São Paulo, 27/11/2025 - Nesta época do ano, há uma grande movimentação nas escolas, especialmente da educação básica, para renovação de matrícula e atualização de valores de mensalidade escolar, o que pode deixar algumas famílias em dúvida sobre quais cobranças e aumentos são permitidos.
Segundo levantamento da consultoria educacional Rabbit, a
projeção de aumento para 2026 nas mensalidades da rede privada é, em média, de 9,8%. Ou seja, o índice está acima da
inflação, que atualmente gira em torno de 4,5% no acumulado de 12 meses (conforme o IPCA-15, divulgado nesta quarta-feira).
Entenda a seguir como evitar práticas abusivas.
Escola privada pode aumentar a mensalidade todo ano?
Nas escolas particulares, os contratos são renovados anualmente e costumam incluir taxa de matrícula e cobranças por livros didáticos e apostilas. Embora o aumento seja permitido por lei, o advogado Stefano Ribeiro Ferri, especialista em direito do consumidor, alerta que o aumento deve sempre refletir custos comprovados da escola, sob pena de ser considerado abusivo.
O reajuste só pode ocorrer uma vez por ano, normalmente no período de renovação da matrícula. Qualquer aumento durante o ano letivo é ilegal, porque o valor pactuado em contrato deve valer até o fim do período letivo".
Segundo ele, a Lei nº 9.870/99 estabelece que o reajuste deve se basear em variação de custos, como salários de professores, encargos trabalhistas, manutenção e inflação. "A escola precisa comprovar documentalmente os motivos do aumento. Sem essa comprovação, o reajuste é abusivo", afirma.
Qual é o limite do aumento?
O especialista destaca que, se a inflação do período for menor que o índice aplicado pela escola, os pais têm direito de questionar.
Não existe um teto legal, mas há o princípio da razoabilidade. Um aumento de quase 10% num cenário de inflação de 4% ou 5% pode e deve ser contestado, especialmente se não houver justificativa concreta."
Outro ponto importante é a obrigação de transparência. As escolas devem divulgar o valor das mensalidades e o número de vagas com pelo menos 45 dias de antecedência do período de rematrícula. "Se o prazo for desrespeitado, os pais podem denunciar ao Procon e recusar o reajuste, já que não tiveram tempo hábil para decidir".
Quais taxas podem entrar na cobrança?
Segundo a advogada Carolina Vesentini, do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), além da taxa de rematrícula, outras cobranças são autorizadas, porém, precisam estar especificadas no contrato. Entenda:
Cobranças autorizadas:
- Taxa de matrícula ou rematrícula: Cobrança única para garantir a vaga no ano letivo.
- Material didático específico: Itens como apostilas próprias da escola ou livros de uma editora específica, desde que não seja possível adquiri-los em outros estabelecimentos. Esta é uma exceção à regra de liberdade de escolha.
- Uniforme escolar: Se a escola for a única fornecedora do modelo padronizado, pode cobrar por ele.
Cobranças que podem configurar práticas abusiva
- Material de uso coletivo: A lei nº 12.886/2013 é clara ao proibir a cobrança de itens como papel higiênico, material de limpeza, copos descartáveis, material de escritório (como tinta para impressora) e combustível para o transporte escolar. Esses custos já devem estar inclusos na mensalidade.
- Exigir material com marca ou local de compra específicos: Exceto nos casos de apostilas e uniformes já citados, exigir uma marca ou loja específica configura venda casada, prática abusiva vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.
- Taxa de material escolar obrigatória: A escola pode oferecer uma taxa de material como opção de praticidade para quem não quer ir às compras, mas não pode torná-la obrigatória. Os pais sempre têm o direito de comprar os itens da lista individualmente.
A representante do Idec explica ainda que a legislação não obriga a escola a 'diluir' o custo de materiais didáticos ao longo do ano. "É comum que essas despesas sejam cobradas no ato da matrícula ou no início do ano letivo. No entanto, do ponto de vista da boa relação de consumo e da sensibilidade ao orçamento familiar, instituições que optam por parcelar esses valores demonstram uma postura mais consciente", explica.
Nesse sentido, ela diz que a cobrança integral no início do ano é legal, mas pode representar um peso financeiro significativo, sendo um fator a ser considerado pelos pais na escolha da instituição.
Quem está inadimplente pode renovar a matrícula?
A renovação do contrato de um ano para outro pode ser negada em caso de inadimplência, mas isso deve ser feito sem qualquer tipo de constrangimento ou punição para o estudante. "O aluno não pode sofrer sanções pedagógicas por inadimplência e a escola não pode impedi-lo de assistir às aulas, fazer provas ou acessar boletins. A única consequência possível é a não renovação da matrícula para o próximo período, e mesmo assim sem qualquer tipo de constrangimento", observa Ferri.
Ele complementa observando que o contrato escolar é, antes de tudo, uma relação de consumo. "Transparência, previsibilidade e equilíbrio entre as partes são princípios que devem ser respeitados", por isso recomenda também uma leitura atenta do contrato de prestação de serviço.
Como resolver cobranças abusivas na rematrícula?
Carolina Vesentini destaca que o primeiro passo em caso de problemas é sempre começar com uma conversa junto à administração da escola.
O primeiro passo é sempre tentar resolver diretamente com a instituição de ensino, apresentando suas dúvidas e questionamentos com base na lei. Solicite a fundamentação legal ou contratual para a cobrança".
Quando o
reajuste é
abusivo ou sem justificativa legal, a escola pode sofrer sanções administrativas, como multas aplicadas pelo Procon, além de ser obrigada a
rever os valores cobrados e devolver o que foi pago a mais. Do ponto de vista judicial, também pode haver ação de revisão contratual e condenação por danos materiais. Tudo isso com base no Código de Defesa do Consumidor.
"Em caso de problemas, o caminho mais rápido, em geral, é o Procon, que tenta uma solução administrativa. Se não houver acordo ou se o caso for mais complexo, aí sim é recomendável procurar um advogado, para analisar o contrato e, se necessário, ingressar com ação judicial. O Procon também é o responsável pela atuação no aspecto administrativo, podendo impor multas", explica Ferri.
Ambos os advogados recomendam atenção redobrada aos contratos. "O documento deve indicar o índice e a data do reajuste, prever devolução proporcional em caso de desistência e evitar cláusulas genéricas que permitam aumentos 'a critério da escola'. Tudo precisa estar escrito de forma clara, em linguagem acessível e sem colocar o consumidor em desvantagem", completa Ferri.
Pontos de atenção para as escolas particulares
Se para as famílias a busca por descontos na mensalidade e taxas é importante para o bolso, para as escolas particulares pode representar um ponto de atenção aos gestores. Segundo artigo de Christian Rocha Coelho, CEO do Grupo Rabbit, "a palavra desconto precisa ser banida" das escolas.
"Quando a instituição concede promoções relacionadas a descontos na rematrícula, estimula os pais a pedirem reduções ainda maiores. Embora gere resultados pontuais, a prática reforça a cultura do desconto".
O ideal, pondera, seria direcionar a atenção das famílias para "o valor e a relevância dos serviços, não para cortes de preço". Caso contrário, aponta que o momento de rematrícula pode ser marcado por uma "guerra dos preços", que tira o foco da educação propriamente dita.
Outro ponto de atenção pontuado pela Rabbit é a inadimplência, que segue como tendência para 2026 devido ao endividamento das famílias. O desgaste da satisfação e do engajamento das famílias em relação à escola também é apontado como outro agravante, e tende a crescer com os reajustes de mensalidade.
Escola pública pode cobrar taxas e mensalidades?
Nas escolas públicas, que são custeadas por impostos, não existem taxas de matrícula, mensalidade, contribuição obrigatória nem qualquer valor como condição para o aluno estudar. A educação básica gratuita é um direito garantido pela Constituição Federal e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Ou seja, qualquer cobrança obrigatória em dinheiro é ilegal.
Segundo Stefano Ferri, o que pode existir, em caráter excepcional, são doações voluntárias, feitas espontaneamente, normalmente por meio de associações de pais, o que, na prática, não configura um problema.
Mas se a escola exigir valores, fizer pressão por contribuição ou impedir matrícula por falta de pagamento, isso é ilegal e pode gerar responsabilização do gestor. Nesses casos, o ideal é denunciar ao Ministério Público ou à Secretaria de Educação do Estado ou do Município", conclui o advogado.