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Se há alguns anos o divórcio era quase impensado por pessoas com mais de 50 anos, pelo medo da solidão ou comodismo, apesar do desgaste da relação, hoje é parte significativa dos casos registrados no Brasil. De acordo com estatísticas do Registro Civil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de divórcios entre pessoas acima de 50 anos, fenômeno conhecido como divórcio cinza, já representa cerca de 30% do total.
Esta mudança de comportamento é atribuída ao aumento da expectativa de vida da população brasileira, evolução do papel das mulheres na sociedade, sua independência emocional e financeira, novos modelos de relacionamento, entre outros fatores. “Hoje, as mulheres nesta faixa etária avançaram profissionalmente, têm novas expectativas, sonhos que querem realizar, para viver de uma maneira mais intensa e trilhar novos caminhos”, afirma a psicanalista e vice-presidente da Sow Saúde Integral, Flávia Anjos.
O divórcio não é um processo fácil, ninguém casa pensando em se separar, e muitas vezes pode gerar muita dor e sofrimento, destaca a psicóloga. “As pessoas estão em busca de serem felizes, ninguém quer ficar em uma relação que não esteja mais funcionando”.
Foi o caso de Cássia Gargantini, empresária de 60 anos, que passou por dois divórcios, um aos 42 anos, após 22 anos de casamento, e o segundo, aos 57, com quem ficou por 15 anos. “No primeiro casamento descobri uma traição e coloquei ele para fora de casa. Aos 42 anos estava sem carreira, sem dinheiro e com dois filhos adolescentes para criar. Não olhei para trás, tive coragem para enfrentar porque sabia que merecia mais do que aquilo”, afirma, acrescentando que depois de um ano trabalhando intensamente, decidiu fazer o divórcio. Foi quando conheceu o seu segundo marido, o mesmo advogado. “Após finalizar o documento do divórcio, ele me convidou para sair e ficamos juntos por 15 anos maravilhosos”.
Cássia aproveitou a sua “dor” e lançou recentemente uma mentoria para mulheres 50+ que decidiram se divorciar e precisam de apoio para esta nova fase da vida. “A sensação de estar desamparada ocorre no início, mas ao dar o primeiro passo em direção a sua felicidade, isso passa, porque na verdade a solidão a dois é muito pior. Não perca dias ou horas remoendo o passado. O tempo de escassez acabou, é tempo de construir sua prosperidade, você consegue!”
Se o divórcio já é difícil emocionalmente, na hora que envolve dinheiro e bens fica mais complexo. Depois de tantos anos de vida em conjunto, muitos casais nem se lembram de como foi feito o pacto no casamento.
De acordo com a sócia e co-fundadora do PHR Advogados Patrícia Valle Razuk, na maioria dos casamentos são usados o regime de comunhão parcial ou universal de bens. Patrícia ressalta que uma grande dúvida neste momento é sobre um dos cônjuges ter trabalhado fora a vida toda, e o outro ter se dedicado a cuidar da casa, filhos e marido ou esposa.
Será que a pessoa que trabalhou fora e foi a provedora financeira tem mais direito na partilha de bens? A resposta é não. O que vale é o regime matrimonial escolhido. Vale lembrar que, no caso do regime parcial, os bens adquiridos durante o casamento são divididos igualmente entre os cônjuges. E os conquistados antes do casamento e os recebidos por herança ou doação são considerados bens particulares, portanto, não entram na divisão.
Na comunhão universal de bens, os cônjuges compartilham a maioria dos bens, incluindo heranças e doações, e são divididos igualmente entre os cônjuges após a separação. Já as doações e heranças com cláusulas de incomunicabilidade são exceção e ficam de fora da partilha.
Se o regime for o de separação total de bens, isso significa que cada cônjuge mantém a propriedade exclusiva dos bens adquiridos antes e durante o casamento e não há divisão de patrimônio.
Foto: Arquivo pessoal
Se não houver patrimônio suficiente, que dê condições para se manter após a separação, ou se o regime escolhido tiver sido o de separação total de bens, pode-se entrar com um pedido de pensão alimentícia para o ex-parceiro. “Havendo dependência econômica, principalmente, quando não há uma partilha que seja suficiente para manter a pessoa, é caso de pensão alimentícia. Eu preciso que o meu patrimônio oriundo deste divórcio seja suficiente para a minha manutenção; se não for, seja porque o montante é pequeno ou por se tratar do regime de separação de bens, é caso de pensão alimentícia”, explica.
Para o casal que estiver cogitando o divórcio, Patrícia recomenda que seja feito um planejamento financeiro antes. É primordial que casais que estejam considerando a separação revisem seus testamentos, seguros de vida e planos de aposentadoria. “Muitas vezes, o cônjuge estava inserido no planejamento financeiro do outro, e a separação pode exigir ajustes imediatos para evitar prejuízos a longo prazo”, alerta.
A advogada lembra que esses são os cenários de uma separação amigável, mas que também pode haver um divórcio litigioso, que é quando o casal não consegue chegar a um acordo sobre o fim do casamento e precisa recorrer à Justiça. Neste caso, além de mais difícil, também pode ser mais demorado.
“O mais importante é garantir que a separação ocorra de forma justa e equilibrada, preservando os direitos e a dignidade de ambos os envolvidos. Com planejamento e apoio, é possível encarar essa fase como um novo começo e não como um fim”, diz Razuk.
Outra dúvida recorrente é se os filhos têm direitos ao patrimônio no momento da separação. Não. “Os filhos só viram dono quando os pais falecem. Enquanto eles estão vivos, quem tem liberalidade sobre os bens são os pais”.
E por falar em filhos, a psicanalista Flávia defende que os pais sejam sinceros sobre a situação que estão vivendo.
“Muitas vezes, uma separação envolve mais que um casal, envolve filhos e netos, maiores ou menores de idade. Para que seja um processo o menos doloroso para todos, é importante ser honesto. Não importa a idade dos envolvidos, é preciso jogar de forma honesta com todos.”
Para tentar superar esta fase, a psicanalista lembra que é importante viver o luto da relação. “É como a perda de uma pessoa que você não vai mais ver. Todos precisam viver o seu luto, respeitar o seu tempo. É um momento de chorar, sofrer, se conhecer, olhar para dentro e entender o que você precisa e o que quer a partir de agora”.
O processo de separação é doloroso e o recomeço é paulatino. Para ajudar neste momento, a psicanalista dá algumas dicas para quem quer recomeçar:
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