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Tema do Enem 2025 provoca reflexões sobre envelhecimento e futuro do Brasil

Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

'Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira' foi o tema escolhido para a redação do Enem 2025 - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
'Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira' foi o tema escolhido para a redação do Enem 2025

Por Bianca Bibiano e Paula Bulka

redacao@viva.com.br
Publicado em 10/11/2025, às 16h38
São Paulo, 10/11/2025 - O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2025 - 'Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira' - foi considerado uma boa escolha tanto por professores especialistas na prova quanto por representantes de organizações de saúde, cidadania e direitos humanos.
Do ponto de vista da educação, especialistas consideraram o assunto atual e acessível, abrindo espaço para múltiplas interpretações, o que reforçou o papel do exame como instrumento de reflexão social.
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Segundo a professora de redação e assessora pedagógica da Rede Positivo, Candice Almeida, o tema já era aguardado há alguns anos. "Em 2009, a prova do Enem que vazou trazia o debate sobre o envelhecimento da população. Desde então, esperávamos que o assunto voltasse. É um tema atual e acessível. A mudança de ‘desafios’ para ‘perspectivas’ facilita a abordagem, pois permite discutir o assunto sob diferentes ângulos - social, econômico, político ou de políticas públicas", destacou.
Para o professor Gabriel Félix, do Curso Positivo, a escolha valorizou o pensamento crítico dos candidatos. "Quem se preparou apenas decorando estruturas pode ter sentido dificuldade. Já os alunos que aprenderam a interpretar e analisar a proposta de forma autônoma certamente se saíram melhor", observou.

Idadismo, políticas públicas e consciência coletiva

Do ponto de vista de cidadania, o Secretário Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Alexandre da Silva, considerou a proposta "um convite à reflexão sobre as diversas formas de envelhecer no Brasil".
Em nota ao Viva, ele afirmou que "falar sobre o envelhecimento da cidade brasileira é falar das mais diversas velhices, da diversidade, da potência, da cultura e dos saberes e práticas que fazem do nosso País um lugar maravilhoso. Mas ainda enfrentamos desigualdades".
E completou: "Ter no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania uma secretaria que atua nessa pauta é justamente garantir que esses problemas sejam resolvidos, que o idadismo seja mitigado e que a gente possa cada vez mais viver numa sociedade mais digna para que que todas as pessoas possam envelhecer."
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A fisioterapeuta Isabela Azevedo Trindade, presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), diz que a organização também celebrou a escolha.
"O Brasil envelhece em ritmo acelerado. Em 2035 teremos mais idosos do que crianças, e precisamos estar preparados para a mudança, que engloba muitos fatores de saúde, economia e trabalho".
Nesse sentido, ela disse que a mudança populacional causada pelo rápido envelhecimento impõe a busca por políticas públicas, profissionais qualificados, e uma nova consciência coletiva que valorize essa fase buscando independência e autonomia.
"É importante que os jovens tenham essa consciência coletiva, que a gente consegue também promovendo a intergeneracionalidade, porque trazendo essa temática à tona eles terão mais consciência do que esperar e de como a gente pode promover um envelhecimento melhor. Falar da perspectiva do envelhecimento na sociedade é falar do futuro e do que precisa mudar."
O professor Alysson Franco Abrantes, que leciona Língua Portuguesa e Literatura nos colégios Start Anglo Bilingual School e STG, lembra que o envelhecimento no Brasil acontece de forma mais acelerada do que em países desenvolvidos, o que exige adaptações urgentes em várias áreas.
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"Entre os principais desafios estão o etarismo - o preconceito contra pessoas em razão da idade, que ainda se manifesta fortemente no mercado de trabalho - e as demandas crescentes por uma saúde pública mais preparada para doenças crônicas e degenerativas, garantindo qualidade de vida e envelhecimento ativo", pontua.
Ele ressalta ainda há impactos diretos na economia e na previdência, já que o aumento da população idosa em relação à jovem pressiona o sistema e amplia a razão de dependência. "Além disso, o abandono e a solidão de muitos idosos revelam a carência de políticas públicas eficazes de acolhimento e integração social. É fundamental que o País olhe para o envelhecimento como um processo coletivo e não apenas individual, com políticas que garantam dignidade e participação para todas as gerações", conclui.
Para o professor Ademar Celedônio, diretor de ensino e inovações do SAS Educação, a proposta estimula o debate sobre a necessidade de reposicionar a terceira idade como uma etapa ativa da cidadania, com políticas públicas e mudanças culturais que valorizem o envelhecimento digno e produtivo.
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"A discussão envolve questões como a transição demográfica acelerada, a inclusão digital e o combate ao idadismo, além de ressaltar a importância do aprendizado contínuo. As intervenções esperadas incluem ações intersetoriais, requalificação profissional para o público 50+ e campanhas de conscientização nacional. A escolha pelo tema demonstra, mais uma vez, o papel do Enem como instrumento de reflexão social."

Saúde e neurociência

Ao comentar o exame, o neurocientista e psicólogo Rafael Nunes ponderou também que o envelhecimento deixou de ser apenas uma questão demográfica e tornou-se um desafio de saúde pública do ponto de vista neurobiológico e emocional. 
"O tema da redação do Enem 2025 evidencia um País que envelhece rapidamente, mas ainda cultiva uma mentalidade jovem-dependente. Essa questão nos mostra que os desafios geracionais não nascem apenas de valores opostos, mas de cérebros moldados por contextos diferentes", observa. 
"Gerações mais antigas, formadas na escassez de estímulos e no esforço prolongado, desenvolveram atenção concentrada e paciência. Já os jovens, criados na era digital, têm atenção fragmentada e alta necessidade de recompensa imediata. O resultado são ritmos cognitivos distintos e, muitas vezes, incomunicáveis."
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Ele explica ainda essas diferenças ativam mecanismos automáticos de defesa no cérebro. "A amígdala, que detecta ameaças, reage primeiro ao 'diferente', antes que o córtex pré-frontal, responsável pela empatia e pelo raciocínio, possa intervir. É nesse curto-circuito que o etarismo se instala. Os estereótipos como 'idosos são lentos' ou 'jovens são imaturos' tornam-se precursores de exclusão inconsciente. O problema é que o preconceito não é apenas simbólico, ele produz efeitos biológicos reais".
O especialista destaca que a rejeição social acaba se refletindo na vida cotidiana, ativando circuitos de estresse e liberação crônica de cortisol, o que eleva o risco de depressão, inflamação, insônia e declínio cognitivo. Ele cita que pesquisas da Universidade Yale mostram que idosos expostos a visões negativas sobre a idade vivem, em média, 7,5 anos a menos do que aqueles que percebem o envelhecer de modo positivo.
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Para evitar esse encaminhamento, Nunes diz que promover o diálogo entre gerações não é apenas um "gesto ético, mas uma estratégia de saúde pública".
"Convivência, escuta e aprendizado mútuo reduzem a ativação da amígdala e fortalecem áreas cerebrais ligadas à empatia e à cognição social, um processo que podemos chamar de neuroplasticidade relacional. Envelhecer é um privilégio biológico, mas também um desafio cultural. Se aprendermos a transformar o tempo em ponte e não em muro, viver mais significará também viver melhor", completa.

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