Mudanças climáticas aumentam alertas sobre riscos de AVC em população 50+

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De acordo com estudo do periódico internacional The Lancet, há uma correlação direta entre mudanças climáticas e mortes por AVC. - Envato
De acordo com estudo do periódico internacional The Lancet, há uma correlação direta entre mudanças climáticas e mortes por AVC.
Por Bianca Bibiano

Publicado em 26/05/2025, às 10h27

São Paulo, 26/05/2025 - Embora a chegada de uma frente fria nos próximos dias aponte para a queda dos termômetros, o outono e o inverno de 2025 tendem a ser permeados pelos chamados veranicos, elevações bruscas na temperatura que causam calor desproporcional para a média dessas estações - e acendem os alertas para riscos de Acidente Vascular Cerebral (AVC).

De acordo com estudo do periódico internacional The Lancet Neurology, há uma correlação direta entre mudanças extremas de temperatura e mortes por AVC. As ondas de calor, por exemplo, têm potencial de aumentar em 72% o risco de morte por essa causa. Nas últimas três décadas, a carga global de derrames relacionados ao calor atingiu 11,9 milhões de casos.

Esse risco é particularmente mais elevado para pessoas acima de 50 anos de idade, segundo o médico patologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Saldiva.

“A hipertermia, que é o aumento anormal da temperatura do corpo em dias de calor, é agravada não apenas pela geografia e morfologia das cidades, que geram essas ilhas de calor, mas também pela vulnerabilidade que as pessoas adquirem naturalmente ao envelhecer”.

Como Saldiva explica, o corpo humano possui uma espécie de “termostato” interno, que controla a temperatura a níveis aceitáveis e indica eventuais desvios, enviando sinais através da pele para diferentes regiões do cérebro.

“Nas pessoas maduras, especialmente idosos, esse termostato é quebrado. Elas não percebem a alteração de temperatura como antes”.

Somado a isso, há ainda uma redução natural da sede. “Ao envelhecer, sentimos menos sede. É um mecanismo do nosso corpo que impacta diretamente nos órgãos e na percepção do calor, colocando pessoas maduras em maior vulnerabilidade”, destaca.

Diferenças entre AVC e ataque cardíaco

  • AVC: Ocorre no cérebro, podendo ser isquêmico (obstrução de vasos) ou hemorrágico (rompimento de vasos). Os sintomas incluem dificuldade para falar, fraqueza em um lado do corpo e desvio facial.
  • Ataque cardíaco: Ocorre no coração, geralmente devido à obstrução de uma artéria coronária. Os sintomas incluem dor no peito, falta de ar e sudorese (suor excessivo).

Desigualdade social e impacto das ondas de calor na saúde

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“Ao envelhecer, sentimos menos sede, o que agrava os males do calor extremo à saúde”, observa o médico Paulo Saldiva.

Ainda segundo o médico Paulo Saldiva, o risco de AVC causado afeta especialmente pessoas das camadas mais pobres da sociedade. A organização urbana e a falta de infraestrutura adequada tornam essas populações mais vulneráveis, especialmente em picos de calor extremo.

Populações que vivem em áreas com pouca cobertura vegetal, como periferias e comunidades carentes, estão mais expostas ao calor extremo. A falta de ar-condicionado, ventilação adequada e acesso à água potável agrava a situação, tornando essas pessoas mais suscetíveis a problemas de saúde, como o AVC.”

O médico pondera que a poluição também desempenha um papel importante nesse cenário e pode intensificar a inflamação nos vasos sanguíneos e contribuir para a formação das chamadas placas ateroscleróticas, aumentando o risco de AVC hemorrágico.

Para trabalhadores que atuam ao ar livre, como entregadores, motoristas de aplicativo e vendedores ambulantes, a exposição à poluição eleva ainda mais o risco de complicações cardiovasculares. “Ele afeta desproporcionalmente as populações mais pobres, que muitas vezes vivem em áreas com maior concentração de poluentes e menor acesso a cuidados médicos”, completa.

Falta de conscientização sobre AVC

No Brasil, o AVC levou a óbito 109.560 pessoas, segundo dados do portal da transparência da Associação de Registradores de Pessoas Naturais (Arpen Brasil) em 2023. Segundo a médica neurologista Ana Cláudia de Souza, o quadro está ligado ao crescimento de maus hábitos que contribuem para doenças cárdio e cerebrovasculares, como tabagismo, incluindo uso de vapes entre jovens, consumo de alimentos ultraprocessados e pouca atividade física.

“É urgente a necessidade de investimentos em conscientização e esforços de prevenção ao AVC. Muito poderia ser evitado com campanhas e orientação de saúde pública, o que diminuiria o custo dos acidentes cardiovasculares”, afirma a doutora do Hospital Moinhos de Vento, que coordenou e conduziu uma pesquisa em oito países da América Latina sobre os custos de tratamento de AVC isquêmico agudo. Em média, o custo por paciente no tratamento na região é de US$ 12,2 mil, mas no Brasil é mais caro: US$ 27,4 mil por paciente.

A médica cita que a preocupação global é crescente, e que há expectativa de um aumento de 50% no número de mortes até 2035, com proporcional aumento de custos relacionados à doença de US$ 891 bilhões anualmente para US$ 2,31 trilhões.

Como minimizar os riscos de um AVC com as mudanças climáticas

Quadros de hipertensão, diabetes, obesidade, tabagismo e sedentarismo são fatores que contribuem significativamente para o aumento dos casos de AVC causados por alterações drásticas no clima, especialmente veranicos e  ondas de calor. O alerta é do médico cardiologista do Grupo Med+, Marcelo Pedro dos Santos. Para minimizar os riscos, além de hábitos saudáveis e controle de doenças crônicas, ele também recomenda precauções extras. Confira:

  • Hidrate-se constantemente: Tome pelo menos 35 ml de água por kg de peso corporal. Por exemplo, um adulto de 73 kg deve ingerir cerca de 2,5 litros de água. Em dias mais quentes, essa quantidade pode aumentar.
  • Monitore a pressão arterial: Especialmente pessoas com histórico de hipertensão precisam checar a pressão com frequência.
  • Evite álcool, cafeína e bebidas adocicadas: Essas substâncias podem levar à falsa sensação de hidratação, quando podem causar o efeito contrário, de desidratar o corpo; além disso,  aumentam o risco de arritmia cardíaca.

Como identificar um AVC

Ao presenciar um possível caso de AVC, é possível atentar para alguns sintomas. Estes, são  identificados pela sigla SAMU, explica o cardiologista Marcelo Pedro dos Santos:
  • S (Sorriso): Peça para a pessoa sorrir. Se um lado do rosto ficar desviado, pode ser um sinal de AVC.
  • A (Abraço): Peça para a pessoa tentar te abraçar. Se um dos braços não tiver força, é um alerta.
  • M (Música): Peça para a pessoa falar o verso de uma música ou uma frase simples. Se a fala estiverarrastada ou incompreensível, está aí mais um sinal.
  • U (Urgência): Se qualquer um desses sinais estiver presente, ligue para o SAMU ou leve a pessoa imediatamente ao hospital.

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