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Decisão do STF que afeta Netflix pode impactar outras grandes empresas

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Netflix reportou provisão de R$ 3 bilhões em balanço devido a caso na Justiça brasileira sobre imposto - Pixabay
Netflix reportou provisão de R$ 3 bilhões em balanço devido a caso na Justiça brasileira sobre imposto

Por Mariana Ribas, Circe Bonatelli e Aramis Merki II, da Broadcast

redacao@viva.com.br
Publicado em 29/10/2025, às 10h10
São Paulo, 2(/10/2025 - A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que ampliou o alcance da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) e afetou os resultados da Netflix poderá impactar outras grandes empresas em seus balanços, de acordo com tributaristas ouvidos pela Broadcast
As empresas de tecnologia, as filiais de grupos multinacionais e as franqueadoras de marcas globais estão entre as maiores candidatas a reportar provisões, apontaram os advogados. A medida, entretanto, abrange companhias de todos os setores.

O que é a Cide-tecnologia?

O foco da discussão é a Cide-Tecnologia, contribuição que existe há 25 anos e incide sobre as remessas financeiras feitas por empresas locais para o exterior a título de remuneração de contratos que envolvam o uso ou a transferência de tecnologia estrangeira. 
A novidade veio em agosto deste ano, quando o STF validou o entendimento das instâncias inferiores que ampliava a abrangência da Cide para remessas sobre serviços técnicos e administrativos, royalties de qualquer natureza, usos de licenças, direitos autorais e propriedade intelectual, não se limitando apenas aos casos em que há transferência de tecnologia. Para todos esses casos, foi confirmada a alíquota de 10% sobre as remessas.
O julgamento envolveu um caso da Scania Latin America, com a publicação de acórdão de mérito no último dia 16.
Todas as empresas estão sujeitas a pagar a Cide em função das suas atividades, mas alguns setores estão mais expostos. Entre eles estão as big techs, que oferecem conteúdos digitais como streaming de áudio e vídeo, software, dados na nuvem, redes sociais e publicidade digital. Esses grupos tendem a ser mais atingidos porque estão comercializando no Brasil produtos e serviços tecnológicos que vêm lá de fora, principalmente dos Estados Unidos, seu país de origem.
"Essa interpretação [do STF] amplia o alcance do tributo e afeta diretamente empresas de tecnologia, como as plataformas de streaming, que dependem de tecnologia e suporte técnico de suas matrizes no exterior", afirmou Breno Vasconcelos, sócio do escritório Mannrich e Vasconcelos.

Impacto nas empresas

O tema é muito relevante para as empresas, uma vez que a Cide não é um tributo afetado pelas mudanças da Reforma Tributária.
Ou seja, a partir de agora as empresas que fazem remessas de serviços variados ao exterior deverão recolher a contribuição sobre royalties de qualquer natureza, independentemente de haver ou não transferência de tecnologia, sob o risco de serem autuadas se não seguirem a nova tese da Corte. 
"Praticamente qualquer remessa para o exterior a título de remuneração de serviços está sujeita a essa Cide", afirmou o sócio do escritório Moraes e Campos Advogados, Eduardo Campos.
Como exemplo de atividades expostas à contribuição, ele citou empresas locais que demandem suporte técnico do exterior ou filiais que compartilham backoffice (recursos humanos, tecnologia, administração) com suas matrizes lá fora.
As provisões vão aparecer nos balanços de empresas que não pagaram a Cide, nem fizeram depósito judicial, por exemplo, o que pode ter ocorrido por alguma decisão liminar ou por outra decisão interna.
"O impacto no balanço vai depender da estratégia jurídica e tributária adotada ao longo desses anos até aqui", ponderou o advogado Carlos Eduardo Orsolon, sócio do escritório Demarest. "Se outras empresas seguiram o modelo da Netflix, sem pagar, sem depósito judicial e com processos abertos, agora terão que provisionar", disse.
A sócia do escritório Tauil & Chequer, Ana Luiza Martins, observa que muitas empresas classificavam o tema no balanço como "perda possível", o que aparecia apenas nas notas explicativas, mas sem detratar os resultados. Com a tomada de posição do STF, o montante em disputa pelas empresas terá que ser reclassificado como "perda provável", o que exigirá a provisão de fato. "Só agora que o STF se manifestou, a perda muda de categoria", explicou.

Despesa não prevista de R$ 3 bilhões

A própria Netflix afirmou entender que outras empresas serão impactadas, de acordo com nota aos investidores. A gigante do streaming reportou um impacto negativo de US$ 619 milhões (cerca de R$ 3 bilhões) no balanço do terceiro trimestre com despesas não previstas por conta da disputa tributária no Brasil. A margem operacional da Netflix ficou em 28% por conta do imposto, frustrando analistas e investidores. Sem ele, teria atingido 34%, pelas contas do Itaú BBA.
Por aqui, o processo no Supremo tem sido acompanhado por representantes de empresas variadas, de softwares a comunicação. Já entraram como amicus curiae (terceiros interessados na causa) a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), a Câmara brasileira de Economia Digital (Câmara E-Net), a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), entre outras.
A Strima, associação que reúne empresas como Netflix, Disney, HBO, Amazon Prime Video e Globoplay, declarou que está analisando a extensão dos efeitos da decisão. Em nota, destacou que a decisão judicial não se restringe aos serviços de streaming e que a abrangência do tributo foi estabelecida para remessas de variadas naturezas e finalidades. 
Além disso, as empresas de streaming se preparam para um projeto de lei que está em votação para regulamentar as plataformas e deve impor a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), em uma fatia de 3% a 6% das receitas.

Outros processos sobre Cide

A discussão sobre a Cide coleciona um contencioso de mais de 20 anos, reunindo casos em diversos tribunais, incluindo no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Na última semana, inclusive, o órgão manteve a cobrança da Cide sobre remessas de royalties do Google Brasil para o Google LLC, domiciliado nos Estados Unidos, com um impacto estimado em cerca de R$ 1 bilhão à empresa.
As confederações setoriais procuradas reportagem ainda não têm um cálculo de estimativa do valor total do impacto da decisão nas empresas. Entretanto, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2026 previu, caso o julgamento fosse favorável aos contribuintes, um rombo de R$ 19 bilhões nas contas públicas. Esse valor corresponde ao tributo que a Fazenda entendia como devido pelas empresas que não estariam pagando.

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