STF julga responsabilidade das redes sociais; entenda o marco civil da internet

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O Marco regula os direitos, garantias e deveres no uso da internet

São Paulo, 12/06/2024 - O Supremo Tribunal Federal (STF) vai retomar nesta quinta-feira o julgamento que discute a responsabilidade das redes sociais por conteúdos ilícitos e ofensivos publicados pelos usuários. A Corte já formou maioria para declarar, parcial ou totalmente, a inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet. Esse dispositivo isenta as empresas de responder civilmente por danos causados por postagens, a não ser que descumpram uma ordem judicial de remoção.

Os critérios para a responsabilização ainda serão definidos em uma tese que vai servir de norte para o julgamento de todas as ações na Justiça que discutem o tema. O presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, disse que suspenderá o julgamento após todos os ministros votarem para que eles busquem um consenso a portas fechadas. Isso porque, embora tenham concordado na essência, os ministros tiveram divergências pontuais. 

O Marco Civil da Internet (Lei 12.965 de 2014) discorre sobre a  responsabilização das redes sociais pelo conteúdo considerado ilícito publicado pelos usuários. Esta lei tem protagonizado debates sobre liberdade de expressão no mundo digital, especialmente após o bloqueio da plataforma X (antigo Twitter), em agosto de 2024. 

Saiba mais sobre o MCI e seu propósito de regular os direitos, garantias e deveres no uso da internet. 

Criação do Marco Civil da Internet

Antes do Marco, a regulação brasileira para o mundo digital era nebulosa. Existiam projetos como a PLC n° 89 de 2003, do Eduardo Azeredo (PSDB-MG), voltados a punição de crimes que se utilizavam da internet, entre outros. O processo centralizou estas demandas e criou o Marco Civil da Interneti só, muito digital. 

Em 2007, o advogado e professor Ronaldo Lemos escreveu um artigo em defesa da criação de um marco regulatório para a internet brasileira. O ponto era que ele fosse civil, ao invés de criminal, como proposto anteriormente. O texto deu início a uma série de movimentos, como uma petição digital que ultrapassou 100.000 assinaturas e, por fim, uma elaboração coletiva do anteprojeto. Esta elaboração foi  feita online no site CulturaDigital.Br, plataforma pública de blogs e conversas lançada em 2009 pelo Ministério da Cultura.  

Após as tramitações legais, o Marco Civil da Internet foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 23 de abril de 2014, durante o Encontro Multissetorial Global Sobre o Futuro da Governança da Internet, quando foi apontado como “referência mundial para as legislações”. 

Princípios abordados 

O texto final do MCI possui 32 artigos divididos em 5 capítulos, que regem sobre as atividades online dos usuários, das empresas provedoras e do Governo. A Lei possui como base três princípios:

  • Neutralidade
  • Privacidade
  • Liberdade de expressão

A neutralidade de rede, garantida especialmente pelo artigo 9°, prevê que os dados sejam distribuídos e transmitidos igualmente, independente de sua origem. Desta forma, as operadoras são proibidas de cobrar mais caro do usuário caso a rede seja usada para assistir a vídeos em comparaão com o que cobraria por mensagem, por exemplo; ou então, fazer com que um aplicativo tenha conexão mais rápida do que outro. 

A privacidade de dados, abordada nos artigos 10° e 11°, garante que os usuários tenham sigilo nas comunicações, de forma que seus emails ou mensagens no WhatsApp sejam lidos apenas pelo remetente e seus destinatários. Além disso, as empresas não podem usar os dados fornecidos pelo usuário, como para direcionar propagandas que correspondam às suas pesquisas anteriores, sem sua autorização. Em muitos casos, há pedido dos sites para o usuário aceitar “cookies” com essa finalidade.

Muitas dessas regras foram alteradas após a Lei Geral de Proteção de Dados, (Lei Nº 13.709, de 2018) conhecida como LGPD, que aprofundou o tema do uso das informações dos usuários pelas big techs. Vale notar que, apesar de prezar pela privacidade, nenhuma destas leis permite o anonimato, que é vedado no artigo 5° da Constituição. 

Por último, a liberdade de expressão, tratada nos artigos 8°,19° e 20°, incide principalmente sobre os conteúdos nas plataformas. Com estes artigos, a responsabilidade sobre tudo que for vinculado por terceiros só cabe às plataformas caso não cumpram ordens judiciais.

Além disso, estas plataformas são proibidas de arbitrariamente derrubar os conteúdos publicados por seus usuários, com exceção da violação aos direitos autorais e divulgação de fotos íntimas sem consentimento. 

O que o Marco Civil da Internet afeta na prática? 

  • Seus dados, mensagens e informações pertencem a você, e não podem ser divulgados nem utilizados por outros usuários ou empresas sem sua autorização.
  • Seu conteúdo digital só pode ser retirado após decisão judicial, desde que não viole direitos autorais ou exponha nudes de terceiros sem consentimento.
  • A responsabilidade por todo o conteúdo publicado é de quem a publicou.
  • Sua conexão deve ter igual preço e velocidade não importando como ou para que for usada.

Discussões atuais

Nesses 11 anos, o Marco Civil da Internet passou por diversas mudanças, e suas cláusulas figuram em importantes debates no âmbito civil. Conheça alguns deles.

O PL das Fake News, PL 2630/2020, de autoria do Senador Alessandro Vieira (CIDADANIA/SE), foi escrito com o intuito de legislar sobre a disseminação de conteúdo mentiroso na internet. Ao mesmo tempo que foi visto pelos apoiadores da PL como uma adição importante ao MCI, garantindo maior segurança aos internautas ao punir as notícias falsas, também foi criticado por opositores, incluindo representantes de Big Techs, que temiam uma diminuição na liberdade de expressão. Atualmente, o PL segue parada da câmara dos deputados. 

Já a responsabilidade das redes sociais sobre o que é publicado por terceiros consta no artigo 19°, e atualmente está em julgamento pelo STF. No recurso, as empresas poderão ter maior responsabilidade sobre o conteúdo e deverão elaborar meios para impedir conteúdo criminoso. 

Por último, o novo Código Civil, que está em tramitação no Senado, possui um livro inteiro dedicado ao Direito Civil Digital. Muitas críticas se focaram na redundância das normas, justamente pela existência do MCI. No entanto, alguns dos artigos propostos poderão trazer mudanças, como a revogação do artigo 19°.

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