São Paulo, 10/11/2025 - Na última reunião do
Comitê de Política Econômica (Copom), o Banco Central deixou claro que a taxa básica de juros, a Selic, ainda deve continuar em 15% ao ano por algum tempo. Se juros elevados não são uma boa notícia para quem precisa pegar dinheiro emprestado ou fazer financiamento, quem consegue guardar uma parte do dinheiro para investir, pode aproveitar as oportunidades da renda fixa, sem se expor a grandes riscos.
Para ajudar você a extrair o melhor desse momento para investir, o Viva conversou com Guilherme Almeida, head de renda fixa da Suno Research, Rafaela de Sá, planejadora financeira CFP pela Planejar, e Rodolfo Canarin Benedet, consultor de investimentos do Sistema Ailos, que reúne várias cooperativas de crédito.
Onde estão as melhores oportunidades?
Neste cenário de juros ainda gordos, a renda fixa como um todo se beneficia, mas o maior destaque vai para os títulos pós-fixados. A remuneração deles é atrelada ao CDI, indicador que acompanha o desempenho da taxa Selic.
“Eles devem ser o pilar da carteira, especialmente para quem busca liquidez [facilidade de movimentar o dinheiro] e preservação de capital”, recomenda Rafaela. “Juros elevados permitem capturar retornos atrativos com baixo risco, e a melhor forma de aproveitar isso é diversificando dentro de produtos mais conservadores.”
É verdade que os juros não permanecerão altos para sempre, mas o investidor ainda tem um bom horizonte de tempo para surfar essa onda. “Embora o consenso de mercado (o boletim Focus, do Banco Central) sugira redução da Selic para os próximos anos, ainda temos um cenário favorável para aplicações pós-fixadas em curto e médio prazo”, observa Benedet. “O próprio
Tesouro Selic, que é o papel mais seguro no mercado brasileiro, incorpora essas características de bons retornos com baixo risco.”
O risco é sempre baixo?
Não é bem assim. Juros altos significam fartura no bolso do investidor, mas é preciso ver também o outro lado da história: o de quem está emprestando o dinheiro ao investidor. Quem emite os papéis está assumindo um compromisso financeiro que, a juros altos, tem sido cada vez mais caro. Por isso, é preciso ter cuidado para escolher de quem comprar esses papéis, especialmente no caso do crédito privado, em que você está emprestando para uma empresa.
“Tem que avaliar bem a situação financeira do emissor do título, porque o risco é real. E o risco aqui é de não receber o dinheiro de volta, porque a empresa pode entrar em um eventual default, ou seja, dar um calote no investidor”, alerta Almeida.
No caso dos títulos emitidos por bancos, como CDBs, LCIs e LCAs, existe a proteção do
Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que cobre até R$ 250 mil por CPF em cada instituição financeira. Então, caso um banco venha a quebrar, quem investiu nele será indenizado nesse limite. Papéis emitidos por empresas, como CRIs, CRAs e debêntures, não contam com essa proteção (e, justamente pelo risco aumentado, pagam taxas maiores).
Já os títulos públicos, conhecidos como Tesouro Direto, são os mais seguros do mercado: na pior das hipóteses, o Tesouro Nacional pode recorrer à emissão de moeda para honrar com os compromissos junto aos investidores.
O que seriam taxas consideradas boas hoje?
Lembre-se de que o retorno maior não vem de graça: para receber mais, o investidor precisa ou aceitar mais risco, ou concordar em deixar o dinheiro parado por um prazo mais longo. Assim, um título de crédito privado, em que o risco de emprestar é maior, deve remunerar melhor que um papel do governo, que em tese é livre de risco.
“Em CDBs pós-fixados, bancos de bom porte já entregam algo
entre 100% e 108% do CDI com liquidez, enquanto papéis mais longos podem oferecer um pouco mais, dependendo do emissor e do prazo. Nos prefixados, taxas
entre 12% e 13% ao ano são atrativas, diante da expectativa de corte da Selic no futuro. Já nos títulos atrelados ao IPCA, papéis que pagam a variação da inflação, mais juros reais
acima de 6% ao ano, são excelentes oportunidades para quem pensa no longo prazo e busca manter o poder de compra do patrimônio”, enumera Rafaela de Sá.
Mais do que buscar sempre a taxa mais alta, a economista afirma que o investidor deve ter o cuidado de construir uma carteira diversificada, que seja capaz de atravessar diferentes cenários econômicos.
“Títulos públicos são a base da segurança, bancos maiores podem oferecer prêmios [retornos] competitivos com bom nível de proteção e o crédito privado [emprestar a empresas] pode complementar a carteira, entregando rentabilidade adicional para quem aceita um pouco mais de risco. Diversificação é fundamental”, defende a planejadora financeira.
Título pós, pré ou IPCA: como compor a carteira?
Os três tipos de papéis têm utilidades diferentes e podem servir para a composição de uma carteira equilibrada. De acordo com o consultor de investimentos do Sistema Ailos, tudo dependerá de seus objetivos financeiros e do tempo em que você estiver disposto a manter os recursos investidos.
“Para um horizonte de curto prazo, os papéis atrelados ao CDI [pós-fixados] terão maior previsibilidade de retorno. Já no médio prazo, em que o cenário é de queda da Selic, os papéis prefixados serão mais atrativos devido à marcação a mercado [falaremos mais sobre esse assunto mais adiante]. Para o longo prazo, os papéis atrelados ao IPCA protegem o poder de compra dos recursos investidos em qualquer cenário”, resume Benedet.
Mais adiante neste texto, você encontrará explicações mais detalhadas sobre as utilidades de cada um desses três tipos de títulos de investimentos.
Onde investir a minha reserva de emergência?
Para esse objetivo, duas características são essenciais: liquidez e segurança. Em outras palavras, o dinheiro deve estar facilmente acessível no caso de algum imprevisto, e não deve sofrer grandes solavancos por conta de variações do mercado. Por isso, a recomendação dos três especialistas é a mesma: títulos pós-fixados.
“Aqui, o investidor não precisa complicar demais. O Tesouro Selic tem previsibilidade, retorno e o menor risco do mercado”, enumera Almeida. Outra possibilidade são os CDBs pós-fixados com liquidez diária, que pagam taxas um pouco menores que os de prazos mais longos, mas oferecem a possibilidade de resgate imediato.
“Nesse caso, vale sim aceitar um juro marginalmente menor em troca da garantia de acesso ao dinheiro a qualquer momento, afinal, reserva não é sobre maximizar retorno e sim evitar risco e preservar capital. A rentabilidade já está elevada pelo cenário de juros, então a prioridade deve ser liquidez e simplicidade”, ensina a especialista da Planejar.
Como investir em prefixados?
Nesse tipo de papel, a taxa de juros é definida no momento da aplicação e acompanha o investimento até o fim. Se você encontrou um papel com uma taxa interessante e sabe que não precisará mexer no dinheiro antes do vencimento, esta pode ser uma ótima opção: terminado o prazo da aplicação, você receberá o que foi combinado, sem surpresas. A previsibilidade é o maior atrativo do prefixado.
Até a data de vencimento, porém, o valor da sua aplicação vai sofrer grandes flutuações, no movimento conhecido como marcação a mercado. Ele é diretamente influenciado pelas oscilações da taxa de juros. Se precisar resgatar o dinheiro antes do fim do prazo, você não receberá os juros combinados no início; em vez disso, receberá o valor de mercado daquele papel, que poderá ser maior ou até bem menor do que o que você pagou – gerando lucro ou prejuízo, conforme o caso.
Como funciona a marcação a mercado?
Vamos supor que você comprou, em novembro de 2025, com a taxa Selic em 15% ao ano, um prefixado que paga 13% ao ano durante 5 anos. Na metade de 2027, você precisa resgatar seu dinheiro. Só que nesse período a taxa básica de juros foi sendo reduzida pelo governo e, no momento em que você quer vender seu papel, a Selic está em 10% e o mercado vende prefixados entre 9% e 11% ao ano. Seu papel antigo, que paga 13% ao ano, está remunerando acima da média do mercado, por isso você poderá vendê-lo com ágio, embolsando mais do que se tivesse carregado o título até o vencimento.
Por outro lado, se em 2027 tiver havido uma grande piora nos indicadores econômicos (uma grande crise e a disparada da inflação, por exemplo) e o governo tiver subido a Selic para 20%, provavelmente os prefixados disponíveis no mercado vão pagar mais que a taxa de 13% do papel que você tem na mão. Ninguém vai querer comprá-lo de você – não pelo valor “certo”. Você terá que vendê-lo com deságio, ou seja, mais barato do que pagou ao fazer o investimento, sofrendo um prejuízo.
Mas lembre-se: nada do que foi descrito nas duas simulações acontece se você ficar com o papel até o vencimento! Nesse caso, você recebe os juros combinados, sem surpresas.
Como a expectativa do mercado é de que a taxa Selic comece a cair a partir do ano que vem, os prefixados fazem sentido tanto para o investidor mais conservador como para aquele mais experiente e arrojado. Para o conservador, que vai carregar o papel até o vencimento, esta é uma boa chance de “travar” o patrimônio a uma taxa de juros que, pelo que tudo indica, será mais difícil encontrar no futuro. Já para o mais experiente, o prefixado traz a chance de obter bons lucros, com a marcação a mercado, se ele souber sair do papel na hora certa, quando os juros estiverem mais baixos.
Não há, porém, nenhuma garantia de que as taxas de juros efetivamente vão cair dentro das projeções atuais do mercado, o que significa que a estratégia dos prefixados sempre traz algum risco.
“Tudo depende da necessidade de acessar o recurso por parte do investidor. Supondo que o pior cenário se confirme, e não seja vantajoso revender o papel antecipadamente, o investidor deve refletir: eu consigo carregar o título até o vencimento? Em caso positivo, ele pode comprar prefixados, e até de prazos mais longos, como 5 anos. Mas se ele não tiver outros recursos para acessar em caso de emergência e precisar resgatar o prefixado muito antes do vencimento, vai amargar um grande prejuízo. Nesse caso, melhor ir com papéis mais curtos, que se possa carregar até o final”, recomenda o especialista da Suno.
Rafaela, da Planejar, é cautelosa. “Os títulos prefixados podem fazer sentido neste momento para travar um patamar de juros historicamente alto, mas com moderação. Prazos entre 2 e 4 anos tendem a oferecer bom equilíbrio entre retorno e volatilidade. Títulos muito longos carregam um risco maior de marcação a mercado, e quem precisar vender antes pode enfrentar oscilações desconfortáveis. Ou seja, prefixado é interessante, mas dentro de uma estratégia e apenas com o capital que pode permanecer investido até o vencimento”, aconselha.
E os títulos atrelados ao IPCA, quanto investir neles?
A proposta é interessante: um papel que vai repor a variação do IPCA (índice oficial de inflação) no período, mais uma taxa de juros fixa. Ou seja, o investidor tem a garantia de que o dinheiro dele vai se manter protegido dos efeitos da inflação, sem perder poder de compra, e ainda ganhar mais um pouco, por conta do cupom de juros.
Para recursos que ficarão aplicados por um prazo bem longo – uma poupança para a aposentadoria, por exemplo – esses papéis são uma parte fundamental de qualquer boa estratégia de renda fixa. Mas os especialistas ouvidos pelo Viva dizem que o investidor comum deve resistir à tentação de concentrar todas as suas fichas nesse tipo de produto.
“Eles cumprem um papel importante, especialmente para objetivos de longo prazo e proteção real de patrimônio. No entanto, a ideia não é concentrar toda a carteira neles. Uma fatia equilibrada já garante blindagem contra oscilações do IPCA”, pondera Rafaela.
“O Brasil ainda convive com incertezas inflacionárias, mas há espaço para algum arrefecimento no médio prazo. Nesse cenário, ter uma parte da carteira em pós-fixados continua sendo essencial, pois isso se beneficia de uma taxa Selic ainda elevada e dá flexibilidade para rebalancear ao longo do ciclo.”
Outra razão para não comprar apenas títulos atrelados ao IPCA é que, assim como ocorre com os prefixados, eles também sofrem marcação a mercado. Ou seja, esses papéis também estão sujeitos a variações bruscas em seu valor de mercado se forem resgatados antes do vencimento, podendo levar o investidor a ter prejuízos.
“Para quem vai carregar o investimento até o vencimento, o título IPCA é um verdadeiro coringa na carteira, pois preserva o poder de compra e entrega um juro real [acima da inflação] bastante atrativo. Mas não recomendamos colocar ali um valor que represente uma parcela muito grande do patrimônio. Se, no meio do caminho, surgirem outros objetivos financeiros que precisem ser atendidos, ninguém garante que o resgate antecipado do papel IPCA será favorável”, alerta Almeida.
O ideal, explica o especialista da Suno, é comprar papéis IPCA que possam ser mantidos até o vencimento, dentro de uma carteira de investimentos diversificada, em que também exista uma exposição a títulos pós-fixados. “É no pós-fixado, principalmente Tesouro Selic, que o investidor encontrará a flexibilidade necessária, seja em uma situação de emergência, seja como reserva de oportunidade para aproveitar outras chances de investimento que possam surgir”, pontua.