Foto: Luigi Calligaris/ UNESP
Por Felipe Cavalheiro*
redacao@viva.com.brSão Paulo, 03/10/2025 - O Brasil irá fornecer os novos componentes ao CMS, um dos detectores do Grande Colisor de Hádrons (LHC), o maior e mais potente acelerador de partículas do mundo. Chamado de OpenIPMC, o sistema será responsável por monitorar as placas ATCA (Arquitetura de Computação de Telecomunicações Avançada, em português), que dão suporte a toda a parte eletrônica do experimento, processando em tempo real os imensos fluxos de dados gerados nas colisões de partículas.
O anúncio foi feito pelo SPRACE (Centro de Pesquisa e Análise de São Paulo), sediado no Núcleo de Computação Científica da Universidade Estadual Paulista (Unesp), câmpus da capital paulista. O SPRACE contribui com o projeto ao realizar, em seus supercomputadores, parte da análise dos dados do experimento. “A especialização em instrumentação científica é fundamental para qualquer grupo de física de altas energias”, diz o físico Sérgio Novaes, que ocupa a função de pesquisador responsável do SPRACE.
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As funções do OpenIPMC incluem o monitoramento e a avaliação automatizada do desempenho e da condição das placas eletrônicas que participam da coleta de dados do detector. Ou seja, ele permite acompanhar, em tempo real, informações como temperatura, tensões e correntes — uma tarefa que, dado o grande número de componentes eletrônicos que integram a infraestrutura do CMS, não poderia ser realizada manualmente.
A coleta de dados é a parte central de qualquer experimento. No caso do LHC, foi graças aos registros das colisões entre partículas que, em 2012, foi possível confirmar a existência do bóson de Higgs, que ficou conhecida como "partícula de Deus".
Para garantir que tudo opere de maneira efetiva e ordenada, qualquer falha ou funcionamento impróprio é detectado pelo OpenIPMC, que, a partir da interação com as placas ATCA, decide ligar ou desligar os componentes para evitar maiores prejuízos. “Se a temperatura se tornar excessiva, o OpenIPMC pode desativar os componentes eletrônicos para evitar que sofram algum dano”, explica Luigi Calligaris, jovem pesquisador da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que liderou o desenvolvimento do projeto no SPRACE.
Sistemas de gerenciamento IPMC (sigla para Intelligent Platform Management Controller, ou Controlador Inteligente de Gerenciamento de Plataforma, em português) ocupam um lugar central na computação de ponta.
No entanto, cientistas e instituições de pesquisa vinham enfrentando dificuldades para trabalhar com ela, devido às exigências de acordos de confidencialidade e à necessidade de firmar contratos com o setor privado. “Quando começamos a trabalhar nesse projeto, foi preciso comprar uma licença. E tivemos de assinar acordos de confidencialidade a fim de ter acesso ao código, que é necessário para customizar nossas próprias placas”, diz Calligaris.
Um dos problemas levantados em ambientes de ensino e pesquisa pelos acordos de confidencialidade é que estes limitavam o acesso aos códigos apenas aos funcionários das instituições, reduzindo o número de profissionais autorizados a desenvolver as customizações.
Esse pré-requisito excluía do processo produtivo uma classe importante de colaboradores: os estudantes que participam do experimento. “Em atividades de pesquisa, os estudantes representam o futuro. É preciso treiná-los, ensiná-los a realizar, de maneira independente, os processos necessários para a operação dos experimentos”, diz Calligaris.
“Segundo os acordos de confidencialidade, os estudantes sequer poderiam ver os códigos com que estávamos trabalhando. Não era possível trabalhar dessa forma.”
Diante desse entrave, e com a necessidade do uso dessa tecnologia, Calligaris sugeriu a criação do primeiro sistema IPMC de código totalmente aberto. Isso permite que ele seja acessado e utilizado por qualquer pesquisador no mundo e, ao mesmo tempo, preserva a possibilidade de customização para atender às necessidades de diferentes grupos de pesquisa.
Embora o projeto tenha sido originalmente elaborado para atender a uma demanda do CMS, também é possível utilizar o OpenIPMC em outros experimentos. Entre as diferentes aplicações, Calligaris menciona projetos de pesquisa na área de neutrinos e computação quântica.
* Estagiário supervisionado por Cláudio Marques
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