Foto: Envato Elements
Por Beatriz Duranzi
[email protected]Bonecas que respiram, choram e encantam, ou quase isso. Os bebês reborn são réplicas hiper-realistas de recém-nascidos, produzidas artesanalmente para se parecerem o máximo possível com um bebê de verdade. Pele com textura, veias aparentes, peso semelhante ao de um recém-nascido, cabelos implantados fio a fio, até cheirinho de talco. Tudo é pensado para provocar uma conexão emocional imediata.
Mas o que para muitos pode parecer apenas um brinquedo sofisticado ou uma obra de arte colecionável, na prática, se revela um universo complexo, que envolve afeto, saúde emocional, propósito terapêutico, e um impacto financeiro significativo.
De acordo com João Victorino, administrador de empresas, professor de MBA do Ibmec e educador financeiro, os bebês reborn têm conquistado espaço justamente porque tocam em dimensões humanas muito profundas: o desejo de cuidar, o acolhimento da dor e a tentativa simbólica de preencher ausências emocionais. Ao mesmo tempo, podem se transformar em um hobby de alto custo.
De acordo com a psicóloga Luciana Chiarioni, o vínculo com essas bonecas vai muito além da aparência. Elas podem ajudar a preencher o vazio emocional de pessoas que vivem sozinhas, enfrentam o luto ou a solidão, ou mesmo que lidam com doenças como o Alzheimer.
Em instituições de longa permanência, por exemplo, elas têm sido usadas para acalmar idosos, criar rotinas e estimular vínculos afetivos. Casos de ansiedade, depressão e até luto perinatal também têm na reborn uma ferramenta simbólica de conforto.
Além do aspecto terapêutico, o colecionismo também é forte. Muitos enxergam nas reborns uma forma de arte. Exibem as bonecas em redes sociais, montam cenários fotográficos, criam vídeos simulando a rotina com um bebê, o que alimenta uma comunidade crescente, especialmente no TikTok e no Instagram.
Apesar de parecer um nicho, o mercado de bonecas reborn movimentou aproximadamente US$ 200 milhões em 2024, segundo a consultoria Market Report Analytics. O setor tem crescido a um ritmo de 8% ao ano, embora ainda represente uma fração pequena dos US$ 24 bilhões movimentados pelo mercado global de bonecas.
Boa parte desse consumo vem de mulheres adultas, com idades entre 30 e 60 anos, que criam laços afetivos com as bonecas. Outras fatias incluem:
Curiosamente, o Brasil lidera as buscas no Google pelo termo “bebê reborn”. Por aqui, o mercado ainda é relativamente pequeno, mas crescente. Estima-se que cerca de 4 mil unidades sejam vendidas por mês, com preços que variam bastante:
O setor tem se expandido, inclusive, como alternativa de renda para mulheres em regiões periféricas. Segundo o Sebrae, os cursos voltados à produção de bonecas hiper-realistas cresceram 45% entre 2022 e 2024, com destaque para estados como Goiás, Minas Gerais e Paraná. Hoje, estima-se que o mercado reborn brasileiro já movimente mais de R$ 20 milhões por ano, considerando vendas, insumos, capacitações e monetização em redes sociais.
O envolvimento com uma reborn pode começar de forma inocente, como hobby ou terapia, e se tornar um investimento contínuo. Além da boneca, muitos consumidores compram:
A longo prazo, os gastos podem se acumular, especialmente quando motivados por impulsos emocionais. Em momentos de vulnerabilidade, a compra de novos acessórios ou bonecas pode se tornar uma forma de compensação afetiva, alerta João Victorino.
Com a popularização das reborns, também surgem críticas e julgamentos. Vídeos de adultos simulando partos ou cuidando das bonecas como se fossem reais viralizam, muitas vezes com tom de deboche. Porém, especialistas lembram que os casos extremos são minoria e ganham visibilidade desproporcional nas redes.
A psicóloga Luciana Chiarioni ressalta que, em contextos bem acompanhados, as reborns podem ser instrumentos simbólicos válidos no enfrentamento de traumas e perdas. O problema surge quando a relação com a boneca ultrapassa o simbólico e compromete a vida cotidiana da pessoa:
Nesses casos, é fundamental buscar ajuda psicológica. O apego à reborn pode ser o começo de um processo de cura, mas nunca deve ser o único caminho.
O universo dos bebês reborn não é apenas curioso. Ele revela muito sobre os afetos humanos, os vazios que tentamos preencher e as formas que encontramos para lidar com a perda, o desejo e a solidão.
Por trás de cada bebê reborn, há uma história real, de luto, de amor, de arte ou de busca por conexão. Entender isso é essencial para evitar o julgamento superficial e abrir espaço para discussões mais empáticas sobre saúde emocional, consumo consciente e afeto.
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