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Como é viver com uma válvula no cérebro? Entenda o que é hidrocefalia

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Hidrocefalia de pressão normal costuma ser confundida com demência - Adobe Stock
Hidrocefalia de pressão normal costuma ser confundida com demência

Por Alexandre Barreto, especial para o Viva

redacao@viva.com.br
Publicado em 08/11/2025, às 16h00
São Paulo, 08/11/2025 - O termo hidrocefalia de pressão normal (HPN) ganhou destaque no Brasil nos últimos meses. As buscas pelo tema no Google Trends aumentaram cerca de 67% no nível de interesse entre junho e agosto de 2025, logo após o cantor e compositor Chico Buarque, 81 anos, passar por uma cirurgia cerebral chamada derivação ventrículo-peritoneal (DVP), indicada para tratar a condição.
Leia também: Chico Buarque tem alta após cirurgia de hidrocefalia; veja o que é a condição que afetou o cantor
A HPN é provocada pelo acúmulo de líquido cefalorraquidiano no cérebro, o que eleva a pressão intracraniana e pode causar perda de equilíbrio, lapsos de memória e dificuldade para caminhar, sintomas frequentemente confundidos com o envelhecimento natural.
Segundo o Ministério da Saúde, em 2024 o Sistema Único de Saúde (SUS) realizou 10.813 procedimentos relacionados à hidrocefalia de pressão normal, correspondentes ao implante de válvulas.

Saiba os principais sintomas

A hidrocefalia de pressão normal é caracterizada principalmente por três sintomas: dificuldade para andar, confusão mental e perda involuntária de urina. Esses sinais são considerados marcadores importantes para o diagnóstico da condição, de acordo com o médico neurologista Nelson Sant’Ana, diretor do Complexo Hospitalar Padre Bento, em Guarulhos (SP).
O neurologista explica que a hidrocefalia de pressão normal ainda é pouco diagnosticada em idosos, já que seus sintomas podem ser confundidos com doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer e outras formas de demência.
“Nós temos, em média, meio litro de líquor por pessoa. A cada oito horas, produzimos e reabsorvemos essa mesma quantidade. Ou seja, o líquor é constantemente filtrado e renovado. Quando há algum problema nesse processo de produção ou absorção, pode ocorrer a hidrocefalia”, afirma o neurologista.
Por isso, a confirmação do diagnóstico requer a avaliação de um especialista e a realização de exames complementares, como tomografia, ressonância magnética e coleta de líquor.

Entenda como é viver com uma válvula no cérebro

Embora esse tipo de hidrocefalia seja mais comum em idosos, João Batista, 60 anos, recebeu o diagnóstico aos 37. Ao longo dos últimos anos, ele passou por cinco cirurgias. “Os médicos decidiram colocar a válvula porque ele sentia tonturas, desmaiava com frequência e chegou a ficar em coma”,  conta a filha, Ana Gabriela Silva, de 22 anos.
A primeira cirurgia, feita em 2013, não teve sucesso devido a falhas na válvula. No ano seguinte, Batista precisou ser submetido a outros quatro procedimentos.
“Um dia ele começou a perder os movimentos e a consciência. Foi levado às pressas ao hospital, onde teve uma parada cardiorrespiratória e precisou passar por uma cirurgia de emergência. Dois dias depois, fizeram a válvula definitiva”, relembra a filha.
A recuperação após a última cirurgia foi lenta e desafiadora. João Batista precisou reaprender funções básicas com apoio da fisioterapia e, embora tenha recuperado parte dos movimentos e da fala, ainda enfrenta limitações.
Leia também: Como incentivar autonomia em pessoas com Alzheimer e outras doenças degenerativas
O médico Nelson Sant’Ana explica que a hidrocefalia pode se desenvolver em qualquer fase da vida. Embora não seja comum que a doença apareça aos 37 anos, ele destaca que essa possibilidade existe. O neurologista também explica que as falhas nas válvulas são atribuídas principalmente a entupimentos ou inadequação da pressão regulada, o que torna necessária a substituição do dispositivo. Por isso, pacientes podem passar por várias intervenções até que o funcionamento da derivação se estabilize.
Hoje, segundo a filha de João Batista, o maior desafio é lidar com as sequelas deixadas pela doença. “Nos últimos anos, temos enfrentado o processo de reabilitação e aprendido a conviver com uma pessoa diferente do que ele era”, diz.
Para a jovem, acompanhar o avanço da doença do pai transformou sua própria trajetória. “Nunca mais consegui associar a imagem de pai ao meu pai. O vejo como uma ‘criança adulta’. Infelizmente, as sequelas da doença foram irreparáveis”, relata.

Diagnóstico precoce

Beatriz Ribeiro, 24, conhece desde cedo a rotina de quem vive com uma válvula no cérebro. Diagnosticada ainda na infância, passou pelo procedimento de derivação ventrículo-peritoneal para tratar a hidrocefalia e, hoje, não apresenta mais a condição.
Mesmo assim, continua com a válvula implantada, responsável por drenar o excesso de líquido do cérebro para o peritônio. “A barriga fica  normal, eu não sinto nada sendo jogado nela, só sei que o líquido é direcionado para lá porque o médico explicou”, conta. A válvula, embora interna, é perceptível ao toque quando ela move o pescoço.
Após a cirurgia, Ribeiro não teve sequelas e viu os sintomas desaparecerem. As fortes dores de cabeça que a acompanhavam na infância ficaram no passado. Hoje, ela faz questão de reforçar a importância do diagnóstico precoce e do acompanhamento médico.
“Meu conselho é procurar um médico o mais rápido possível, pois é uma condição muito perigosa que pode acabar levando a óbito.”

Como é o tratamento

Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz), a hidrocefalia de pressão normal está entre as poucas causas de demência que podem ser controladas e até revertidas com o tratamento adequado. O principal deles é a derivação ventrículo-peritoneal.
Na prática, os médicos inserem um tubo fino (cateter) no ventrículo cerebral, região onde o líquido cefalorraquidiano se acumula. A válvula ajuda a drenar o excesso de fluido, aliviando a pressão no cérebro e reduzindo sintomas como perda de memória, dificuldade de equilíbrio e alterações cognitivas.
O cateter é colocado sob a pele e percorre a cabeça, o pescoço e o tórax até o abdômen. É nessa região que o líquido é absorvido naturalmente pelo organismo. O procedimento costuma permitir que pacientes retomem a rotina e, em muitos casos, recuperem funções cognitivas antes comprometidas.

Casos de hidrocefalia podem aumentar

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), daqui a 45 anos, os brasileiros com mais de 60 anos de idade deverão corresponder a cerca de 37,8% da população do País. Com o envelhecimento da população, é previsto um aumento na incidência de casos de hidrocefalia em idosos, aponta o neurologista Nelson Sant’Ana.
Por esse motivo, a preparação do sistema público de saúde é considerada essencial, especialmente quanto à capacidade de diagnóstico e a oferta de tratamento adequado por profissionais capacitados.
O SUS oferece diagnóstico e tratamento para a hidrocefalia, incluindo cirurgias de implante de derivação ventrículo-peritoneal. O procedimento está disponível na rede pública em hospitais habilitados em neurocirurgia.
O Ministério da Saúde destacou que, para que novas tecnologias – como válvulas programáveis ou autorreguláveis – sejam incorporadas ao sistema público, é necessária a análise e aprovação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), que avalia evidências científicas de segurança, eficácia, efetividade e custo-benefício antes de recomendar sua inclusão na Tabela de Procedimentos.

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