São Paulo, 01/10/2025 - Ele se define como uma pessoa persistente, que nunca desiste. E a história do técnico Sidnei Rodrigues confirma essa característica, à qual é possível acrescentar outras qualidades: coragem, ousadia, resiliência. Tanto que o destemor aliado à audácia e à força de vontade o levaram a se tornar estagiário aos 65 anos de idade. E, neste ponto, não há como não se lembrar do filme Senhor Estagiário, com Robert de Niro no papel principal.
O senhor estagiário brasileiro, porém, é real, mora em Porto Velho (RO) e faz estágio na empresa de eletricidade
Energisa, na área de proteção de redes.
Destacou-se na seleção ao resolver com rapidez um desafio técnico, aplicando a experiência acumulada em décadas de atuação na área elétrica.
“Trabalhamos com blindagem de bomba. Ou seja, a rede tem um certo número de consumidores, então, a gente faz parametrização de equipamentos para religamentos automáticos, para proteção das redes”, conta Rodrigues. “Parametrizar os equipamentos para que haja segurança tanto para o pessoal em campo como para o fornecimento de energia para os consumidores.”
A decisão ousada de mudar sua vida aos 65 anos com um estágio é, na verdade, consequência da busca para realizar um sonho: ter um diploma de curso superior. Em 2022, Rodrigues deu os primeiros passos para isso ao se tornar estudante de engenharia elétrica na Faculdade Metropolitana de Rondônia. Assim, no meio do caminho entre o sonho e sua realização, havia um estágio.
Desafios
Ele avalia que o estágio permite por em prática o que aprende em sala de aula e desenvolver habilidades necessárias para atuar como engenheiro. “Apesar da minha experiência como técnico, o posto de engenheiro apresenta outros e desafios. Como estagiário, posso aprender mais sobre isso e melhorar minha formação profissional.”
Rodrigues gostava de desmontar e consertar aparelhos. Aos 14 anos, conseguiu o primeiro emprego com carteira assinada, como aprendiz em uma empresa de montagem de equipamentos eletrônicos. Mas um atropelamento o afastou da escola por um tempo, adiando seus planos. Aos 20, formou-se como técnico em eletrônica, abrindo sua própria oficina anos depois.
Tanto na empresa como na faculdade, ele diz que não sofreu com atitudes de idadismo. Ao contrário, na faculdade contou com ajuda de colegas desde cedo. “Eu comecei um pouco assustado, porque a diferença de idade era muito grande. Porém, a recepção foi muito humanizada”, conta.
“Cheguei à sala de aula e fui abordado por dois colegas, que me ofereceram ajuda caso eu tivesse alguma dificuldade com cálculo”, conta. E isso ajudou, diz. Afinal, havia mais de 40 anos que ele estava longe de um banco escolar. E a dificuldade maior que sentiu era justamente com matemática, cálculos.
Ele conta que a sua experiência em manutenção de aparelhos eletrônicos contribuiu para que estabelecessem uma relação de troca de conhecimentos. Foi um começo acolhedor, relata. A amizade que se estabeleceu naquele dia perdura até hoje, com Rodrigues cursando o oitavo período.
Rearranjo de vida
Cursar faculdade e fazer estágio exigiu de Rodrigues um rearranjo em toda sua vida – nos aspectos profissional, familiar, de lazer e financeiro. “Esse processo inclui adaptação financeira, pessoal em termos de descanso, lazer, família, porque o tempo fica muito reduzido", conta.
“Após a faculdade, chego em casa para organizar as disciplinas que tivemos nas aula do dia. Só consigo ir para cama por volta de meia-noite ou mais. E, quando são 6 horas, estou de pé novamente para recomeçar o dia.”
O horário do estágio é das 8h às 12h. À tarde, ele aproveita para trabalhar na sua oficina. Ainda assim, diz que tomou a decisão de fazer uma transição de carreira.. "O tempo vai passando e a gente tem que se inovar. E eu não sou uma pessoa que gosta de ficar parada."
Com a bolsa de estudos de 57% que obteve e o dinheiro que recebe do estágio, ele conseguiu zerar o gasto com faculdade. Uma grande ajuda, mas que não o dispensa fazer e refazer cálculos, escolhas e renúncias para se adequar à realidade. No aspecto familiar, a decisão de buscar uma graduação em engenharia também motivou a mulher, Catia Maria, e a filha, Fernanda Caroline, a voltarem para os estudos.
“Na minha folga, eu divido com a esposa a mesa da sala para a gente estudar, trocar experiências e até para saber se ela tem alguma dúvida que eu possa ajudar. Se eu tenho uma dúvida, ela faz a mesma coisa”, conta. Rodrigues destaca que o estudo reforçou o relacionamento do casal.
Inspirador
Valdinei Ribeiro, coordenador do Centro de Operações Integrado da Energisa Rondônia e gestor de Rodrigues, diz que a presença do estagiário sênior é valiosa para a empresa. “Ele inspira os colegas ao mostrar que nunca é tarde para transformar planos em realidade e reforça nosso compromisso de tratar todos com respeito e igualdade, independentemente da idade. Desde o processo seletivo, valorizamos o que realmente importa: o potencial de cada profissional”, afirma.
Nesse percurso, a tenacidade de Rodrigues foi fundamental. Mas as dificuldades, claro, foram grandes.
“Eu me defino como uma pessoa persistente, mas posso confessar que houve momentos em que achava que eu fosse desistir, mas acho que tenho a coragem de sempre de continuar. Não gosto de fazer uma coisa e deixar pelo meio do caminho.”
Ele conta que, depois de formado, prentede atuar como engenheiro em um negócio próprio na área de energia solar. E não descarta atuar na vida corporativa. Para ele, tudo o que vive atualmente é resultado de sua atitude, de seguir em frente, de não desistir e não parar de perseguir. "Eu acredito que eu sou o tipo que não desiste nunca. E por mais difícil que ela [a situação] esteja, eu vou procurar um jeito de sempre vencer as dificuldades.”