacional de informações. 

“Se os dados ficarem armazenados com a Assertif a situação é uma. Agora, se forem destinados a um banco internacional, como da Tencent, é importante obedecer os artigos 33 e 66 da LGPD e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que pode prever sanções e multas milionárias caso as empresas operem inadequadamente no País.”

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