São Paulo, 25/11/2025 - Uma nova pesquisa brasileira mostra que variáveis climáticas, como temperatura e umidade, podem influenciar estados fisiológicos e psicológicos, potencialmente exacerbando transtornos mentais. A relação foi estabelecida a partir da análise das taxas de internação por esquizofrenia no município de Porto Alegre (RS) entre 2013 e 2023.
O estudo foi conduzido pelo Núcleo de Pesquisa em Mudanças Climáticas e Saúde Única, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), que reúne pesquisadores de neurociência, psiquiatria, climatologia, epidemiologia e saúde pública em torno dos impactos do clima em doenças infecto-contagiosas,
crônicas não transmissíveis e também na
saúde mental da população.
Segundo Mellanie Fontes-Dutra, biomédica, professora da Unisinos e uma das autoras da publicação, é a primeira vez que a relação entre variáveis climáticas e internações por esquizofrenia foi estabelecida com dados amplos de um município brasileiro. "O levantamento traz implicações significativas para saúde pública e para a resiliência diante da aceleração das mudanças climáticas e seus impactos sobre a saúde mental."
Entenda a pesquisa
Das 9.200 hospitalizações registradas ao longo de 11 anos, as variáveis climáticas mais relevantes identificadas pelos pesquisadores foram exposição solar, temperatura máxima e evaporação, com padrão consistente durante todo o período analisado. As taxas foram calculadas com base na população da cidade e em dados do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) e do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET).
"Durante o período analisado, identificamos um padrão sazonal estatisticamente significativo, com maior número de internações nos meses de outono e inverno e menor número no verão. As implicações práticas são diretas: o estudo permite que gestores de saúde pública identifiquem períodos de maior demanda psiquiátrica e reorganizem recursos assistenciais de forma preventiva, intensificando o monitoramento e suporte a pacientes com esquizofrenia durante os meses mais críticos", explica Fontes-Dutra.
Ela ressalta que os resultados são "especialmente relevantes para outras cidades com características climáticas semelhantes no sul do Brasil e em contextos urbanos comparáveis". "Isso sugere que estratégias de adaptação e planejamento em saúde mental devem considerar variabilidade sazonal e fatores ambientais como componentes do cuidado integral às pessoas com esquizofrenia."
Além disso, destaca que "os achados ganham relevância no contexto das mudanças climáticas", com potencial aumento de eventos climáticos extremos e alterações nos padrões sazonais tradicionais. "Os resultados podem subsidiar políticas específicas para cuidado de saúde mental, como antecipar necessidade de leitos psiquiátricos, reforçar acompanhamento ambulatorial no outono e inverno, integrar dados climáticos ao monitoramento de saúde mental e desenvolver sistemas de alerta baseados em previsões climáticas".
Contudo, pondera que a pesquisa não tem capacidade para atribuir que as variáveis climáticas estão causando tais hospitalizações, uma vez que múltiplos fatores podem atuar sobre isso. "É importante ressaltar que, por se tratar de um estudo ecológico de séries temporais em nível municipal, os resultados indicam associações entre clima e hospitalizações, mas não estabelecem relação causal direta", completa.