60% dos casos de demência no Brasil poderiam ser evitados, diz pesquisa

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Falta de atividade física é um dos 14 fatores de risco modificáveis apontados em pesquisa internacional sobre demência - Envato
Falta de atividade física é um dos 14 fatores de risco modificáveis apontados em pesquisa internacional sobre demência
Por Bianca Bibiano bianca.bibiano@viva.com.br

Publicado em 12/09/2025, às 12h39

São Paulo, 12/09/2025 - Uma pesquisa lançada no início deste mês no periódico internacional The Lancet mostra que 59,5% dos casos de demência no Brasil poderiam ser potencialmente evitados com mudanças relacionadas a 14 fatores de risco. Os três principais fatores para demência identificados no País foram: menor nível educacional no início da vida, perda de visão no final da vida e depressão na vida adulta (veja abaixo a lista completa).
A demência é uma síndrome clínica caracterizada por declínio cognitivo e alterações comportamentais, podendo se apresentar de formas distintas, como Alzheimer, demência vascular e outros quadros neurodegenerativos. Segundo a pesquisa, estima-se que sua prevalência aumente de 57,4 milhões de indivíduos em 2019 para 152,8 milhões de indivíduos em 2050, com a projeção de se tornar uma das principais causas de incapacidade global até 2025. No Brasil, estima-se que 1,7 milhão de pessoas vivam com essa condição.
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Conheça os 14 fatores de risco previníveis para demência 

Até 2020, a comissão The Lancet de prevenção, intervenção e cuidados para prevenção de demência considerava apenas 12 fatores de risco modificáveis atrelados à demência. Em 2024, a perda de visão não tratada e o colesterol alto (LDL) foram adicionados à lista.
Com a revisão, esses 14 fatores passaram a ser vistos como responsáveis por até 45% dos casos de demência, uma situação que poderia ser evitada com mudanças sociais e individuais. Os dados globais, contudo, privilegiavam uma amostra de países de alta renda. A análise brasileira lançada este mês é a primeira a trazer uma perspectiva a partir da realidade da América Latina. 
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Para refletir o período da vida em que as evidências das associações entre cada fator de risco e a demência eram mais fortes, os fatores foram organizados em três principais momentos: início da vida, vida adulta e velhice.
Dessa forma, apresentar um menor nível educacional, com menos de oito anos de escolaridade, foi considerado um fator modificável ligado ao início de vida, enquanto depressão, perda auditiva, colesterol alto, lesão cerebral traumática, inatividade física, diabetes, tabagismo, hipertensão, obesidade e consumo excessivo de álcool foram considerados fatores da vida adulta. Já isolamento social, poluição do ar e perda da visão não tratada foram classificados como fatores mais ligados à velhice. Veja detalhes na tabela a seguir, traduzida a partir do estudo:

Disparidades socioeconômicas contribuem para demência

Para analisar o impacto da demência no Brasil, os pesquisadores consideraram dados coletados entre 2019 e 2021 de uma amostra representativa com 9.949 participantes com idade de 50 anos ou mais, com recortes por sexo, raça e região geográfica. Com isso, oferecem novas percepções sobre como as estratégias de prevenção da demência podem ser adaptadas para diferentes subgrupos da população.
A maioria dos fatores de risco teve prevalência maior do que as estimativas globais. Por exemplo, o menor nível educacional (9,5% ante 4,4% em nível mundial) e a depressão (6,3% ante 3,0%) no Brasil foram mais altos do que as médias globais relatadas pela Comissão Lancet de 2024.
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Segundo os autores, que incluem pesquisadores brasileiros e de outras nacionalidades, esses dados destacam como as disparidades socioeconômicas e o acesso inadequado à educação e ao cuidado com a saúde mental podem contribuir para o risco de demência. Por isso, defendem a necessidade de políticas públicas que promovam a saúde cardiovascular, o bem-estar mental e a mudança no estilo de vida.
No que diz respeito à perda de visão, o estudo diz que esse fator não tratado no Brasil é muito mais prevalente (9,0%) em comparação com a estimativa global (2,2%), refletindo lacunas sistêmicas no cuidado oftalmológico, especialmente em áreas carentes.
"A história do Brasil de acesso desigual à educação formal, especialmente entre as pessoas mais velhas, exacerba a vulnerabilidade ao declínio cognitivo por meio de uma menor reserva cognitiva e perfil socioeconômico que resulta em menor acesso aos cuidados de saúde e baixo letramento em saúde", aponta o artigo.
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Demência afeta mais as mulheres no Brasil

O estudo também destaca que as mulheres são mais afetadas pela demência que os homens. Os três fatores de risco mais relevantes para elas foram menor nível educacional, perda visual e depressão, enquanto para os homens foram menor nível educacional, perda visual e inatividade física.
Segundo a pesquisa, a diferença na prevalência de depressão entre os sexos pode estar relacionada a mudanças hormonais desde a puberdade até a menopausa e exposições ambientais, como status socioeconômico mais baixo, diferenças de gênero na socialização e diferentes estilos de enfrentamento.
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As mulheres também apresentaram maior fator de risco ligado ao colesterol alto, enquanto os homens apresentaram maior fator de risco para tabagismo e consumo excessivo de álcool. Os demais fatores de risco modificáveis para a demência foram semelhantes entre homens e mulheres.
No que diz respeito a raça e condições econômicas, o peso da baixa escolaridade se mostrou mais forte em pessoas negras, assim como em moradores de regiões mais pobres, quando comparados aos países de alta renda.
Segundo os pesquisadores, esse aumento destaca a necessidade urgente de estratégias eficazes para mitigar o impacto da demência sobre indivíduos, famílias, sociedades e sistemas de saúde. "A prevenção é uma abordagem potencialmente mais efetiva para enfrentar esse ônus, enfatizando a importância crítica de identificar e modificar os fatores de risco associados à demência", afirma a publicação.

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