Entidades recebem com preocupação proposta de taxar operações isentas de IR

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Instituições alertam para os impactos que a medida pode trazer para os setores imobiliário e agrícola - Envato
Instituições alertam para os impactos que a medida pode trazer para os setores imobiliário e agrícola

Por Fabiana Holtz e equipe do Broadcast

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Publicado em 09/06/2025, às 17h04

São Paulo, 09/06/2025 - Apresentada como alternativa a decreto de cobrança de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), a taxação de 5% em operações que antes eram isentas do Imposto de Renda (IR) repercutiu negativamente entre entidades dos setores imobiliário e do agronegócio.

Em nota, a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc)  considera que a medida provisória em discussão no governo atinge diretamente os rendimentos das Letras de Crédito Imobiliárias (LCIs). Pelos cálculos da entidade, proposta de taxação tende a elevar em 0,5% o custo do crédito imobiliário, restringindo o acesso à moradia em um contexto em que as taxas de financiamento já se encontram em níveis elevados devido ao patamar da Selic, de 14,75% ao ano.

Fato é que com a queda nos recursos da poupança destinados ao financiamento da construção e da aquisição de imóveis, os bancos passaram a recorrer cada vez mais às LCIs para abastecer as linhas de crédito.

"Com o esgotamento dos recursos da poupança, as LCIs têm se tornado, na prática, a principal fonte de funding dos novos financiamentos habitacionais", descreveu a associação, citando que o estoque desses títulos chegou a RS 427 bilhões. "A elevação proposta correspondente a um acréscimo de 0,5% no custo do crédito imobiliário vinculado ao Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE)."

A Abrainc observou ainda que, nos últimos quatro anos, o custo do financiamento habitacional via SBPE já teve um aumento de 5 pontos porcentuais, o que resultou em um acréscimo de aproximadamente 45% no valor das parcelas. "A nova medida, portanto, representa um obstáculo adicional para as famílias que desejam adquirir a casa própria, além de comprometer o crescimento econômico e a geração de renda no País", disse a associação.

Problema estrutural

Para a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), as medidas são de carater arrecadatório e de curto prazo e não resolvem o problema. Segundo a entidade, o problema fiscal é estrutural e exige ações coordenadas de curto, médio e longo prazos. 

Segundo a entidade que representa gestoras e instituições financeiras com mais de R$ 9 trilhões em patrimônio, ainda é preciso um melhor detalhamento das novas medidas fiscais propostas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Especificamente sobre a proposta do governo de tributar as letras de crédito imobiliárias (LCI) e agrícolas (LCA), a Anbima ressalta que a decisão segue "em linha com uma defesa histórica da Associação, em favor da redução das assimetrias entre diferentes produtos de investimento".

Quando o governo decidiu, em 23 de maio, aumentar as alíquotas do IOF, a Anbima recebeu com "preocupação" as medidas, ressaltando que teriam "reflexos negativos para todo o mercado de capitais brasileiro". Naquele momento, a associação ressaltou o alívio com a decisão do governo de rever algumas medidas anunciadas na noite anterior, como aplicação de investimentos de fundos nacionais no exterior.

Profunda preocupação

Em nota, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) afirmou ver com "profunda preocupação" a proposta do governo federal de tributar em 5% os rendimentos de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs). "A medida compromete uma fonte essencial de crédito rural, especialmente para médios produtores e cooperativas, além de encarecer o financiamento do setor em meio a juros altos e queda nas commodities. A conta será paga pelo consumidor que receberá o repasse no preço dos alimentos", alerta a FPA.

Na sua reação à medida, a FPA reitera que as LCAs são base do financiamento agropecuário e estruturam o Plano Safra. "Aproximadamente 42% do financiamento da safra brasileira já é proveniente de fontes privadas. Desse total, cerca de 43% têm origem nas Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs). Em abril de 2025, essas letras somaram R$ 559,9 bilhões", apontou a FPA.

Citando dados da B3, a bancada do agro lembrou que o estoque de LCIs e LCAs alcançou R$ 979,1 bilhões em abril, sendo parte destinada ao agronegócio. "A tributação tende a afastar investidores e encarecer o crédito para quem produz", afirmou a FPA.

A entidade criticou também a forma da alternativa proposta pelo governo federal para o IOF priorizando aumento de tributos. "Mais uma vez, o ajuste fiscal foca apenas na arrecadação, sem enfrentar despesas obrigatórias nem revisar privilégios. Enquanto LCIs e LCAs serão taxadas, outros títulos permanecem isentos, sem critérios claros que justifiquem a diferenciação", cobrou a FPA.

Por fim, a bancada do agro afirmou que "penalizar o setor penaliza também o crescimento do País". "É preciso equilíbrio: ajustar as contas passa pelo controle de gastos e pela revisão estrutural do orçamento, e não pelo aumento do peso sobre quem sustenta a economia", criticou a bancada da agropecuária.

Mais cedo, o presidente da FPA, deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), afirmou que a bancada não vai aceitar aumento do imposto sobre LCAs e que vai entrar em batalha com o governo.

Crédito rural

Para a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) considera que a proposta pode agravar o cenário de redução no estoque dos títulos de LCAs. "Além da menor atratividade desses títulos devido ao prazo mínimo de carência exigido na disposição do CMN (Conselho Monetário Nacional), a tributação prevista tende a desestimular os investidores, gerando uma redução adicional no volume de recursos aplicados em LCAs. Essa retração interfere diretamente na disponibilidade de funding para o crédito rural", observou a CNA em nota técnica divulgada nesta segunda-feira.

A manifestação da entidade vem em meio à sinalização do governo de tributar as LCAs, hoje isentas de impostos para pessoas físicas, como alternativa ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Na nota técnica, a CNA destaca que a redução do estoque de LCAs observada na safra atual afetou diretamente a participação dos títulos como fonte de lastro das operações do Plano Safra. As LCAs, tradicionalmente, representam a principal fonte de recursos para o financiamento do crédito rural.

De acordo com dados compilados pela CNA, a partir do Banco Central, a participação das LCAs passou de 43% do volume total de recursos ofertados na safra 2023/24 para 29% na safra 2024/25, saindo de R$ 169,12 bilhões para R$ 97,89 bilhões na comparação de julho a maio de ambas as safras. "No entanto, na safra 2024/2025, a queda no volume disponível desses papéis, associada a fatores econômicos como a elevação da taxa básica de juros e a burocracias extras, comprometeu a capacidade de oferta de crédito com taxas livres e equalizadas. Esse cenário contribuiu de forma decisiva para o desempenho abaixo do esperado dos programas oficiais de financiamento rural", apontou a entidade.

A CNA lembrou ainda que as LCAs passaram por uma série de mudanças recentes pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), como ampliação do prazo de rentabilidade do título. Essas mudanças, segundo a CNA, "afetaram a rentabilidade do título, diminuíram o ritmo de crescimento e, com isso, sua participação no funding do setor tem diminuído". "Ainda que o governo tenha tentado corrigir as distorções causadas, aumentando o direcionamento, de 50% para 60%, e reduzindo o prazo de rentabilidade, de nove meses para seis meses, as recentes notícias trazem grande preocupação ao setor", alertou a CNA.

Por fim, a entidade recomenda uma série de medidas para ampliar o lastro das operações por meio das LCAs, como a manutenção da isenção tributária do título para pessoas físicas, a elevação da exigibilidade de aplicação dos recursos captados pelo título no crédito rural para 85% (será 60% a partir de 1º de julho) e a redução do prazo de rentabilidade das LCAs para 90 dias.

A CNA sugere ainda que os estoques de LCAs sigam a regra de vigência na sua aplicação, até o fim de sua validade, o que permite maior flexibilização na aplicação dos recursos em operações de longo prazo, sem interferência de mudanças futuras.

Palavras-chave Abrainc IOF Anbima CNA FPA

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