Foto: Divulgação/Anbima
Por Fabiana Holtz
redacao@viva.com.brSão Paulo, 17/08/2025 – Economista por formação, Marcelo Billi, superintendente de Sustentabilidade, Inovação e Educação da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) se encontrou na área de comunicação ao cobrir o mercado de finanças como jornalista. Graduado na Unicamp, com especialização em Finanças pelo Insper e com MBA Executivo da FGV, Billi segue firme desde 2010 em seu propósito de consolidar a entidade como referência em conteúdo de qualidade no âmbito da educação financeira.
Além de contribuir para a criação e expansão de cursos, o superintendente e sua equipe também atuam na melhoria da comunicação dos bancos com seus clientes por intermédio de parcerias. Com mais de uma década de experiência no assunto, Billi reconhece que a educação financeira tem o poder real de transformar vidas.
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Em suas andanças pelo país, Billi também identificou o potencial inegável dos jovens como facilitadores do ambiente digital e multiplicadores de informação para as gerações mais velhas superarem o medo de investir.
Confiante no poder dos mais jovens como agentes da mudança, a associação lançou em junho uma campanha de comunicação com o objetivo incentivar o investimento em Fundos de Investimentos entre os brasileiros. Com expectativa de duração de três anos, o projeto tem como público-alvo os jovens das gerações Millennials e Z, das classes A, B e C, com foco especial na classe C.
O trabalho, acrescenta ele, é desafiador, mas a recompensa são exemplos diários de impactos positivos dessa caminhada na vida de muitas pessoas. Leia mais na entrevista a seguir:
Como tem sido trabalhar no desenvolvimento de projetos voltados para a educação financeira na Anbima ?
Desafiador e ao mesmo tempo gratificante. Dentro da Anbima, pensando na área de educação financeira temos três grandes vertentes que foram criadas e elas se comunicam. Começamos a fazer muita pesquisa para entender o comportamento do brasileiro na hora de lidar com o dinheiro. Isso já tem mais ou menos uns 10 anos. Nesse contexto nasceu o Raio-X do investidor, que está na oitava edição.
Nessa época, a equipe era integrada por mais ou menos umas seis pessoas nessa área. Hoje esse time dobrou e somos em 12 profissionais. Foi preciso investir muito em pesquisa.
O objetivo principal desse esforço sempre foi entender por que a pessoa não investe em outros produtos como fundos ou o que a impede de sair da poupança. Qual é a relação do brasileiro comum com os profissionais do mercado e o que é possível fazer para que isso melhore?
As respostas do público a esse tipo de questionamento nos possibilitou fazer ajustes nos programas educacionais da Anbima. Por outro lado, também foi útil para municiar nossos associados (bancos e as corretoras) com essas informações. Eles também nos procuram para entender qual seria a melhor abordagem para falar de seus produtos e saber o que a pessoa física espera, seu grau de conhecimento sobre determinado tema. A primeira barreira que se encontra nesse caso é a compreensão do que está sendo dito.
Passamos muito tempo debatendo os resultados das pesquisas com os associados, propondo melhoras no atendimento, na argumentação, na forma de se comunicar.
A Anbima trabalha com muitas parcerias também, certo?
Sim. No caso da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), por exemplo, fizemos uma pesquisa solicitada por eles e diante dos resultados uma nova conduta foi adotada.
A CVM nos pediu ajuda para entender qual o grau de percepção, de entendimento, de uma pessoa física no varejo quando ela vai participar de uma oferta. Fizemos uma pesquisa em profundidade para a autarquia entender o que era compreensível. E o mais importante desse trabalho foi que as regras para varejo que a CVM colocou em prática foram baseadas nos resultados dessas pesquisas.
Em um trabalho mais recente analisamos os documentos que os investidores recebem sobre investimento e se percebeu que diversas expressões que consideramos comuns e que são importantes para entender o contexto não são compreendidas pelo público mais leigo. Aqui a tarefa é simplificar o vocabulário, buscar palavras que podem ser substituídas para deixar o texto mais claro nas regras, nos documentos de apresentação.
Vejo essa rotina como uma grande oportunidade de gerar dados, mais informação, insights.
E todo esse trabalho na frente de pesquisa acaba retroalimentando os programas de educação financeira?
Exato. Com esses resultados a gente usa para estruturar nossos programas de educação junto com o mercado e com os investidores. Aplicamos dentro das universidades o que a gente descobre em campo, fazendo pesquisas e conversando com o mercado. O problema com as plataformas de apostas (as bets), por exemplo. Identificamos a questão em conversas com o público para entender o perfil do investidor brasileiro.
A partir disso pensamos em um jeito de introduzir o assunto nos programas das universidades de uma forma simples e direta que ajudesse os estudantes a não caírem nessa enrascada.
Outro passo importante nessa área foi dado no nível básico de ensino no início de agosto, com o anúncio do Banco Central (BC), em conjunto com a Anbima, a CVM e o Sebrae da ampliação do programa Aprender Valor, que leva educação financeira às escolas.
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Lançado pelo BC em 2022, originalmente o programa era voltado somente para alunos do Ensino Fundamental. A partir de 2026, a plataforma será expandida para estudantes e docentes da educação em nível Médio. Haverá cursos em formato presencial, on-line e híbrido.
Somado a isso tem os programas de certificação de profissionais, certo?
Temos um programa detalhado que concentra tudo que pode cair eventualmente em uma prova de certificação, no exame. Em resumo, temos as nossas pesquisas, que alimentam os programas de formação, de certificação, além dos segmentos de educação e saúde financeira.
Estar nessa área é muito prazeroso e compensador. Eu nunca achei que iria sentar em uma mesa com o MEC (Ministério da Educação) e discutir várias iniciativas com integrantes do terceiro setor. Trabalhar com escolas, com grupo de mulheres ou mais vulneráveis com o objetivo de formar as pessoas é muito rico e me inspira.
Dentro dessas iniciativas, quais gostaria de destacar?
Desenhamos um programa de educação financeira para as universidades na década passada. A gente já tinha parceria com o Insper, com a FGV, então percebemos que era preciso levar a educação financeira para as universidades que atendem a classe C e D.
Encontramos receptividade na FMU e fizemos um piloto com uma turma de enfermagem. Entrevistamos os alunos para entender quais eram as necessidades. Inicialmente a ideia era ensinar a investir, mas descobrimos que eles não sabiam o básico. Começamos então com a ideia de ‘Como Investir em você’. Esse curso introdutório se chama assim até hoje.
Vimos que não adiantava falar para os alunos simplesmente começarem a investir se eles estavam no primeiro emprego ou ainda nem tinham entrado no mercado de trabalho. Nesse sentido, pesquisar e conversar com o público-alvo é essencial.
Esse é o principal programa da Anbima no campo da educação?
Sim. A partir dele construímos um programa de Educação à Distância (EaD). Inicialmente, com a ajuda dos alunos, ouvindo suas necessidades, construímos a base desse programa e entregamos para a faculdade. Nessa etapa os custos são da Anbima. Com o material em mãos, a faculdade inclui o curso em sua plataforma e dá créditos para os alunos que o concluírem. Funciona como uma matéria optativa.
A oferta desse curso foi se expandindo. Tanto que há uns três anos, percebemos que nunca tínhamos medido o impacto dele. Conversamos então com o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS).
O IDIS é uma instituição independente do setor privado que calcula o impacto de programas sociais. Eles fizeram a avaliação e são certificados para mensurar no Brasil o que é conhecido como retorno social sobre investimento (SROI, na sigla em inglês).
Até então eu só conhecia o indicador de Retorno sobre o Investimento (ROI), muito comum no balanço das empresas. O SROI eu não conhecia. Isso nos mostrou que é possível estimar o impacto do programa na vida dos alunos. Os resultados da avaliação do SROI indicam que a cada R$ 1 investido no 'Como Investir em Você ' são criados R$ 2,16 em valor social. Ou seja, o impacto social gerado é mais do que o dobro do valor investido. O levantamento considera dados de 2018 ao primeiro semestre de 2023.
Para começar foi preciso rastrear os alunos que participaram do programa ao longo de todos esses anos, o que não foi fácil. O IDIS agora segue com sua metodologia para ir acompanhando a evolução de nossos alunos ao longo do tempo. Com isso, vamos conseguir saber se o programa está melhorando ou precisa de ajustes.
Você diria que o segredo para alcançar resultados concretos na educação financeira é a escuta?
Eu diria que sim. Seria muita arrogância achar que entendemos mais a vida da pessoa do que ela mesma e simplesmente estabelecer novas regras sobre sua vida financeira. Elas sabem a realidade delas e que às vezes estão tomando uma decisão confusa. O segredo de uma educação financeira efetiva está em construir junto, conversar, entender.
São passinhos de formiguinha. Foram dez anos pesquisando e aprimorando o programa. Demorou, mas a gente hoje tem 600 universidades dentro dele.
Existe alguma receita básica para não se endividar?
Todo mundo corre o risco de ter esse problema: rico, pobre, classe média e até economista. Eu já fui um endividado.
Nossa nova fronteira na educação financeira é falar de saúde financeira no local de trabalho. A febre das apostas já está tendo impacto nas empresas e precisamos seguir investigando onde está faltando essa discussão sobre dinheiro e saúde mental.
Produzimos recentemente um estudo com um levantamento sobre as iniciativas de educação financeira realizadas em todo o Brasil. Nesse relatório descobrimos que embora o número de iniciativas tenha diminuído, seu alcance geográfico e profissionalização do trabalho cresceu.
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