Menopausa: a nova conversa sobre envelhecimento, saúde e autonomia feminina

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Pesquisa mostra que 8 a cada 10 mulheres vivenciaram sentimentos psicológicos negativos devido à menopausa - Envato
Pesquisa mostra que 8 a cada 10 mulheres vivenciaram sentimentos psicológicos negativos devido à menopausa
Por Bianca Bibiano

Publicado em 23/04/2025, às 08h33 - Atualizado às 16h23

Nos últimos cinco anos, as buscas pelo termo “menopausa” dobraram no Google. A tendência, revelada pelo Google Trends, aponta um pico de interesse especialmente no último ano. O aumento da longevidade feminina aliado à maior abertura social explica parte desse movimento. Contudo, a visibilidade crescente ainda esbarra em tabus.

Pesquisa de opinião da farmacêutica Astellas coletada em seis países, incluindo o Brasil, identificou que as brasileiras estão entre as que mais sofrem os impactos negativos da menopausa. Os dados, lançados em março, mostram que 8 a cada 10 mulheres vivenciaram sentimentos psicológicos negativos devido à essa fase, incluindo ansiedade (58%), depressão (26%), constrangimento (20%) e vergonha (16%).

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Ana Priscila Soggia, endocrinologista especialista em saúde feminina: "Ainda existe um discurso de que o tratamento só é necessário se o sintoma é muito intenso" - Foto: Acervo pessoal

Para Ana Priscila Soggia, endocrinologista e metabologista especialista em saúde da mulher, climatério e menopausa, esses fatores podem inclusive reduzir o número de mulheres que buscam acompanhamento médico para cuidar dessa etapa da vida.

"Em geral, as que procuram ajuda o fazem porque os sintomas estão intensos. Mas tem uma parcela que não procura, seja porque desconhece os impactos das alterações hormonais, seja porque seus sintomas foram minimizados".

A médica diz ainda que existe também o tabu envolvendo os tratamentos disponíveis para o alívio dos sintomas experienciados nessa fase. "Observamos um padrão na medicina que reflete a cultura da nossa sociedade em minimizar e banalizar pontos importantes do corpo feminino. Assuntos como TPM, cólica, climatério e menopausa ficaram fora dos estudos científicos por muitos anos". E completa:

"A dor é um sintoma frequente na perimenopausa e menopausa, mas cerca de 80% dos estudos para avaliação de medicamentos para dor foram conduzidos com homens. Ou seja, não são pesquisas feitas para o público predominante quando falamos dessa queixa clínica".

Mulheres com mais autonomia e autoconhecimento

Essa questão envolve não apenas o fenômeno demográfico do envelhecimento da população, mas também a mudança do papel da mulher na sociedade, na opinião da ginecologista Isabel Sorpreso, professora associada da disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). 

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Isabel Sorpreso, ginecologista e professora associada da FMUSP: "Menopausa é um momento de olhar para si". - Foto: Arquivo pessoal

Ela coordena o programa Educação em Saúde para Mulheres na Transição para a Menopausa e Pós Menopausa, que tem como principal iniciativa o canal Menopausando, que busca proporcionar educação em saúde sobre o tema, e diz que o crescente interesse no tema foi o principal motivador da proposta.

"Devido à maior autonomia, autoconhecimento e nível educacional, as mulheres têm buscado tratamento para alívio dos sintomas relacionados à menopausa, buscando experienciá-los de maneira diferente".

Em 2000, cerca de 8,5% da população brasileira era composta por mulheres com mais de 50 anos. Em 2025, a projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é que esse número suba para 15% — o que representa mais de 33 milhões de brasileiras. Ou seja, há cada vez mais mulheres vivendo na pós-menopausa.

Sintomas da menopausa: alívio para além dos fogachos

A menopausa é o marco do final da vida reprodutiva, determinada após 12 meses de amenorreia (ausência de menstruação). Entre as brasileiras, a média de idade para seu início é aos 48 anos e ela acontece em duas fases: a perimenopausa, quando os sintomas começam a aparecer, e a pós-menopausa, o período que acontece após o evento. O conjunto desses termos, desde o início dos sintomas, também é conhecido como climatério.

Existem diveros sintomas relacionados a esses períodos, que podem aparecer anos antes do fim da menstruação e podem variar nas differentes fases. Eles incluem aspectos:

  • Cognitivos - como mudanças de humor, confusão mental e dificuldade de concentração;
  • Físicos - como queda de cabelo, dor nas articulações e osteoporose;
  • Urogenitais - como secura vaginal e incontinência por estresse;
  • Vasomotores - com ondas de calor ou fogachos e suores noturnos.

A endocrinologista Ana Priscila Soggia explica que não há uma lista fechada de sintomas e eles vêm sendo cada vez mais pesquisados, aumentando a necessidade de debater o tema:

“Está na hora de olhar de uma forma mais ampla para nossa saúde mental, cerebral, cardiovascular, óssea, cerebral. A gente não pode limitar o tratamento da menopausa aos fogachos, tem muitos outros pontos que precisam ser avaliados e acolhidos”.

Com ou sem hormônios: os tratamentos indicados para menopausa

As diretrizes médicas atuais indicam uma abordagem multidisciplinar para o acompanhamento do climatério, que pode considerar tratamentos medicamentosos ou não, explica a ginecologista Isabel Sorpreso. “Além disso, as sociedades nacionais e internacionais de ginecologia, de endocrinologia e de climatério preconizam que a terapêutica comportamental e integrativa também deve ser realizada, independentemente do tratamento hormonal ou não hormonal.”

“Eu faço um contraponto com a primeira menstruação, quando há uma transformação física e psicossocial da mulher. Ele se repete no último período menstrual, que denominamos menopausa", explica a médica. Portanto, mais do que decidir entre usar ou não um tratamento hormonal, é fundamental olhar para os hábitos.

É um novo momento de a mulher olhar para si, no sentido de prevenção e promoção de saúde também. Manutenção do peso, atividade física regular, cessação de hábitos relacionados a vícios e reduzir ultraprocessados são parte dessas orientações comportamentais”.

Observados esses pontos, a escolha do tipo de tratamento dependerá da intensidade dos sintomas e do histórico clínico da paciente, destaca a especialista. “A terapia hormonal, por exemplo, é indicada para alívio de sintomas moderados e intensos, que impactam na qualidade de vida diária, mas há outras alternativas também”.

Segundo Ana Priscila Soggia, o tratamento hormonal possibilita uma melhora sistêmica dos sintomas, o que é mais difícil de se alcançar com terapias não hormonais. “Quando a paciente não pode usar reposição, o tratamento muitas vezes será direcionado a um sintoma específico. Por exemplo, quando detectada a perda de massa óssea, será usado um medicamento para agir nessa frente”.

Ela adverte que o conceito de que os hormônios não são naturais seria um "pré-conceito", baseado em estudos antigos, de mais de 20 atrás, e que geram mais ansiedade do que respostas concretas.

“O papel do médico é oferecer informações para conscientizar a mulher, para que sua escolha não seja baseada em conceitos falsos ou estudos antigos. É preciso buscar tratamento atualizados. A reposição hormonal hoje é indicada pelas sociedades médicas, salvo em casos de contraindicação”, defende a endocrinologista.

Nesse sentido, o tratamento hormonal é contraindicado em mulheres com histórico de câncer de mama ou endométrio, doenças hepáticas graves, sangramentos vaginais não esclarecidos e doenças cardiovasculares agudas. Para esses casos, outras propostas são indicadas, como o uso de medicações que atuam em neurotransmissores, como a serotonina e noradrenalina, utilizados para alívios dos sintomas das ondas de calor e também das alteração de humor que acontecem nesta fase.

Hoje, via Sistema Único de Saúde, as mulheres têm acesso principalmente a terapias não hormonais. No âmbito das hormonais, apenas a reposição oral é oferecida, mas nem sempre disponível. Já o gel hormonal que hoje é disponibilizado tem ação apenas local para tratamento dos sintomas genitourinários, que são as queixas relacionadas à saúde íntima. “A oferta de terapêutica hormonal sistêmica via oral está em revisão no Ministério da Saúde. Isso porque já existem opções mais modernas por via transdérmica, como gel e adesivo, que podem substituir essa opção. Porém, atualmente elas são apenas vendidas em farmácia”, explica a ginecologista Isabel Sorpreso.

E os tratamentos naturais e fitoterápicos?

A busca por tratamentos não medicamentosos também tem crescido na internet, com destaque para produtos naturais e fitoterápicos. Contudo, ambas as médicas alertam que eles não são inofensivos e podem oferecer efeitos colaterais ou adversos.

“Mesmo sendo fitoterápicos, muitos medicamentos podem conter os chamados fitoestrogênios, pois são feitos à base de são plantas que em sua formulação ocupam o receptor de estrogênio. Eles podem sim aliviar os sintomas, mas têm a mesma contraindicação de uma terapia hormonal clássica. E, por vezes, a paciente não tem essa consciência”, pondera Sorpreso.

Ainda assim, qualquer tratamento alternativo que se baseie em uso de fitoterápicos ou mudanças bruscas na alimentação precisa ser acompanhado por um profissional. “Tudo o que foge a uma alimentação equilibrada também deve ser analisado com cuidado”, alerta Soggia.

Impactos no sono

Um dos sintomas mais subdiagnosticados do período que envolve a menopausa é a insônia. Segundo Helena Hachul, chefe do Setor Sono na Mulher na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pesquisadora do Instituto do Sono, as alterações hormonais dessa fase podem levar à insônia e à apneia. “Além disso, os fogachos, a bexiga mais flácida, as alterações psicológicas e o aumento de peso também contribuem para um sono fragmentado e não reparador.”

Nesse sentido, ela diz que o tratamento depende de cada caso. “Primeiro, fazemos uma avaliação clínica completa para identificar outras condições que possam afetar o sono. Depois, analisamos a rotina, alimentação, atividade física e fatores psicossociais. A reposição hormonal é uma grande ferramenta, mas não resolve tudo sozinha. É preciso associar bons hábitos, como dieta equilibrada, hidratação adequada, rotina de sono regrada e atividade física”.

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