Alta executiva conta como se planejou para a aposentadoria dez anos antes

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Cristina Palmaka, 57 anos, passou os últimos dez anos planejando o momento de se aposentar - Divulgação
Cristina Palmaka, 57 anos, passou os últimos dez anos planejando o momento de se aposentar
Por Luana Pavani luana.pavani@viva.com.br

Publicado em 23/09/2025, às 08h13

São Paulo, 23/09/2025 - Imagine uma pessoa acelerada. Aos 24 anos, Cristina Palmaka já tinha cargo de liderança em multinacional. Conforme avançava na carreira, ela também se aprimorava na corrida. Foram inúmeras provas de rua e maratonas. Como começou a trabalhar aos 16 anos, já estava aposentada por tempo de trabalho, conforme a regra antiga da Previdência Social, dez anos antes de efetivamente decidir se aposentar da carreira. Palmaka passou por Philips, Compaq, Microsoft e deixou o último crachá como presidente na América Latina da SAP, no início deste ano. 
Uma das primeiras mulheres no Brasil a liderar grandes empresas de tecnologia, área notadamente masculina, Cristina Palmaka defende a diversidade corporativa mais na questão geracional do que de gênero. "A vida corporativa é muito bacana, intensa, mas a gente precisa deixar espaço para os mais novos", afirma. 
Aos 57 anos recém completados, Cris, como se apresenta, não parou: nem de trabalhar nem de correr. A mudança foi passar do papel de protagonista para o de conselheira, reduzindo o ritmo e a vontade de agir. Ela conta ao Viva como se planejou para a nova fase de vida, dez anos antes de entregar o crachá. Os próximos dez anos? Ela sabe que vai continuar correndo, desta vez aliando provas a viagens com o marido, e estudando, tão logo termine o mestrado que está escrevendo. Acompanhe a seguir os principais trechos da entrevista.

Viva: Em que momento da sua carreira de alta executiva você decidiu que iria se aposentar? 

Cristina Palmaka: Eu tinha essa visão, da nossa geração, de que se aposentar era esse sistema de ficar de pijama, de pantufa em casa, mas não era para mim. Eu tinha a visão de que em algum momento essa data ia chegar, mas não necessariamente precisaria ser sinônimo de parar de trabalhar. Eu, que comecei a trabalhar muito cedo, com 16 anos, sempre tive muita energia e disposição. Ao mesmo tempo, vi que o mundo corporativo para mim tinha uma espécie de prazo de validade. 

A área de tecnologia tem muita novidade e também gente nova. Como é lidar com o fator multigeracional?

As combinações entre gerações são muito positivas, na área de tecnologia acontece isso de combinar senioridade com os mais novos. Apesar de se falar muito em diversidade pela questão do gênero, para mim sempre o tema de diversidade foi multigeracional, de mesclar competências, conhecimentos entre pessoas de diferentes idades. É provocativo falar com alguém muito mais novo, escutar uma pessoa que tem aquela primeira mirada para poder trazer alguma contribuição. É até ter uma dose de humildade; ver que, opa, eu conheço bastante coisa, mas nem tudo.

As próprias organizações viraram essa chave; 40 anos atrás, ninguém falava de empresas humanizadas, diversidade. Se você falasse disso, ainda mais sendo mulher, era quase um abismo. As organizações começaram a notar que é preciso ter esse balanço, cuidar da saúde mental também, um tema que eu venho estudando. A pessoa que vem trabalhar é a mesma que está com problemas em casa, Não dá para imaginar que é todo mundo robozinho. 

Qual conselho você dá aos mais jovens?

Então, se eu tenho uma dica para a nova geração é: faça o que você faz o melhor possível, seja muito bom, para assim estar pronto para o próximo passo. Dali para frente virão as oportunidades. É o que eu também digo para minha filha, que está com 19 anos, na faculdade. E cuide das relações, do networking profissional, pois é importante manter boas conexões.
Nas organizações, em algum momento você tem que dar espaço para novas pessoas e ideias entrarem. Eu adoro o mundo corporativo, ele é intenso, tem muita coisa bacana. Nos meus últimos cinco anos na SAP eu cobri a América Latina, viajei para caramba, meu passaporte estourou as páginas porque eu estava sempre na estrada, em eventos, falando com clientes. Mas também é desgastante, pela dedicação,  entrega, ainda mais no setor que eu escolhi, de tecnologia, que é muito dinâmico. Então, chega uma hora que, até fisicamente, a gente começa a sentir. Para a nossa alegria, começa a florescer após os 50 o conceito de inteligência cristalizada, aquele seu arsenal de conhecimento que te dá essa preparação de ver as coisas de uma outra forma, parar para respirar. Eu sou a mesma  pessoa, mas a minha forma de olhar mudou, o meu tempo agora é um pouco diferente.

E você corre maratonas, é uma pessoa acelerada...

Isso, a dinâmica da tecnologia, da inovação, era tudo muito acelerado. Eu acho que já desacelerei, só que eu gosto de trabalhar. Mas, claro, tive o privilégio de conseguir fazer isso de uma forma tranquila, por ter trabalhado em grandes empresas. Ao pensar em me aposentar do mundo corporativo, nos últimos dez anos planejei essa saída.
Primeiro, eu sabia o que eu não queria fazer. Por exemplo, eu não tenho veia empreendedora. Então, eu já tirei do caminho.
Mas eu queria continuar intelectualmente ativa. Então, comecei a ver o tema de conselhos, passei a estudar para entender como é esse esquema de colegiado, de não ser mais a protagonista. Fiz o curso do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) e hoje atuo em quatro conselhos: Eurofarma, C&A, Arcos Dorados e mais, recentemente, da Vivo.

Como é sair do papel de ação, do perfil de executor? 

Pois é. Tanto que um colega meu falou: "Cris, você nunca vai ser uma boa conselheira". Aquilo me deu uma chacoalhada, "como assim?". Porque realmente eu sempre tive essa veia executiva, de dar a direção, sempre fui muito pragmática.
No papel de conselheira, é preciso mostrar a perspectiva e enteder que o outro pode ter uma visão diferente, e aí você tem que se abster. Aquele chacoalhão foi muito bom. E eu percebi que nos conselhos eu posso contribuir, principalmente sobre o aspecto relacionado a gestão de pessoas, fazer um casamento de negócio com os talentos, como ter pessoas preparadas e trabalhando para atingir esse objetivo, e também trabalhar o aspecto de sucessão. A minha missão sempre foi focar o aspecto humano e preparar o plano de sucessão.
Como líder, eu tenho de ser a pessoa mais substituível da organização. Se a organização depender de mim, sozinha, para alguma coisa, é que tem algo muito errado.
Foi então que eu comuniquei que iria sair quando deu aquele meu último ano para o meu plano de me aposentar. Falei com um grupo muito restrito da empresa (SAP), "olha, até o final de 2024 eu fico". Deu tempo de trabalhar a sucessão por um ano, avaliar pessoas que tinham "fit" com a posição, e deu certo, passei o bastão para a Adriana Aroulho, foi muito legal dos dois lados. 
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E os próximos dez anos?

Quero continuar ativa intelectualmente, além do esporte. Estou estudando, não só temas para conselhos mas também Inteligência Artificial e espiritualidade. Agora, estou escrevendo a minha tese. E finalmente, chamei um personal trainer! 

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