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Conferência debate múltiplas velhices e direitos da pessoa idosa

Paula Bulka Durães/Viva

Delegação de São Paulo posa com faixas e bandeiras no espaço cultural Paulo Freire da 6ª Conferência Nacional da Pessoa Idosa - Paula Bulka Durães/Viva
Delegação de São Paulo posa com faixas e bandeiras no espaço cultural Paulo Freire da 6ª Conferência Nacional da Pessoa Idosa
Por Paula Bulka Durães

18/12/2025 | 19h35 ● Atualizado | 19h42

Brasília, 18/12/2025 – As múltiplas velhices é o tema da 6ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (Conadipi), que acontece nesta semana em Brasília. Ao todo, 1,3 mil participantes de todas as regiões e contextos de vida estão reunidos para debater e definir políticas públicas prioritárias – a maioria é composta por pessoas idosas e/ou com deficiência.

São muitas histórias de militância pelos direitos na velhice, seja por meio de conselhos de idosos de municípios ou integrando associações e organizações sem fins lucrativos que enfrentam dificuldades financeiras e estruturais para atender os mais velhos em situação de vulnerabilidade social.

Mas, no Centro Internacional de Convenções do Brasil (CICB), local em que ocorre o encontro, não há desânimo. Enfrentando o cansaço e as adversidades, os delegados eleitos nas 2,6 mil etapas regionais, municipais e estaduais se reuniram nesta quinta-feira, 18, para ampliar e definir as propostas.

Ao todo, foram apresentadas 245 proposições nas regiões, Estados e municípios, em diálogo com os cinco eixos temáticos (ver abaixo). O clima, ao contrário dos outros dias de evento até agora, é de seriedade e concentração, apesar dos momentos de respiro e descontração no palco cultural Paulo Freire.

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Ativista Olga Quiroga, 88, que luta pelo direito à moradia digna - Paula Bulka Durães/Viva

Uma das presenças ilustres é a chilena Olga Quiroga, de 88 anos, referência na luta por moradia e direitos da pessoa idosa em São Paulo, SP, com mais de 60 anos de atuação. Olga acompanhou de perto a criação da Vila do Idoso, em 2007, projeto habitacional no bairro do Pari, em São Paulo, voltado a pessoas idosas de baixa renda.

Sua voz é dedicada à causa da moradia digna, direito garantido pelo artigo 37 do Estatuto da Pessoa Idosa, mas que, na prática, é descumprido na grande metrópole, onde existe um contingente expressivo de população idosa em situação de rua.

Nesta quinta-feira de assembleias, Olga caminhou de mesa em mesa, no horário de almoço, recolhendo assinaturas para uma moção que precisava ser entregue dentro do prazo. A ativista ressaltou que muitos mais velhos se encontram em situação de rua ou moram sozinhos não por escolha, mas em razão do abandono.

"As pessoas que moram sozinhas não têm com quem conversar, aí quando econtram uma pessoa que as atende ou que as escuta, elas não querem mais parar de falar. Os filhos tiram o cartão, tiram a casa, e as pessoas idosas se veem desamparadas, sem recursos para sobreviver.”

Entre os relatos mais marcantes, Quiroga compartilha a história de pessoas idosas que se deslocam para São Paulo em busca de tratamento médico, não têm condições financeiras de retornar para suas casas e acabam desamparadas.

Múltiplas velhices

Ana Leila Gonçalves, 75 anos, faz parte da Associação Centro Social Fusão de Jacutinga, bairro do

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Ana Leila Gonçalves, 75, faz parte de uma associação que atende pessoas idosas nas favelas e periferias - Paula Bulka Durães/Viva

município de Mesquita, na Baixada Fluminense (RJ). A instituição acolhe pessoas idosas das favelas e periferias. O foco de atuação de Gonçalves é a defesa das pessoas idosas com tuberculose e soropositivas.

A delegada alerta que a tuberculose entre pessoas idosas se agrava com a fome e a insegurança alimentar, situação que observou de perto no município.

“O Rio de Janeiro tem um alto índice de mortalidade pela doença, e Mesquita não fica para trás. Pessoas idosas negras de favelas, que trabalham para sustentar a família, acabam abandonando o tratamento. Porque o remédio ataca o estômago, então as pessoas têm que se alimentar bem, e isso nem sempre acontece.”

Gonçalves chama atenção também para a alta incidência da infecção por HIV entre as mais velhas, que muitas vezes mantêm relações sexuais sem o uso de preservativo.

As mulheres estão mais ativas e acabam se contaminando com doenças sexualmente transmissíveis, como HIV, HPV, sífilis e gonorreia. Precisamos urgente de uma clínica da família, atenta na prevenção e tratamento”, defende.

Nelci Barreiros da Silva é uma mulher indígena, de 70 anos, foi candidata a deputada estadual pelo Partido Social Democrático (PSD) e conselheira no Conselho Estadual de Saúde de Minas Gerais (MG). Em Contagem, levanta a bandeira da agricultura familiar dentro das comunidades tradicionais indígenas.

“Minha história de luta começa aos nove anos de idade, quando presenciei a militância do meu pai, um cafeicultor e produtor, contra os grandes fazendeiros que invadiam e soltavam gado em suas roças. Ele teve a mão quebrada em um acidente e não conseguiu manter a terra, e foi forçado a vendê-la.”

Ela defende que as pessoas idosas indígenas tenham seus territórios protegidos e acesso a instrumentos e insumos que auxiliem na produção agrária e na pesca não predatória.

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Luís Baron, 65, presidente da Associação EternamenteSou - Paula Bulka Durães/Viva

Luís Baron, 65 anos, presidente da Associação EternamenteSou, única Organização Não Governamental (ONG) no País dedicada exclusivamente às velhices e ao envelhecimento da população LGBTQIAPN+, ressalta a importância de combater o estereótipo de que a pessoa idosa não possui sexualidade.

"As pessoas imaginam que, quando alguém fica velho, essa pessoa perde a sua sexualidade. Eu não estou falando de sexo, a sexualidade é uma coisa mais global: algo que nasce com a pessoa e morre com a pessoa."

A entidade oferece apoio com atendimento psicológico e jurídico gratuito, oficinas de atividades físicas, cuidado com a saúde mental e letramento digital. Baron destacou que a população LGBTQIAPN+, sobretudo pessoas trans e travestis, enfrenta, na velhice, barreiras inimagináveis, pois sobreviveu a uma sociedade violenta e que falhou em garantir direitos básicos.

Nessa geração que hoje eu considero velha, na qual me incluo, é mais caótico ainda, porque é uma geração que não alternativas. Ou era a prostituição, ou era a rua, ou era a exclusão da família, a perda das suas redes de apoio."

Não há idade para defender os direitos

Mãe de três filhos, a agente comunitária Ariana Tenório, 46, foi eleita, com votação expressiva,

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A agente comunitária Ariana Tenório, 46, delegada de Pernambuco - Paula Bulka Durães/Viva

delegada estadual e municipal de Belo Jardim, no Agreste de Pernambuco. Ela integra a Pastoral da Criança e da Pessoa Idosa do Estado. “As mulheres idosas são iguais a um girassol. Elas sofrem, mas não deixam de brilhar e sorrir. Você pode ver que o girassol permanece de pé mesmo nas adversidades.”

Na Pastoral, Tenório acompanha pessoas idosas em situação de vulnerabilidade social em seus próprios domicílios. “Observo tanto a situação precária de alguns quanto o bom cuidado de outros. Esse trabalho me permite ter a visão para solicitar apoio de equipe e serviços sociais, como o CRAS [Centro de Referência de Assistência Social], dependendo da necessidade.”

Promover inclusão é desafio constante

Os delegados participantes do evento tiveram passagens aéreas, hospedagem e alimentação custeadas pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). No entanto, nos dois primeiros dias de encontro, foram relatadas dificuldades logísticas e de inclusão.

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As mineiras Nelci Barreiros Da Silva, 70, e Cíntia Angélica, 53, da Associação Maria de Nazaré Fonte da Vida - Paula Bulka Durães/Viva

Cíntia Angélica, 53, da Associação Maria de Nazaré Fonte da Vida, Contagem (MG), é uma mulher com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e relatou o descontentamento com a ausência de iniciativas que incluam pessoas idosas atípicas que, como ela, podem ter sensibilidade auditiva. “Faltou informação. Se fosse comunicado ali na frente, no palco, sobre a necessidade de não gritar, aplaudir ou fazer barulhos estridentes, já chamaria a atenção das outras pessoas.”

Ana Leila Gonçalves também relatou um episódio no hotel em que ficou hospedada, onde as pessoas idosas permaneceram horas aguardando na portaria pela liberação dos quartos. 

Mas nem tudo é crítica. A pernambucana Ariana Tenório destacou o cuidado dos organizadores ao dispor de guarda-chuvas para o embarque nas conduções e o atendimento de saúde. “É um evento lindo, com cuidado aos mais velhos. Todo dia, perguntam para eles se já tomaram café, se precisam de ajuda, óbvio que têm seus desafios, mas no geral, é acolhedor.”

Hoje, os participantes notaram melhorias expressivas na organização do evento e uma preparação maior da equipe para acolher as demandas. “Estão nos escutando”, disse uma participante no corredor.

O evento possui recursos de acessibilidade: o palco conta com audiodescrição e uma intérprete de Libras, com imagem ampliada. No salão há um ambulatório para emergências, além de um andar espaçoso reservado para alimentação.

Confira os eixos temáticos da conferência

  1. Financiamento das políticas públicas para ampliação e garantia dos direitos sociais; 
  2. Fortalecimento das políticas para a proteção à vida, à saúde e ao acesso ao cuidado integral da pessoa idosa; 
  3. Proteção e enfrentamento a todas as formas de violência, abandono social e familiar da pessoa idosa; 
  4. Participação social, protagonismo e vida comunitária na perspectiva das múltiplas velhices; 
  5. Consolidação e fortalecimento da atuação dos Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa como política do Estado Brasileiro.

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