São Paulo, 06/11/2025 - Um termo ganhou força na França: as NERs, sigla para “neither employed nor retired", mulheres entre 55 e 61 anos que não estão nem empregadas e nem aposentadas. A expressão refere-se a profissionais que não estão ativamente no mercado de trabalho e nem recebem benefícios previdenciários.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Estudos Econômicos da França, 59% das pessoas que estavam nessa situação eram mulheres. O fenômeno também levantou debates nas redes sociais do Brasil, mesmo sem ter reconhecimento ou dados específicos.
Os motivos dos relatos nas redes sociais variam: demissões precoces, esgotamento, ausência de contribuição previdenciária e, sobretudo, o etarismo, que limita a contratação de mulheres a partir dos 50 anos. Muitas mulheres dessa faixa etária que estão em busca de recolocação profissional expõem no LinkedIn e Instagram como essa situação transcorre: entrevistas curtas, falta de respostas e a sensação de serem consideradas “velhas demais” para trabalhar e “novas demais” para parar.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de informalidade entre 2016 e 2024 revela um cenário persistente de desigualdade de gênero. Em 2024, 37,1% das mulheres ocupadas estavam em situação informal, proporção que reforça a vulnerabilidade desse grupo no mercado.
“Participei, recentemente, de uma roda de conversa de mulheres e vi muitas extremamente competentes, com altos cargos nas empresas, sendo demitidas sem muitas justificativas. Muitas delas mães”, relata Vivian Rio Stella, da VRS Academy, empresa voltada a criar soluções de aprendizagem.
Luciane Braga, 56 anos, teve sua trajetória profissional marcada por uma transição forçada do mercado formal para o empreendedorismo. Formada em arquitetura, a última vez que trabalhou como CLT foi entre 2010 e 2012 e, posteriormente, como PJ em 2013 e 2014.
Depois desse período, sua carreira foi interrompida para que pudesse cuidar dos pais. Quando tentou retornar ao mercado, em 2016, foi surpreendida pelo preconceito etário. “Comecei a perceber que a minha idade fazia a fisionomia dos entrevistadores mudar”, conta.
A arquiteta lembra que, aos 47 anos, muitas vezes sequer era chamada para entrevistas formais.
“Ou não me chamavam para entrevista, só um bate-papo informal por telefone. Ou chamavam e faziam uma entrevista relâmpago, duas, três perguntas e pronto”, disse.
O cenário de exclusão a levou a buscar novos caminhos. A ideia de empreender foi inspirada por amigos que acompanhavam sua rotina. Durante o período em que cuidava dos pais no hospital, ela passava o tempo bordando e fazendo crochê em salas de espera. “Os amigos começaram a pedir coisas, e nessa brincadeira insistiam para eu aceitar encomendas”, relatou. Assim nasceu a Ateliê Girafas, de bichos e bonecas de pano criados por ela.
Sem alternativas, parte desse grupo se apoia em familiares ou tenta recomeçar na informalidade e no empreendedorismo, como fez Luciane. Outras se reinventam, abrindo pequenos negócios ou prestando serviços como autônomas.
Nelly Carla Vila, 57 anos, se identificou com o termo francês NER. Ela está há dois meses em busca de recolocação no mercado e já enfrentou golpes com e-mails falsos e propostas de emprego fraudulentas, que solicitam seus dados pessoais.
“Essa falta do olho no olho no processo de contratação tem afastado justamente os profissionais com experiência, maturidade e capacidade de relacionamento”, afirmou.
Ela observa que as empresas ainda priorizam candidatos mais jovens e que o recrutamento se tornou cada vez mais impessoal. “São testes, formulários, plataformas, algoritmos. E tudo isso, muitas vezes, não mede o que realmente importa, como caráter, responsabilidade, ética e vontade de trabalhar”, disse.
Stella ressalta que o impacto do etarismo é desigual entre gêneros. “É um fenômeno que vem atingindo mais as mulheres do que os homens. Não à toa, vemos menos mulheres em cargos de alta liderança e com carreiras mais longevas”, conta.
Para Stella, enfrentar o problema exige incentivos à progressão de carreira e mudanças na cultura corporativa. “É preciso que RHs e lideranças contratem sem olhar apenas para idade, formação ou bairro, critérios ainda muito estereotipados, mas que seguem acontecendo nas empresas”, afirma.