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Novo Plano Nacional de Educação inclui, pela primeira vez, foco em idosos

Toninho Tavares/Agência Brasília

51% dos brasileiros entre 50 e 64 anos não sabem ler e escrever, mas acesso à EJA ainda é desafio nacional - Toninho Tavares/Agência Brasília
51% dos brasileiros entre 50 e 64 anos não sabem ler e escrever, mas acesso à EJA ainda é desafio nacional
Bianca Bibiano
Por Bianca Bibiano bianca.bibiano@viva.com.br

Publicado em 07/11/2025, às 08h00

São Paulo, 07/11/2025 - O novo Plano Nacional de Educação (PNE), que define as metas da educação básica até 2034, está em tramitação na Câmara dos Deputados e deve ter o relatório votado no próximo dia 11 por uma comissão especial.
Entre as inovações, o documento traz um destaque inédito: é a primeira vez que o PNE menciona explicitamente a educação de pessoas idosas, um grupo fortemente afetado pela falta de políticas educacionais. Segundo o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), 51% da população entre 50 e 64 anos de idade apresenta níveis de analfabetismo ou alfabetização rudimentar.
O texto aborda desde critérios para o financiamento da educação até metas específicas para todas as etapas de ensino - da educação infantil ao ensino superior, passando pela Educação de Jovens e Adultos (EJA) - e substitui o plano anterior, encerrado em 2024.
Leia também: Alfabetização na maturidade impulsiona autonomia e previne declínio cognitivo

Lacuna histórica e novos desafios

Para a pesquisadora e economista Ana Lima, coordenadora do Inaf, o reconhecimento dessa população é um passo importante para corrigir uma falha estrutural. 
Foi somente na década de 1990 que medidas de alfabetização em massa ganharam destaque no Brasil. Antes disso, pessoas em áreas rurais, periféricas e vulneráveis tinham pouco acesso. Muita gente nunca teve a oportunidade de estudar", explica.
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Ana Lima destaca que é preciso tornar a EJA atraente para o público 50+ - Divulgação/Inaf
O retorno à escola, no entanto, é um desafio. A modalidade EJA, que permite a conclusão dos estudos fora da idade regular, voltou os olhares no último PNE para jovens e adultos até 30 anos, com foco na inserção profissional, afirma Lima. Com isso,  a população idosa foi sendo afastada, com raras iniciativas voltadas a ela, em geral promovidas por organizações do terceiro setor.
Dados do Censo Escolar 2024 mostram que 493 mil pessoas com mais de 50 anos estavam matriculadas na EJA no ano passado. No total, o número de matrículas caiu 20,4% entre 2020 e 2024.
“O PNE traz pela primeira vez a palavra idoso, o que demonstra uma preocupação real com uma sociedade que está envelhecendo", observa a especialista, mas completa dizendo que "é preciso transformar essa intenção em metas concretas e tornar a EJA atraente a esse público".
Leia também: Mais de 493 mil pessoas com mais de 50 anos estudam na educação básica

Educação como acolhimento

A doutora em educação Francisca Elenir Alves, coordenadora geral do projeto ALFA-EJA Brasil do Instituto Paulo Freire, destaca que o desmonte das políticas dessa modalidade durante os governos anteriores, assim como a pandemia, contribuíram para o afastamento dos alunos, especialmente os mais velhos. Segundo ela, o atual governo vem retomando investimentos na área, equiparando o repasse de verbas entre estudantes da EJA e do ensino regular.
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Francisca Elenir Alves defende políticas educacionais para garantir dignidade para pessoas na maturidade - Divulgação/Instituto Paulo Freire
A especialista, que também é consultora da UNESCO e da ONU Mulheres, defende políticas intersetoriais que envolvam educação, saúde e assistência social.
Ela cita como exemplo um projeto do qual participou na Bahia que identificou que uma das maiores dificuldades em retornar aos estudos estava ligada a problemas de visão dos idosos, o que impedia o avanço da alfabetização.
"Foi somente após um mutirão de atendimento de saúde oftalmológica que conseguimos maior adesão aos estudos", relata.
Assim como Ana Lima, Alves observa que garantir o acesso não basta e defende que é essencial transformar a escola em um espaço acolhedor e de pertencimento para essas pessoas.
"Muitas pessoas chegam a uma fase da vida em que é difícil convencê-las a voltar a estudar. É preciso acolher e enxergá-las no ciclo de vida em que estão". 

Busca ativa e políticas de incentivo

Dentre as ações práticas para ajudar pessoas idosas a voltarem aos estudos, as especialistas defendem a busca ativa das redes de ensino, que podem partir de dados do CadÚnico até parcerias locais para identificar quem precisa.
"Não podemos depender apenas da demanda espontânea ou de um desejo manifesto de voltar a estudar. É direito das pessoas que o município ofereça a EJA, mas isso não é a realidade em muitos municípios. Em São Paulo, por exemplo, mais de um terço não têm essa oferta", pontua Alves.
Outro ponto de entrave apontado por Alves é o acesso financeiro. Muitos não conseguem estudar por falta de transporte ou por distância da escola, o que onera o orçamento familiar. "Por isso defendo que o programa Pé-de-Meia seja estendido a todos os alunos da EJA", propõe.
Atualmente, o programa Pé-de-Meia oferece subsídio financeiro apenas a estudantes de até 24 anos de idade. Ela propõe também a ampliação do direcionamento de verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) destinadas à modalidade.

Educação e envelhecimento digno

Para as pesquisadoras, o novo PNE precisa avançar e definir metas específicas para a alfabetização de idosos, considerando o crescente envelhecimento da população brasileira.
Não deveríamos achar normal que mais da metade deles não está alfabetizada em pleno 2025. Existe uma obrigação moral da sociedade para com aqueles que não tiveram oportunidade no passado", afirma Lima.
Alves completa destacando que isso traria benfícios para economia. "Investir nesse acesso à educação e às políticas publicas é fundamental se a gente quer realmente um País com dignidade para pessoas nesse ciclo da vida, para que elas possam garantir sua escolaridade, fazer suas leituras, continuar sonhando e acessar conhecimento tanto no mundo material quanto no digital".

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