Foto: Envato Elements
Por Gabrielly Bento
[email protected]No Dia Mundial da Saúde, um levantamento realizado pela consultoria Robert Half, em parceria com a The School of Life, escancara um retrato preocupante do bem-estar emocional no mercado de trabalho brasileiro.
O estudo ouviu 774 profissionais de diversas regiões do país e revelou que cerca de 28% dos líderes e 27% dos funcionários afirmam não estar satisfeitos com suas ocupações. Entre os gestores, o índice cresceu seis pontos percentuais em relação ao ano anterior.
Apesar dos avanços nas discussões sobre saúde mental e clima organizacional, os números evidenciam que o ambiente profissional ainda está longe de ser uma fonte de realização para muitos.
É preocupante saber que, mesmo com avanços nos debates e nas ações de gestão de pessoas e bem-estar organizacional, o trabalho ainda não é fonte de realização para uma parte expressiva dos trabalhadores”, afirma Diana Gabanyi, CEO da The School of Life.
Ela destaca ainda que, embora ocupem posições diferentes, líderes e liderados apresentam níveis de satisfação praticamente iguais — 72% e 73%, respectivamente —, o que demonstra que o bem-estar não está necessariamente atrelado ao status hierárquico.
A pesquisa também identificou mudanças nos motivos que geram felicidade no ambiente corporativo. Enquanto os líderes se sentem realizados principalmente por propósito, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e aprendizado constante, os colaboradores valorizam mais o clima no local de trabalho e os relacionamentos interpessoais.
Para Maria Sartori, diretora de mercado da Robert Half, esse cenário reflete uma mudança de mentalidade. “Antes, aceitavam trabalhar para sobreviver, mesmo que isso significasse sacrifício e, até mesmo, sofrimento.
Hoje, a busca é por propósito, conexão e equilíbrio”, comenta. Segundo ela, estruturas corporativas inflexíveis e verticais precisam dar lugar a modelos mais empáticos e colaborativos para promover um ambiente produtivo e inovador.
Nesse cenário, modelos rígidos e hierárquicos devem ser substituídos por uma cultura organizacional mais colaborativa, empática e emocionalmente segura. Isso, no final de cada expediente, tende a se refletir em produtividade, engajamento e inovação”, afirma.
Outro dado alarmante do levantamento diz respeito ao estado emocional dos entrevistados. Cerca de 45% dos funcionários e 41% dos gestores disseram enfrentar questões como estresse, ansiedade ou esgotamento.
Ainda mais preocupante é o crescimento de profissionais que, embora emocionalmente fragilizados, nunca receberam um diagnóstico médico (de 16% para 22% entre lideranças e de 21% para 22% entre as equipes).
Vejo esses dados como uma crise silenciosa de saúde mental. É evidente que existem muitos passos de evolução para melhorar esse cenário, mas ainda há um descompasso importante entre o discurso e a prática nas empresas”, destaca Saulo Velasco, psicólogo e head de aprendizagem na The School of Life.
“O aumento das pessoas que se sentem emocionalmente abaladas, mas sem diagnóstico médico, sugere dois pontos preocupantes: o subdiagnóstico de transtornos emocionais e a normalização do sofrimento no trabalho”, observa Velasco. Para ele, o receio de julgamentos e a falta de tempo têm afastado trabalhadores da ajuda necessária.
A dificuldade de demonstrar fragilidade também ficou evidente entre os gestores. Mais de 20% relataram não se sentir confortáveis para pedir apoio a seus superiores — percentual superior ao registrado entre os colaboradores (16%).
Velasco aponta que essa resistência está ligada à ideia ultrapassada de que bons líderes devem ser inabaláveis. “Esse comportamento, reforçado por culturas corporativas que romantizam a resiliência extrema, pode gerar isolamento e esgotamento emocional, tornando a liderança um papel solitário. A verdadeira gestão, no entanto, não está na ausência de dificuldades, mas na capacidade de enfrentá-las de forma aberta e consciente, promovendo um modelo de trabalho baseado na confiança e na cooperação”, alerta.
A forma como a informação circula dentro das empresas também foi alvo da pesquisa. Apenas 44% dos gestores e 34% dos colaboradores sentem que comunicados importantes são feitos de maneira clara e no tempo adequado. Para Gabanyi, o problema é ainda mais evidente em contextos híbridos de trabalho. “Organizações nas quais os colaboradores não recebem informações e orientações claras, tendem a operar em um ambiente de incerteza, boatos, interpretações equivocadas, erros e retrabalho.”
Outro ponto crítico revelado pelo estudo é a carência de espírito colaborativo no cotidiano empresarial. Mais de 40% dos entrevistados afirmaram que a cooperação não é um valor presente na cultura da empresa. Apenas 16% dos líderes e 15% dos funcionários sentem que o trabalho em conjunto faz parte da rotina.
“Entendo esses dados como um alerta para que as empresas mapeiem se, internamente, estão imperando as ações individualizadas, uma competição interna que não seja saudável ou se falta incentivo para a troca de conhecimentos e o apoio mútuo”, analisa Sartori. Para ela, a ausência de colaboração pode minar a inovação e o bem-estar coletivo.
Diante de um cenário marcado por insatisfação, esgotamento e carência de vínculos saudáveis, os especialistas consultados sugerem cinco ações práticas para transformar a cultura corporativa:
A pesquisa reforça que o bem-estar no trabalho não deve ser tratado como luxo, mas como uma necessidade urgente — tanto para a qualidade de vida dos profissionais quanto para a sustentabilidade das empresas. No Dia Mundial da Saúde, a data serve como um lembrete de que promover ambientes mais saudáveis, colaborativos e emocionalmente seguros é um compromisso que precisa sair do discurso e ser colocado em prática diariamente.
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