Brasília, 01/09/2025 - A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta terça-feira, 2, o
julgamento da ação penal que acusa o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus de tentar um golpe de Estado que visava à manutenção do poder mesmo após a derrota nas eleições de 2022. A denúncia foi dividida em cinco núcleos. A Corte se debruça neste momento sobre o chamado "núcleo crucial" da suposta organização criminosa.
O grupo responde por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. As penas, somadas, podem chegar a 43 anos.
O presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin, marcou cinco datas para o julgamento, distribuídas em duas semanas. A análise pode ser suspensa por pedido de vista, o que adiaria o desfecho para dezembro. Também podem ser convocadas novas sessões, se não houver tempo hábil para a conclusão. As sessões vão ocorrer nesta e na outra semana:
Quando ocorrem as sessões de julgamento
- Terça-feira (2): das 9h às 19h
- Quarta-feira (3): das 9h às 12h
- Terça-feira (9): das 9h às 19h
- Quarta-feira (10): das 9h às 12h
- Sexta-feira (12): das 9h às 19h
Quem será julgado:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
- General Braga Netto, vice na chapa de Bolsonaro;
- General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
A denúncia
A denúncia foi oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em fevereiro deste ano. Ao todo, 34 pessoas foram denunciadas. O julgamento de agora, no entanto, abrange apenas os oito réus do "núcleo crucial" da suposta organização criminosa.
A PGR alega que o cenário de instabilidade social que culminou nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 foi fruto de uma construção iniciada em 2021. A acusação narra que os réus, nesse período, disseminaram ataques aos poderes constitucionais, espalharam uma narrativa falsa de fraude no sistema eleitoral e pediram intervenção militar no País.
Uma das evidências apresentadas pela PGR foi a chamada "minuta golpista", encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, que previa a anulação das eleições e a prisão de autoridades. Outra minuta de decreto foi apresentada aos comandantes das Forças Armadas e sugeria impedir a posse de Lula e adotar medidas de exceção.
Segundo a acusação, a trama também envolvia um plano, intitulado "Punhal Verde e Amarelo", para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro Alexandre de Moraes, além do vice-presidente Geraldo Alckmin. De acordo com a PGR, a tentativa de golpe foi frustrada apenas porque não contou com apoio do Alto Comando do Exército.
O que dizem as defesas
De forma geral, as defesas negam participação dos réus nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e contestam a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Os advogados alegam coação e falta de voluntariedade nos depoimentos prestados por Mauro Cid à Polícia Federal (PF). As informações delatadas foram confirmadas por Cid em interrogatório no Supremo.
A estratégia dos réus implicados na delação, como Bolsonaro e Braga Netto, é questionar a credibilidade de Cid. As defesas têm investido em apontar contradições e mentiras nos depoimentos do delator. Essa análise será feita pela Primeira Turma de forma preliminar, anterior ao mérito do julgamento - condenação ou absolvição.
Uma eventual anulação da delação premiada prejudicaria Cid, que corre risco de perder os benefícios firmados em acordo com a PF. Mas a PGR sustenta que a delação foi apenas um ponto de partida para as provas e, por isso, o processo no Supremo não seria encerrado. Há suspeitas de que ele teria utilizado um perfil falso no Instagram para manter contato com a defesa de outro réu, o que configuraria descumprimento das medidas cautelares.
Outro argumento das defesas é que os fatos descritos na acusação não configuram crimes, mas, sim, atos preparatórios impuníveis. A defesa de Bolsonaro alega que os discursos e críticas ao sistema eleitoral do ex-presidente não configuram violência ou grave ameaça, elementos que seriam essenciais para os crimes imputados.
Como será o julgamento
A primeira sessão começa nesta terça-feira, 2, com a leitura do relatório pelo ministro Alexandre de Moraes. Em seguida, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tem até duas horas para sua manifestação. Depois, as defesas dos oito réus fazem suas sustentações orais, de uma hora cada. A defesa de Mauro Cid será a primeira a se manifestar porque ele firmou acordo de delação premiada. Em seguida, os demais se manifestam em ordem alfabética. Essa fase deve se estender até esta quarta-feira, 3.
Só depois de todas as manifestações, Moraes apresenta seu voto pela condenação ou absolvição dos réus. A leitura do voto pode ficar para a próxima semana, no dia 9. Depois, os ministros votam na seguinte ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, a ministra Cármen Lúcia e, por fim, o ministro Cristiano Zanin. Se houver maioria favorável à condenação, o relator apresentará sua proposta de definição das penas, e os demais ministros votarão em seguida.
A expectativa é que haja alguma divergência em relação ao tempo de detenção. Fux e Zanin já indicaram ser favoráveis a penas mais brandas nos julgamentos relacionados ao 8 de janeiro. Também há a possibilidade de que os ministros autorizem o cumprimento da prisão de Bolsonaro em regime domiciliar. Em 2025, o tribunal concedeu esse direito ao ex-presidente Fernando Collor e ao ex-deputado Roberto Jefferson. Podem pesar a favor da prisão domiciliar os problemas de saúde alegados por Bolsonaro.
Penas podem chegar a 43 anos
Caso Bolsonaro e os outros sete réus sejam condenados pelo Supremo pelos cinco crimes imputados pela PGR, as penas podem variar entre 12 e 43 anos de prisão. A dosimetria depende de circunstâncias atenuantes - como idade de 70 anos ou mais, que é o caso de Bolsonaro - ou agravantes. Veja os crimes e respectivas punições:
- Organização criminosa: pena de 3 a 8 anos, que pode chegar a 17 anos com agravantes citados na denúncia;
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: pena de 4 a 8 anos;
- Golpe de Estado: pena de 4 a 12 anos;
- Dano qualificado com uso de violência e grave ameaça: pena de 6 meses a 3 anos;
- Deterioração de patrimônio tombado: pena de 1 a 3 anos.