Publicado em 15/10/2025, às 15h27 - Atualizado às 15h49
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São Paulo, 15/10/2025 - A aposentadoria dos professores no Brasil segue, em linhas gerais, critérios que foram estabelecidos em 2019 pela Reforma da Previdência. Na prática, porém, a concessão do benefício varia de acordo com a rede de ensino e o regime de contrato de trabalho.
Segundo a advogada Viviane Grosso, especialista em Regime Próprio de Previdência do Servidor Público (RPPS) e professora da educação básica, em alguns municípios e Estados é possível entrar com o pedido de aposentadoria a partir dos 50 anos de idade, considerando 25 anos de contribuição para mulheres e 30 para homens. Em outras, a idade mínima varia de 50 a 60 anos, mudando também o tempo de contribuição, que pode ser igual ou menor ao estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Fatores como regras de transição e acúmulo de cargos em diferentes redes de ensino também impactam no pedido, o que leva muitos docentes a se aposentar de uma rede e seguir trabalhando em outra. Segundo o último Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), dos mais de 2,3 milhões de professores de educação básica no Brasil, 25% são pessoas com mais de 50 anos de idade.
Para esses, os desafios da continuidade na sala de aula esbarram em dois novos desafios: os riscos à saúde mental e o etarismo. Segundo a educadora Carol Campos, diretora do Vozes da Educação, o cenário se intensificou após a pandemia de covid-19. "Antes da pandemia, os professores estavam exaustos. Depois, estão adoecidos."
Ela diz que, além da sobrecarga e da baixa remuneração, os docentes enfrentam dificuldades relacionadas à participação das famílias dos alunos, que ora são ausentes, ora vigilante demais.
"Existe, nas redes públicas, por exemplo, uma falta de participação mais acentuada, mas quando a escola dá limites, a família coloca-se à frente, muito em razão do estilo de parentalidade que vivemos hoje. Já nas particulares, tem a hiper participação de forma inadequada, como grupo de mães questionando critérios de correção de provas ou seguindo professores nas redes sociais para investigar sua ideologia."
Conflito intergeracional
Carol Campos: "Antes da pandemia, os professores estavam exaustos. Depois, estão adoecidos" - Divulgação
Nos dois casos, Campos diz que o problema é o mesmo: o desrespeito ao professor. "Ele é o elo frágil nessa relação, e quando falamos de professores no Brasil falamos de um público maduro e 80% do sexo feminino, ou até mais, dependendo da etapa de ensino. Os desafios perpassam a desvalorização, com questões do feminino e dores do climatério até questões de formação inicial precarizada."
O conflito intergeracional e o etarismo também impactam a saúde mental dos professores, pontua Campos. "Nas escolas, especialmente a partir do 6º ano, há uma juventude questionadora, que testa limites e quer experimentar, e ao mesmo tempo é conectada, nasceu em um mundo com inteligência artificial", analisa, e completa:
"Existe uma separação geracional muito grande entre uma professora 50+ e um estudante de 12 anos. Isso não é novidade, sempre foi assim na educação, mas agora os costumes estão mudando mais rápido. Muitos alunos sentem que não podem falar com seus professores, o que gera um sentimento de solidão muito grande, que é a semente do etarismo na escola."
Aposentadoria antecipada
Os desafios para a saúde mental não são exclusivos da faixa etária 50+. Outro cenário que vem se delineando nas escolas é o de professores mais jovens que buscam a aposentadoria por invalidez causada por problemas de saúde, muitos deles de saúde emocional, conta a advogada Viviane Grosso. Ela diz que as condições de trabalho impactam muito as doenças psicossociais e estão trazendo um perfil de quem busca se afastar antes do tempo previsto.
"Dentro do sistema educacional estouram todos os problemas da sociedade, e isso recai nas questões psicossociais."
Viviane Grosso: "Dentro do sistema educacional estouram todos os problemas da sociedade, e isso recai nas questões psicossociais" - Divulgação
Com isso, ela explica que muitos professores jovens que se aposentam com baixos salários e não podem voltar ao mercado no futuro, correndo o risco de perder a aposentadoria. "Imagine o desafio de uma pessoa que se aposenta nessa idade com pouco mais de um salário mínimo e tem que viver com isso por longos anos."
Grosso diz que há também, de forma muitas vezes velada, barreiras na reinserção da pessoa após esse tipo de afastamento, pois dificilmente ela será reinserida na mesma rede de ensino que atuava, já que o próprio sistema olha para ela com desconfiança.
De acordo com um estudo da OPEE Educação lançado este mês, cenários como esse estão afetando a esperança dos docentes em relação ao futuro da educação. Em um estudo com 1.763 educadores de escolas públicas e privadas de todas as regiões do País, 45,21% disseram ter esperanças, ao passo que 10,27% se declararam pouco esperançosos ou pessimistas. O índice de otimistas é menor do que o registrado pela pesquisa em 2024 (58,59%).
Segundo a pesquisa, apesar da piora, o que ainda sustenta o cenário de esperança são principalmente os resultados positivos alcançados com os alunos (49,57%), o apoio da equipe gestora e dos colegas (39,93%), a fé ou espiritualidade pessoal (35,45%) e a formação continuada (35%).
O psicoterapeuta Leo Fraiman, da OPEE Educação, disse em nota que esse equilíbrio revela a dimensão emocional e profissional da docência. "É significativo que fé e formação continuada apareçam lado a lado, isso mostra que o professor precisa tanto de alimento para o coração quanto de desenvolvimento para a mente. O caminho é oferecer ambos: suporte emocional e oportunidades de crescimento profissional."
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