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Veja como empreendedora 50+ enfrentou o preconceito na área de tecnologia

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"Como é que você quebra o preconceito? Com competência técnica", afirma Neiva Mendes - Divulgação
"Como é que você quebra o preconceito? Com competência técnica", afirma Neiva Mendes
Claudio Marques
Por Claudio Marques claudio.marques@viva.com.br

Publicado em 17/11/2025, às 09h28

São Paulo, 17/11/2025 - Se hoje a participação feminina na área de tecnologia ainda é minoritária, nos anos 1980 a situação era bem pior. Uma mulher nessa área era algo raro.
Neiva Dourado Mendes, 64 anos, é uma desbravadora. Da aprendizagem silenciosa sobre programação aos estudos em inteligência artificial até fundar, em 2016, a Blue6ix, precisou enfrentar o preconceito de gênero em um ambiente majoritariamente masculino. Já teve até que ouvir que seu trabalho fedia. 
Segundo dados da Brasscom, a associação das empresas de tecnologia, a participação de mulheres em posições de diretoria e gerência no segmento alcança 35,6%, e é ainda menor na área operacional, como tecnologia da informação e pesquisa e desenvolvimento (P&D), com 28,1%, conforme levantamento de 2024.
Hoje, à frente da Blue6ix, empresa de central de atendimento e análise de dados com inteligêcia artificial e atendimento humano, Neiva conta com orgulho que 76% da sua equipe de 108 pessoas são mulheres, das quais 30% são mães. Em julho, ela se afastou da direção da empresa para se tornar presidente do conselho. Mas continua acompanhando os negócios de perto, participando de palestras e dando aulas.

Competência técnica em TI

Mesmo quando lembra das agressões que já enfrentou, não se abate. Recorda,  por exemplo, da ocasião em que estava desenvolvendo um projeto de downsizing, ou seja, baixando dados do mainframe para computadores locais, e o diretor da empresa tinha uma expectativa não condizente com a realidade de que o trabalho seria feito em muito pouco tempo. “Uma vez, ele disse que meu trabalho fedia”, conta.  O time era grande, e só tinha ela de mulher. 
“A grosseria, a discriminação, o preconceito, ele não pode vencer. Não pode ter espaço. Não podemos permitir que isso prolifere. Como é que você quebra isso? Para mim, eu acho que eu quebro com competência técnica. Sendo mulher e sendo idosa, competência técnica eu acho que é um fator determinante.”
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Pode participar, mas não pode perguntar

Em 1984, Neiva era recepcionista de uma revenda da Prológica, uma companhia nacional que produzia computadores, quando soube de um treinamento sobre programação na empresa onde trabalhava.
“Eu pedi para participar e eu lembro da frase que eu recebi do meu chefe: ‘Você pode participar, mas você não abre a boca’. Eu era proibida de perguntar." 

E não é que o professor a indicou para uma vaga na área? Assim, deu início a sua trajetória em tecnologia. Foi analista de suporte, coordenadora de informática, gerente de projetos, depois exerceu cargos de direção. Passou por diversas empresas, entre elas, Datalógica, Grupo Portugal Telecom e CSU.

Experiência no exterior e xenofobia

Na Dedic, empresa de call center do grupo Portugal Telecom, foi transferida para Portugal, onde ficou por dois anos e meio. Lá, estruturou do zero uma nova diretoria e aprofundou seus conhecimentos, principalmente em relações humanas. Conheceu por acaso, no elevador, o presidente da empresa, que lhe fez várias perguntas sobre tecnologia e o trabalho que fazia.

Depois disso, era convocada para acompanhá-lo em reuniões, porque, segundo ele, Neiva  tinha a capacidade de traduzir com clareza o informatiquês para o português, ”Então, eu era tradutora dos termos técnicos para ele. Foi muito legal. Eu tive muita gente boa na minha vida, felizmente.” Mas não só.
Foi nessa etapa de sua vida em que teve de enfrentar mais um preconceito: xenofobia. Durante uma apresentação em Portugal para uma empresa cliente do grupo, seu chefe foi questionado, na sua presença, se a empresa tinha passado a contratar jogador de futebol. “Na visão dessa pessoa, brasileiro só servia para isso.”  Neiva lembra que cada vez que ia falar em uma apresentação, o presidente dessa empresa dizia: "Eu não entendo o que a senhora fala".
O gênero pesa muito. Ao longo da vida você vai enfrentando. São diferenças salariais, diferenças na velocidade de crescimento ou de promoção."
Quando o grupo PT adquiriu parte da Oi, uma das condições do acordo foi que a empresa de call center da operadora brasileira, a Contax, absorvesse as operações da Dedic. O processo, conduzido por Neiva, envolveu a transição de aproximadamente 21 mil colaboradores. Na época, ela ocupava a diretoria de Recursos Humanos, Qualidade, Comunicação, Compras e Processos.

Recolocação após os 50 anos

Após a conclusão da integração, foi desligada em fevereiro de 2013, aos 53 anos. Seu marido, que conheceu na Dedic e, assim como ela era diretor da empresa, também foi demitido na época. Para ela, a situação exemplifica as dificuldades sofridas pelas mulheres: seu marido conseguiu uma nova colocação quase que imediatamente, enquanto ela levou mais de 6 meses para conseguir um novo emprego. 
Foi nesse período que começou a aprofundar conhecimentos em inteligência artificial. Como gerente de qualidade na CSU Digital, esteve à frente de um projeto para aquisição e uso de uma plataforma de IA com tecnologia baseada em fonética — um recurso capaz de captar e respeitar as diferentes nuances de fala existentes em um País de dimensão continental como o Brasil, de acordo com Neiva.  
“O ponto que eu vejo são as diferenças de oportunidades. Às vezes há uma imagem errada de que atividades de exatas, de tudo que envolva números e cálculos, está vinculado ao homem." 
Por influência de um amigo, aceitou o desafio de se tornar empreendedora. Deixou o emprego e, em 2018, nasceu a Blue6ix. Tinha 56 anos na época.
Em sua visão, tecnologia é só o meio. "Tudo é gente. Ao fim e ao cabo, a tecnologia só está no meio, é um veículo. O que importa são as pessoas mesmo.” 

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