Selic alta por mais tempo preocupa endividados e exige atenção nos investimentos

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A taxa Selic deve ficar em patamar alto para conter demanda aquecida pelo emprego - Adobe Stock
A taxa Selic deve ficar em patamar alto para conter demanda aquecida pelo emprego
Por Fabiana Holtz fabiana.holtz@viva.com.br

Publicado em 24/09/2025, às 17h07

São Paulo, 24/09/2025 – A taxa básica de juros, Selic, que está em 15% ao ano - o maior patamar em quase 20 anos - desde meados de junho, tende a se manter onde está até o início de 2026, segundo a média das expectativas dos economistas. E essa realidade tem um impacto relevante no consumo como para os investimentos dos brasileiros. Em primeiro lugar, o juro alto torna a vida dos endividados ainda mais difícil.

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Fred Sampaio recomenda cuidado com o endividamento
Divulgação

Segundo Frederico Sampaio, diretor de investimento da Franklin Templeton, esse é o impacto mais óbvio do juro alto. “Tomar crédito está mais caro. Quem tem um financiamento, seja de um apartamento, veículo ou em parcelamento em qualquer loja do varejo, vai pagar mais caro porque os juros dessa conta são referenciados pela Selic”. Para entender melhor os reflexos desse cenário é preciso ter claro que a Selic é o principal instrumento de política monetária utilizado pelo Banco Central (BC) para o controle da inflação.

Leia também: Consumidor privilegia contas básicas e inadimplência em serviços e empréstimos cresce

Endividamento, crédito e consumo limitado

Entre os números que confirmam essa realidade, dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revelam que a proporção de famílias com contas a vencer cresceu de 78,5% em julho para 78,8% em agosto, o sétimo mês consecutivo de altas.

Já a proporção de consumidores com contas em atraso subiu de 30% em julho para 30,4% em agosto, maior nível de inadimplência da série histórica da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), iniciada em janeiro de 2010.

A lógica é a seguinte. Com o consumo mais restrito, por conta do aumento no custo do alimento, transporte, aluguel, entre outras despesas essenciais, as famílias têm ainda menos espaço para pagar dívidas.

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Cautela e diversificação é o que recomenda o professor El Khatib
Arquivo pessoal

E essa curva de endividados tende a crescer com o crédito mais restrito e caro, estima o economista. “Inclusive os programas de renegociação da dívida lançados pelo governo ficam menos eficazes, porque o custo para se renegociar essa dívida fica muito alto”, acrescenta Ahmed Sameer El Khatib, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Federação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap) e professor da Unifesp.

Renda fixa

No âmbito dos investimentos a palavra é cautela na escolha dos prazos e produtos. "Por exemplo, títulos pós-fixados, como os atrelados ao CDI e Selic, entregam retornos mais altos sem exigir previsão sobre futuro. Títulos pré-fixados atrelados ao IPCA, por exemplo, já adquiridos antes de uma eventual alta podem sofrer uma desvalorização temporária, o que pode resultar em perdas", ensina El Khatib.

Para quem pensa mais no longo prazo, a recomendação do professor é deixar uma parte dos seus investimentos em títulos atrelados ao IPCA, garantindo juros altos combinados com a correção inflacionária. E a velha dica de sempre: diversificação. Não investir tudo em um produto só.

Atividades produtivas e custo de capital

Na ponta das empresas, um sinal do desestímulo aos investimentos em atividades produtivas motivado pela Selic mais alta é a queda na busca por crédito. Em agosto a procura por financiamento no país caiu 2,3% ante julho, de acordo com o Índice Neurotech de Demanda por Crédito (INDC). Ante agosto do ano passado foi registrada queda de 2,5%.

Outro reflexo da Selic no atual patamar de 15% ao ano é o aumento do custo do capital, que representa o retorno mínimo necessário para uma empresa cobrir todos os seus custos de financiamento.  

"No longo prazo o juro alto afeta negativamente a expectativa de crescimento do país, barra a geração de empregos, além de limitar o investimento produtivo. Chega em um ponto que ninguém mais vai investir no país. É um cenário em que até que vive de renda vai começar a se preocupar", afirma Sampaio.

Estratégia de controle

A estratégia do BC ao manter o juro no atual patamar, diz El Khatib, é reduzir a pressão de alta nos preços ao consumidor. O objetivo aqui é controlar a inflação. Em outras palavras, é receitar um antitérmico para conter a febre do doente.

Sampaio ressalta que o BC tem o objetivo principal proteger a moeda. Para isso o único instrumento que ele controla é a taxa de juros. Existe um outro instrumental, que ele não controla, que é a política fiscal. E esse ponto, as decisões relacionadas ao controle de gastos do governo, não tem caminhado de forma satisfatória para o BC. “É como se estivessemos em um carro com dois motoristas. Imagine que um deles, o governo, aperta fundo no acelerador, enquanto o outro motorista, o BC, se vê obrigado a pisar no freio para manter o controle do carro. É o que temos vivido e não é de hoje, tem uns dois a três anos”, diz o diretor de investimento da Franklin Templeton.

Outro cenário preocupante é quando a inflação mostrar resistência em ceder. "O mercado interpreta que a política adotada pelo Comitê de Política Monetária (Copom)  do BC para conter os preços não está tendo tanta eficácia”, explica El Khatib. “É possível inclusive, chegar a um cenário de estagflação, e eu tenho a sensação que estamos nos encaminhando para isso”, acrescenta.

O que é estagflação?

Esse cenário se configura quando a baixa atividade econômica se combina com inflação alta e persistente e aumento do desemprego. O termo ‘estagflação’ surgiu da junção das palavras estagnação e inflação. Alguns economistas o classificam como um fenômeno raro e preocupante.

Armadilha do endividamento

No momento, o conselho dos economistas ouvidos pelo Viva é rever seus gastos e evitar entrar em novas dívidas. 

Em um momento que temos a segunda taxa de juro real mais alta do planeta, ter disciplina financeira é a melhor dica para escapar das armadilhas do endividamento.

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