São Paulo, 11/10/2025 - O
novo modelo de crédito imobiliário apresentado nesta sexta-feira pela cúpula do governo Lula veio como uma solução estrutural para resolver o problema da falta de recursos e do juro alto nos financiamentos da casa própria. Esse é um problema que atinge principalmente a classe média brasileira, que anda aborrecida pela perda no poder de compra nos últimos anos.
O novo modelo de crédito imobiliário será implantado gradualmente, ao longo de dez anos. Ele mudará as regras sobre o que os bancos podem fazer com os recursos depositados na caderneta de poupança.
Outra novidade anunciada na sexta-feira foi a elevação do valor máximo do imóvel financiado, que passou de R$ 1,5 milhão para R$ 2,25 milhões.
Recursos da poupança
Hoje, 65% dos recursos das cadernetas precisam ser direcionados para o crédito imobiliário, enquanto 20% ficam parados para dar segurança e liquidez ao sistema - os chamados depósitos compulsórios - e 15% são de uso livre pelos bancos.
No novo modelo, o montante disponível para o crédito subirá para 80%, com redução do porcentual compulsório para até zero.
O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, afirmou que a limitação da fonte de recursos (funding) para os financiamentos vinha restringindo a expansão do mercado imobiliário, o que exigia uma mudança estrutural para garantir o crescimento sustentável do setor.
"Eu não quero uma solução paliativa, eu não quero uma solução que a vida das pessoas vai melhorar em um momento para, em seguida, darmos passos para trás. Eu quero uma solução estrutural", declarou, atribuindo essa diretriz ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com quem compartilhou o palco.
Foco na classe média
A medida vai atender principalmente as famílias de classe média, com renda acima de R$ 12 mil por mês, que vinham enfrentando dificuldades para financiar a casa própria devido aos juros altos. Para essa fatia da população, a taxa média está em torno dos 13% ao ano, segundo dados do BC.
Para as pessoas abaixo dessa faixa de renda, há crédito subsidiado dentro do
Minha Casa Minha Vida, com juros que vão de 4% a 10% ao ano, aproximadamente. Fora do MCMV, o impacto do juro vem causando uma retração nos financiamentos. De janeiro a agosto, o volume financiado somou R$ 97,1 bilhões, 18% menos do que no mesmo período do ano passado.
Para contar com a flexibilização nas regras de uso do dinheiro da poupança, os bancos devem se comprometer a destinar 80% dos recursos no Sistema de Financiamento Habitacional (SFH), com taxa de juros máxima de 12% ao ano, enquanto os 20% restantes poderão ir para o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), sem limite para as taxas.
A partir de agora, a cada real que o banco destinar ao crédito imobiliário, ele será autorizado a tomar o mesmo valor da caderneta para aplicar de forma livre.
A lógica é estimular os bancos a ampliar o financiamento habitacional para terem o direito de pegar recursos da caderneta e abastecer outras linhas em que lucram mais (cheque especial, consignado, financiamento veicular etc.), em vez de deixar o dinheiro parado na forma de compulsórios.
Nesse novo modelo, o banco vai conceder o financiamento à população com base em recursos obtidos no mercado. A forma mais comum é via emissões de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs). Portanto, a caderneta deixará de ser a fonte original do crédito concedido, mas uma referência.
O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, afirmou que essa medida representa "uma mudança estrutural na forma de utilização da poupança no Brasil", uma vez que o novo sistema passará a ser baseado em funding de mercado.
Mello explicou que o funding da poupança tem se reduzido ao longo do tempo, tanto por razões conjunturais, como o ciclo de juros mais altos, quanto por fatores estruturais, como o avanço da educação financeira e a facilidade de aplicações em produtos de investimento digital.
"Havia um cenário de escasseamento do funding da poupança, o que exigia repensar a forma de utilizá-lo para gerar mais crédito imobiliário, especialmente para a classe média", disse.
A regra do compulsório
O novo modelo passará a valer em janeiro de 2027. Até lá, haverá uma fase de transição, que começa agora. Nesta fase, os compulsórios cairão de 20% para 15% desde que os bancos usem os recursos para atender o crédito imobiliário. A partir de 2027, esse montante será reduzido no ritmo de 1,5 ponto porcentual por ano, até chegar a zero.
A exigência do depósito compulsório, em si, não deixará de existir. O porcentual só irá a zero sob a condição de os banco usar o dinheiro para financiar a habitação. Caso contrário, o dinheiro continuará retido.
“Ao fim de dez anos, todo o saldo de recolhimento compulsório poderá ser deduzido pelas instituições financeiras, ou seja, não recolhido ao Banco Central, desde que o correspondente volume de operações de crédito imobiliário foi originado”, explicou o chefe adjunto do departamento de regulação do Banco Central, Felipe Derzi.
Presentes na cerimônia de lançamento, empresários do setor da construção elogiaram a iniciativa. O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Renato Correia, afirmou que o novo modelo será importante para a classe média brasileira, que vinha enfrentando dificuldades de adquirir a casa própria por causa dos juros altos. "A partir de hoje, o governo vai aproximar o consumidor do sonho da casa própria", disse.
Já o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz França, acrescentou que o novo modelo representa um "passo importante" para a expansão desse mercado. "O Brasil tem uma relação entre crédito imobiliário sobre o Produto Interno Bruto de 10%. Em países desenvolvidos, é de 50%. Ou seja, temos muito a crescer ainda no Brasil."